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quinta-feira, 6 de junho de 2019

A Guerra dos Seis Dias – que já dura 52 anos

Nunca um conflito tão curto deve ter deixado marcas tão profundas. A Guerra dos Seis Dias, que faz 52 anos agora, legou — às futuras gerações de judeus, palestinos e outros árabes — fronteiras e ressentimentos presentes até os dias atuais. Então teve início a ocupação de Israel na Faixa de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental, os pontos nevrálgicos do conflito com os palestinos. O território da Autoridade Palestina basicamente é aquilo que Israel tomou em 1967 do Egito e da Jordânia. E reluta em largar.
Outro nome para a Guerra dos Seis dias é Terceira Guerra Árabe-Israelense. Como indica, não foi a primeira — tampouco seria a última. Começou em 1948, com o nascimento de Israel  por uma resolução da ONU. As posições dos judeus foram atacadas por todos os vizinhos imediatamente, pois eles consideravam a ação uma conquista territorial justificada pela ONU. É chamada Guerra de Independência pelos judeus. Quanto aos palestinos, expulsos então de suas terras, a chamam de Nakba (Catástrofe).
Ao enfrentamento de 1948, seguiu-se, em 1956, a Guerra do Sinai, contra o Egito, com o apoio ocidental. Depois dos Seis Dias, ainda viriam as Guerras do Yom Kippur, em 1973, e do Líbano, duas vezes, em 1982 e 2006. Isso sem contar, em períodos de paz, as intifadas, revoltas violentas dos palestinos. 
Desde a fundação de Israel, em 1948, paz já era uma palavra relativa. Segundo estimativas da época, mais de 700 mil dos árabes da região, que resistiram ou simplesmente estavam no caminho, se tornaram refugiados.
Após 1967, Israel viu sua área territorial passar de 20.720 quilômetros quadrados para 67.340 quilômetros quadrados. Foi conquistada a Península do Sinai, essa devolvida ao Egito em 1982. Também a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, do Egito e Jordânia. A primeira está sob a Autoridade Palestina desde 2005. A segunda continua ocupada em 61% de seu território — a chamada Área C. As Colinas de Golã foram anexadas oficialmente, ato até hoje não reconhecido pela comunidade internacional. Jerusalém Oriental, local de extrema importância para os árabes, também está sob a autoridade dos israelenses.
Daquele momento em diante, a aversão árabe ao vizinho só fez crescer, para dizer o mínimo — todos os movimentos radicais islâmicos pregam pelo fim de Israel. “O significado mais profundo da Guerra dos Seis Dias é muito maior que uma derrota militar — é uma derrota social”, afirma o especialista em relações internacionais libanês Fawaz Gerges.
Segundo ele, a derrota foi um imenso golpe no nacionalismo árabe defendido por Nasser. Uma prova de incompetência. “Um consenso surgiu entre os árabes: o de que sua sociedade, e não só o Exército, foi derrotada e que a catástrofe expunha seu atraso como civilização e em ciência.” A desmoralização do nacionalismo abriria espaço para outro discurso: o da identidade religiosa, universal e moral, acima da capacidade tecnológica. De que Nasser e outros nacionalistas foram derrotados por vontade de Deus, por sua decadência; sua falta de fé e estilo de vida pecaminoso. Esse é o discurso do Hamas.
A guerra também aumentou o número de refugiados palestinos. E não ajudou em nada o vencedor tratar de ocupar o que passou a ver como sua casa, iniciando o processo de assentamentos, como na mencionada Área C da Cisjordânia. Essa ação é considerada ilegal pelo Conselho de Segurança da ONU, e um dos maiores entraves para a paz.
Ao fim do combate, a ONU emitiu a Resolução 242, ordenando a retirada de Israel de todas as regiões ocupadas. O país impôs certas condições para aceitar a proposta e acabou estabelecendo administrações militares nos territórios ocupados. Gaza, Cisjordânia, as Colinas de Golã e o Sinai só voltariam à soberania de seus países se, em troca, os árabes reconhecessem o direito de Israel à existência e dessem garantias de que novos ataques não ocorreriam.
Se hoje israelenses discutem o mérito da guerra, na época, foi celebrada. A primeira-ministra Golda Meir, que governou entre 1969 e 1974, acreditava que uma identidade palestina nem sequer existia, pois os territórios “palestinos” eram de outros países, Egito e Jordânia. Dizia que 1967 foi uma ação defensiva. E que quem dificultou a paz nunca foi Israel, mas o mundo árabe, que, já em 1947, recusou a partilha da Palestina prevista pela Resolução 181 da ONU. O objetivo dos árabes sempre foi “destruir Israel”.
A narrativa da defesa é a posição ainda hoje oficial. Mas, para um dos dos “novos historiadores israelenses”, Ilan Pappé, o que o governo de Israel fez, pós-1967, foi dar continuidade ao processo iniciado em 1947-48, que visava ocupar o máximo de áreas palestinas, com o mínimo de palestinos possível. Segundo Pappé, que esteve em São Paulo no último mês de abril lançando a versão brasileira de seu livro A Limpeza Étnica da Palestina, Israel é o único Estado a negar que colonizou terras estrangeiras. O historiador também sustenta que o discurso pela “busca da paz” na região deveria ser substituído por propostas reais de descolonização, levando em conta a situação dos refugiados.
Shajar Goldwaser, ativista de oposição israelo-brasileiro e membro da Global Jewish Network for Justice, tem uma visão parecida: “Após Israel tomar os territórios da Cisjordânia, Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental, deu-se continuidade ao processo iniciado em 1948 de desapropriação de terras e expulsão da população para dar espaço aos colonos”.  Ele compara a situação dos refugiados ao Apartheid da África do Sul.
Contraste a visão do analista político Ben Caspit,  próxima ao consenso tradicional. Em artigo ao site Al-Monitor, ele afirma que a guerra foi boa para Israel. Que o país renasceu como potência. “Cinquenta anos depois, todas as ameaças existenciais a Israel foram removidas”, diz. “Acordos de paz foram assinados com o Egito e a Jordânia. O programa nuclear do Irã ficará parado por 15 anos. A Síria é um Estado em pedaços, como o Iraque. O Hezbollah pode ser uma ameaça terrorista, mas não existencial. O mesmo é verdade sobre o Hamas.”
Caspit também diz que “é duvidoso que tenha havido um evento mais decisivo na história de Israel e do Oriente Médio”. Nessa parte, não há polêmica.



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