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terça-feira, 7 de agosto de 2012

Tradição cai na Alemanha, e as mães voltam ao trabalho


Por KATRIN BENNHOLD
NEUÖTTING, Alemanha - Manuela Maier foi rotulada de Rabenmutter, ou "mãe corvo", por causa da ave que empurra os filhotes para fora do ninho. Ela foi ostracizada por outras mães, criticada por vizinhos e parentes e insultada em uma loja local.
Seu crime? Matriculou seu filho Florian, 9, em uma escola primária que oferece almoço e aulas à tarde -e voltou a trabalhar. "As pessoas me disseram: 'Por que você tem filhos se não pode cuidar deles?'", lembrou Maier, 47. Em comparação, ela disse, ter um primeiro filho fora do casamento, 21 anos atrás, causou pouca estranheza nessa cidade tradicional da Baviera, sul da Alemanha altamente católico e conservador.
Na primeira década do século 21, a maioria das escolas primárias e secundárias da maior economia europeia ainda termina antes do almoço, por volta das 13h, uma tradição que tem quase 250 anos. Ela manteve poderosamente a imagem da mãe dona de casa do folclore alemão e, por muito tempo, recebeu o crédito por produzir cidadãos bem criados e instruídos.
A Alemanha moderna pode ser dirigida por uma mulher -a chanceler (premiê) Angela Merkel, chamada de a mulher mais poderosa do mundo político-, mas não parece coincidência o fato de ela não ter filhos. O sistema escolar de meio período sobreviveu ao feudalismo, à ascensão e queda do culto à mãe por Hitler, ao movimento feminista dos 1970 e à reunificação com a Alemanha Oriental.
Hoje, ante a necessidade econômica, esse sistema está desmoronando: uma das taxas de nascimentos mais baixas do mundo, o espectro da falta de empregos e a queda dos padrões educacionais levaram a uma reconsideração. Desde 2003, quase 20% das 40 mil escolas da Alemanha adotaram programas de aulas à tarde, e outras pretendem segui-las.
"É um tabu que não podemos mais sustentar", disse a ministra do Trabalho, Ursula von der Leyen. "O país precisa que as mulheres possam trabalhar e ter filhos." Mãe de sete e uma médica que se tornou política, Von der Leyen choca igualmente as donas de casa e mulheres profissionais sem filhos, além de muitos homens do seu Partido Democrata Cristão.
Para ela, a disseminação do ensino de período integral na Alemanha é "irreversível", enquanto as mulheres entram na força de trabalho. Na Alemanha, 20% das famílias dependem da renda de mulheres.
Essa tendência torna o cuidado dos filhos uma questão de competitividade, diz Karen Hagemann, professora de história europeia e dos gêneros na Universidade da Carolina do Norte (EUA). "Os altos índices de nascimentos e de emprego feminino tendem a andar juntos", disse ela, uma especialista no sistema alemão. "O cuidado das crianças e um sistema escolar que cobre o dia de trabalho é vital."
Em 1763, a Prússia foi o primeiro país a tornar a educação compulsória para as classes inferiores. O sistema de meio período evoluiu em uma era que dependia do trabalho infantil. Quando a França e o Reino Unido instalaram sistemas de período integral, um século depois, o modelo alemão havia criado raízes profundas.
As classes médias alemãs há muito acreditavam que as famílias, e não o Estado, deveriam cuidar da cultura geral das crianças. Sendo assim, nenhuma escola poderia ser melhor que uma mãe.
Edith Brunner, 41, é aquela mãe modelo alemã cada vez mais rara. Uma qualificada assessora fiscal, com quatro filhos, ela passou a trabalhar em meio período depois que teve o primeiro e acabou abandonando totalmente o trabalho. Seu marido é um físico bem remunerado.
Mas o sistema desencorajou as mulheres mais instruídas a terem filhos; 1 em cada 3 alemãs na casa dos 40 anos vive em um lar sem filhos, o que dá à Alemanha, ao lado da Áustria, a maior porcentagem dessas famílias na Europa.
O sistema antigo também se adaptava mal a uma Alemanha onde um número crescente de estudantes é de imigrantes, muitos dos quais precisam de mais ajuda em habilidades básicas. Em 2001, um estudo sobre as capacidades de leitura de jovens de 15 anos surpreendeu a Alemanha, que se classificou em 21? de 27 e ficou perto do fim em termos de mobilidade social. Dois anos depois, o governo disponibilizou US$ 5,7 bilhões para introduzir programas de período integral em 10 mil das 40 mil escolas do país até 2009; 7.200 escolas participaram.
As mães reagiram. Wolfgang Gruber, do departamento de educação da Baviera, usa palavras como "inundação" e "avalanche" para descrever a demanda por escolas à tarde. Entre 2006 e 2009, só 40 escolas primárias da Baviera se converteram. Neste ano escolar, o número de programas de período integral subiu para 150.
"Ainda restam muitos obstáculos", disse a professora Hagemann. Mas, na Alemanha e em outros países, ideias antes impensáveis hoje são cultivadas. "Tudo muda; começa com uma mudança na cabeça."

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