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quinta-feira, 19 de março de 2020

Socialismo de Estilo Social-Democrata


Certamente, cedo ou tarde todas as realizações do socialismo marxista têm tido de re-introduzir elementos de propriedade privada dos meios de produção, de modo a prevenir ou evitar a manifesta bancarrota. 
Mesmo o moderado socialismo “de mercado”, contudo, não pode prevenir um relativo empobrecimento da população, enquanto a idéia de produção socializada não for inteiramente abandonada, de uma vez por todas.
Muito mais do que qualquer argumento teórico, tem sido a desapontadora experiência com o socialismo do tipo russo o que tem levado a um constante declínio na popularidade do socialismo ortodoxo marxista e tem suscitado a ascensão e desenvolvimento do moderno socialismo social-democrata.
Ambos os tipos de socialismo, certamente, derivam das mesmas fontes ideológicas. Ambos possuem uma motivação igualitarista, ao menos em teoria, e ambos têm essencialmente o mesmo objetivo final: a abolição do capitalismo como um sistema social baseado na propriedade privada e o estabelecimento de uma nova sociedade, caracterizado por uma solidariedade fraternal e pela erradicação da carência.
Uma sociedade em que qualquer um é pago “de acordo com as suas necessidades”. Nos primórdios do movimento socialista nos meados do séc. XIX, contudo, tem havido idéias conflitantes sobre os métodos mais apropriados para se alcançarem tais objetivos.
Enquanto geralmente havia [p.40] acordo sobre a necessidade de socialização dos meios de produção, sempre havia opiniões divergentes sobre como proceder. Em uma mão, dentro do movimento socialista havia os advogados de um rumo de ação revolucionário.
Eles propagavam a tomada violenta dos governos existentes, a completa expropriação de todos os capitalistas de uma só vez, e a temporária (ou seja, até que a escassez fosse, como prometido, erradicada) ditadura do proletariado, ou seja, daqueles que não eram capitalistas, mas que tinham de vender seus serviços laborais, como modo de se estabilizar a nova ordem. Na mão oposta havia os reformistas que defendiam uma abordagem gradualista. Eles raciocinaram que, com o alargamento da legenda, e ultimamente com um sistema de sufrágio universal, a vitória do socialismo poderia ser obtida por meio de ação parlamentar, democrática. Deveria ser assim porque o capitalismo, de acordo com a doutrina socialista comum, traria uma certa tendência rumo à proletarização da sociedade, ou seja, a tendência de um número menor de pessoas ser autônomas e, de forma inversa, maior de serem empregadas. Assim, de acordo com as crenças socialistas comuns, esta tendência iria por sua vez produzir uma consciência da classe proletária crescentemente uniforme, a qual então iria liderar uma inchada multidão de eleitores para o partido socialista. Desta forma, assim como raciocinaram, como esta estratégia estava muito mais alinhada com a opinião pública (mais apelativa para a maioria dos trabalhadores de índole pacífica e ao mesmo tempo menos amedrontadora aos capitalistas), ao adotá-la, a vitória final do socialismo iria apenas tornar-se mais certa.
Ambas as forças coexistiram dentro do movimento socialista, embora seu relacionamento tenha sido às vezes sofrido conflitos, até a Revolução Bolshevique de Outubro, 1917, na Rússia. Na prática, o movimento socialista geralmente adotou o passo reformista, enquanto no campo do debate ideológico os revolucionários dominavam. Os eventos russos mudaram isto. Com Lênin à frente, pela primeira vez os socialistas revolucionários perceberam seu programa e o movimento socialista como um todo teve de acarear-se com a experiência russa.
Como conseqüência, o movimento socialista rachou-se em duas facções com dois partidos separados: um partido comunista mais ou menos a favor dos eventos russos, e um partido socialista ou social-democrata com reservas, ou contra eles. Ainda, a divisão não ocorreu por questão da socialização; ambos eram a favor dela. Foi uma ampla cisão acerca da questão “mudança parlamentar democrática” versus “mudança revolucionária”. De frente com a verdadeira experiência da revolução russa – a violência, o derramamento de sangue, a prática de expropriação descontrolada, o fato de que milhares de novos líderes, freqüentemente de questionável reputação ou simplesmente sombrios e de caráter inferior, estavam sendo alçados à liderança política – os social-democratas, num esforço para ganhar o apoio público, perceberam que tinham de abandonar sua imagem revolucionária e tornar-se, não apenas na prática mas também na teoria, um partido decididamente democrático e reformista. Ademais, até mesmo alguns dos partidos comunistas do Oeste, dedicados como eram à teoria da mudança revolucionária, mas também tão necessitados de apoio público, sentiram que eles tinham de achar alguma falta, pelo menos, no modo peculiar dos bolcheviques de implementarem a sua revolução. Eles, também, crescentemente observaram necessário participar do jogo democrático, reformista, pelo menos na prática.
Contudo, este foi apenas o primeiro degrau na transformação do movimento socialista levado a efeito pela experiência da revolução russa. O próximo degrau, como indicado, foi forçado sobre a sombria experiência com o desempenho econômico da Rússia soviética. A despeito das diferentes visões deles sobre o desejo de mudanças revolucionárias, e igualmente não familiarizados ou incapazes ou relutantes em compreender o abstrato raciocínio econômico, tanto os socialistas como os comunistas, poderiam, durante uma espécie de período de lua-de-mel em que eles sentiram a merecida experiência, alimentar as mais ilusórias esperanças sobre as conquistas econômicas de uma política de socialização. Entretanto, este período não poderia durar para sempre, e os fatos teriam de ser encarados e os resultados avaliados depois que algum tempo tivesse passado. Para cada observador decentemente neutro das coisas, e depois para cada visitante e viajante alerta, tornou-se evidente que o socialismo de estilo russo não significava mais, mas ao contrário, menos riqueza, e que este era um sistema acima de tudo que, ao ter de permitir mesmo pequenos nichos de formação de capital privado, tinha de fato admitido sua própria inferioridade, ao menos implicitamente. Assim que esta experiência tornou-se mais amplamente conhecida, e em particular quando depois da 2ª Guerra Mundial a experiência soviética foi repetida nos países do Leste europeu, produzindo os mesmos resultados sombrios e então
desaprovando a tese que o desastre soviético deveu-se apenas a uma especial mentalidade asiática do povo, em sua corrida em busca de apoio, ou seja, os socialdemocratas e os comunistas, com seus partidos do Oeste, foram forçados a modificar seus programas dali em diante. Os comunistas agora viram vários vícios na implementação russa do programa de socialização como um todo, e progressivamente lidaram com a idéia de mais descentralização de planejamento e tomada de decisões e de socialização parcial, ou seja, a socialização apenas das maiores firmas e indústrias,
embora nunca tenham abandonado inteiramente a idéia de produção socializada. Os partidos socialistas ou social-democratas, em outra via, menos simpáticos desde o início com o modelo russo de socialismo e por meio de suas políticas decididamente reformista-democráticas, já inclinados a aceitar compromissos tais como socialização parcial, tiveram de fazer um movimento adaptativo adicional. Estes partidos, em resposta às experiências russa e dos países do leste europeu, paulatinamente abandonaram a noção de produção socializada como um todo e ao contrário, puseram mais e mais ênfase na idéia de tributação e igualitarismo, e, em outro movimento, na igualdade de oportunidades, como sendo as pedras fundamentais do socialismo. Enquanto esta mudança do socialismo de estilo russo a outro, social-democrata,
teve lugar, e ainda está ocorrendo em todas as sociedades ocidentais, não se apresenta em todos os lugares com a mesma intensidade. Falando por alto e apenas considerando a Europa, a mudança do antigo para o novo tipo de socialismo tem sido mais acentuada quanto mais imediata e direta foi a experiência com o socialismo de estilo russo para as populações em que os partidos socialistas e /ou comunistas tiveram de encontrar apoiadores e eleitores. De todos os maiores países, na Alemanha Ocidental, onde o contato com este tipo de socialismo é o mais direto, onde milhões de pessoas ainda têm grandes oportunidades de ver com seus próprios olhos o infortúnio que tem sido imposto ao povo na Alemanha Oriental, a substituição foi a mais completa. Aqui, em
1959, os social-democratas adotaram (ou melhor, foram forçados pela opinião pública a adotar) um novo programa partidário no qual todos os traços óbvios de um passado marxista ficaram notavelmente ausentes, e que além disso explicitamente mencionava a importância da propriedade privada e dos mercados, falava sobre socialização apenas como uma mera possibilidade, e que ao invés, pesadamente realçara a importância de medidas redistributivas. Aqui, os protagonistas de uma política de socialização dos meios de produção dentro do partido social-democrata têm ficado consideravelmente minoritários desde então; e aqui os partidos comunistas, mesmo quando eles estavam apenas a favor de uma socialização parcial e pacífica, têm sido reduzidos a uma insignificância. Em países posteriormente removidos da cortina de ferro como França, Itália, Espanha e também a Grã-Bretanha, esta mudança tem sido menos dramática. Não obstante, é certo afirmar que hoje apenas o socialismo social-democrata, tal como representado mais tipicamente pelos social-democratas alemães, pode alegar ampla popularidade no Ocidente. De fato, devido parcialmente à influência da Internacional Socialista – a associação dos partidos socialistas e social-democratas – o socialismo social-democrata pode agora ser reconhecido como uma das mais disseminadas ideologias de nosso tempo, progressivamente moldando os programas políticos e as políticas atuais não apenas dos partidos socialistas, e em escala menor as dos
comunistas ocidentais, mas também de grupos e partidos que nem mesmo em seus sonhos mais improváveis denominar-se-iam de socialistas, tais como os democratas “liberais” da costa leste dos Estados Unidos6. Adiante, no campo das políticas internacionais, as idéias do socialismo social-democrata, em particular as de uma
abordagem redistributivista em direção ao então conhecido conflito Norte-Sul, tem quase se tornado algo como a posição oficial entre os homens “bem-informados” e “bem-intencionados”; um consenso que se estendeu muito além daqueles que se pensam como socialistas.
Quais são as características centrais do socialismo de estilo russo? Há basicamente duas características: Primeiro, em positiva contra-distinção ao tradicional socialismo marxista, o socialismo social-democrata não coloca a propriedade privada dos meios de produção na ilegalidade e até mesmo aceita a idéia de todos os meios de
produção serem possuídos em privado – com exceção apenas da educação, trânsito e comunicação, banco central, e as polícias e cortes. Em princípio, qualquer pessoa tem o direito de adquirir e possuir privadamente os meios de produção, para vender, comprar,
ou novamente produzi-los, de dá-los como presente, ou alugá-los a qualquer outrem sob um arranjo contratual. Todavia, secundariamente, nenhum proprietário dos meios de produção pode por direito possuir toda a renda que possa ser auferida da utilização de seus meios de produção e a nenhum proprietário é deixado decidir o quanto da renda total da produção deve ser alocado em consumo e investimento. Contrariamente, parte da renda da produção pertence, por direito, à sociedade, pelo que a ela tem de ser transferida, e então, de acordo com idéias de igualitarismo ou de justiça distributiva, ser redistribuída entre os demais membros da sociedade.
Do ponto de vista da teoria natural da propriedade – a teoria que delineia o capitalismo – a adoção destas normas implica que os direitos do proprietário natural têm sido agressivamente invadidos. De acordo com esta teoria da propriedade, reiteramos, o proprietário-usuário dos meios de produção pode fazer o que quiser com eles; e qualquer que seja o resultado de seu  uso, esta é sua própria renda, a qual ele pode usar novamente como desejar, até o limite em que ele não mude a integridade física da propriedade de outrem e sustente-se exclusivamente em trocas contratuais. Do ponto de vista da teoria natural da propriedade, não há dois processos separados – a produção de renda e então, depois de produzida, a sua distribuição. Há apenas um processo: ao ser produzida, a renda é automaticamente distribuída; o produtor é o dono. Comparado a isto, o socialismo social-democrata advoga a expropriação parcial do proprietário natural ao redistribuir parte da renda da produção a pessoas que, quaisquer que sejam seus outros méritos, definitivamente não produzem a riqueza em questão e
definitivamente não tinham nenhuma demanda de ordem contratual por ela, mas que, adicionalmente, têm o direito de determinar unilateralmente, ou seja, sem ter de esperar pelo consentimento do produtor afetado, o quantum com que esta expropriação parcial
pode se dar.
Deveria ficar claro a partir desta descrição que, contrariamente à impressão que o socialismo social-democrata pretende gerar entre o público, a diferença entre ambos os tipos de socialismo não é de uma natureza categórica. Antes, é apenas uma questão de grau. Certamente, a primeira norma mencionada aparenta inaugurar uma diferença fundamental quando permite a propriedade privada. Mas então a segunda norma, em princípio, permite a expropriação de toda a renda do produtor derivada da produção e então reduz seu direito de propriedade a um conceito puramente nominal. Obviamente, o socialismo social-democrata não tem de ir tão longe para reduzir a propriedade privada a um estado meramente nominal. Além disso, admitindo-se que a cota de renda a qual o produtor é forçado a passar às mãos da sociedade pode ser, de fato, bastante moderada, isto, na prática, pode fazer uma tremenda diferença com relação ao desempenho econômico. Todavia, ainda, deve-se observar que, do ponto de vista dos indivíduos não-produtores, o grau de expropriação da renda privada do produtor é uma questão de expediente, o que é suficiente para reduzir a diferença entre ambos os tipos de socialismo – russo e social-democrata – de uma vez por todas a uma diferença somente de grau. Deveria ficar bem aparente o que este importante fato implica para um não-produtor. Isto significa que, não obstante quão baixo possa se encontrar o atual grau de expropriação, seus esforços produtivos têm lugar sob a sempre-presente ameaça que no futuro a cota da renda que deve passar às mãos da sociedade será aumentada
unilateralmente. Não é necessário muito comentário para ver como isto aumenta o risco, ou o custo de produzir, e então diminui o grau de investimento.
Com o exposto, um primeiro degrau na análise que se segue já foi alcançado.
Quais são as conseqüências econômicas, no sentido coloquial do termo, ao se adotar um sistema de socialismo social-democrata? Depois do que se acabou de dizer, não será doravante uma completa surpresa ouvir que pelo menos com relação à direção geral dos efeitos, estes são muito similares àqueles do socialismo tradicional do tipo marxista.
Ainda, à medida que o socialismo social-democrata advoga por expropriação parcial e redistribuição de receitas do produtor, alguns dos efeitos de empobrecimento que resultam de uma política de completa socialização dos meios de produção podem ser contornados. Desde que estes recursos podem ainda ser comprados e vendidos, o mais típico problema de uma economia de administradores – que nenhum preço de mercado para os meios de produção existem e então nem o cálculo monetário nem a contabilidade são possíveis, com as suas falhas de alocação e desperdício de recursos limitados em usos que são, no máximo, de secundária importância – é evitado.
Adicionalmente, o problema da superutilização é pelo menos reduzida. Também, desde que o investimento privado e a formação de capital ainda são possíveis, na medida que alguma parte das receitas da produção são deixadas para o produtor usar segundo seu
critério, sob o socialismo de estilo social-democrata há um incentivo relativamente mais alto para trabalhar, poupar e investir.
Não obstante, de modo algum podem todos os efeitos de empobrecimento ser evitados. O socialismo de estilo social-democrata, conquanto tão bom possa aparentar-se em comparação  com o socialismo de estilo russo, ainda necessariamente conduz a uma redução de investimento e então em riqueza futura, quando comparado com o capitalismo. Ao tomar parte das receitas da produção do produtor/proprietário, conquanto pequena esta parte possa ser, e transferindo-a àqueles que não produziram a receita em questão, os custos de produção (que nunca são zero, desde que produzir, apropriar e contratar sempre implicam, no mínimo, o gasto de tempo, que poderia ter sido utilizado de outra maneira, como por exemplo para laser, consumo ou trabalho informal) se elevam, e, mutatis mutantis, os custos de não produzir e/ou de produzir informalmente caem, ainda que apenas levemente. Como conseqüência, haverá relativamente menos produção e investimento, muito embora, por razões que serão discutidas em breve, o nível absoluto de produção e riqueza possa ainda se elevar.
Haverá relativamente mais laser, mais consumo e mais comércio paralelo, e então, em tudo e por tudo, relativo empobrecimento. Adicionalmente, esta tendência tornar-se-á tanto mais pronunciada quanto maior for a receita da produção a ser redistribuída, e mais iminente a probabilidade de que será aumentada no futuro por decisão unilateral, não contratual e não societária.
Por um longo tempo, de longe, a mais popular idéia de implementação do trunfo da política geral do socialismo social-democrata era a redistribuição monetária de receitas por meio do imposto de renda ou de um imposto sobre vendas gerais aplicado

sobre os produtores. Um olhar sobre esta particular técnica poderá adiante clarificar nosso ponto de vista e evitar alguns mal-entendidos e falhas conceituais, encontrados freqüentemente, acerca dos efeitos gerais de relativo empobrecimento. 
Qual o efeito econômico da introdução de tributação sobre a renda ou faturamento onde não havia nenhuma anteriormente, ou do aumento do nível existente de tributação para um nível mais alto? Ao responder isto eu vou doravante ignorar as complicações que resultam dos diferentes modos possíveis de redistribuição de dinheiro proveniente dos impostos a diferentes indivíduos, ou grupos de indivíduos – isto será discutido posteriormente neste capítulo. Aqui nós iremos tomar em conta apenas o fato geral e verdadeiro por definição para todos os sistemas redistributivistas, de que qualquer redistribuição de dinheiro dos impostos é uma transferência da renda monetária dos produtores e recipientes de dinheiro contratuais a pessoas que, segundo suas capacidades, são nãoprodutoras e não-recipientes contratuais de rendas. A introdução ou aumento da tributação então implica que o fluxo monetário da produção é reduzido para o produtor e aumentado para pessoas nos seus papéis como não-produtoras ou não-contratantes.
Isto muda os custos relativos de produção para retornos monetários versus nãoprodução,
e produção para retornos não-monetários. Conseqüentemente, à medida que esta mudança é percebida pelas pessoas, elas irão progressivamente recorrer ao consumo de laser e/ou produção para o fim de escambo, simultaneamente reduzindo seus esforços produtivos realizados para recompensas monetárias. Em qualquer caso, a produção de bens para serem comprados com dinheiro irá cair, o que significa dizer que o poder de compra do dinheiro decairá, e então o padrão geral de vida irá sofrer um declínio.
Contra este raciocínio às vezes se argumenta que tem sido frequentemente observado empiricamente que um aumento no nível de tributação foi na verdade acompanhado de um aumento (e não de uma queda) no produto interno bruto (PIB), e que o raciocínio acima, conquanto plausível, deve então ser considerado empiricamente inválido. Este alegado contra-argumento exibe um simples mal-entendido: uma confusão entre redução relativa e absoluta. Na análise acima a conclusão alcançada é que o efeito de maiores taxas é a redução relativa na produção para retornos monetários; uma redução, ou seja, quando comparada com o nível de produção que teria sido conseguido caso não tivesse o grau de tributação sido alterado. Isto não diz ou implica nada a respeito do nível absoluto de produção alcançada. De fato, crescimento absoluto do PIB não apenas é compatível com a nossa análise, mas pode ser visto como um fenômeno perfeitamente normal à medida que os avanços de produtividade são possíveis e de fato têm lugar. Se tem se tornado possível, por meio de melhorias na tecnologia de produção, produzir uma  maior saída com uma idêntica entrada (em termos de custos), ou uma saída fisicamente idêntica com uma entrada menor, então a coincidência da tributação aumentada e produção aumentada é nada mais que surpreendente. Todavia, para se ter certeza, isto não afeta a validade do que tem sido apresentado sobre relativo empobrecimento resultante da tributação.
Outra objeção que goza de alguma popularidade é a de que o aumento dos impostos leva a uma redução de renda monetária, e que esta redução aumenta a utilidade marginal do dinheiro, quando comparada com outras formas de receita (tal como laser) e então, ao invés de abaixar, o que faz é ajudar a aumentar a tendência de
trabalhar por retorno monetário. Esta observação, para se ter certeza, é perfeitamente verdadeira. Contudo, é um erro de concepção acreditar que isto de alguma forma invalida a tese de relativo empobrecimento. Primeiramente, de forma a conseguirmos a imagem completa, deve-se notar que, por meio da tributação, não apenas a receita monetária para algumas pessoas (os produtores) é reduzida mas que também, simultaneamente, a renda monetária para outras pessoas (não-produtores) é aumentada, e que para estas pessoas a utilidade marginal de dinheiro e então sua inclinação para
trabalhar por retorno monetário será então reduzida. Mas isto não é nem sequer tudo o que precisa ser dito, já que isto pode levar à impressão de que a tributação simplesmente não afeta a produção de bens intercambiáveis como um todo – desde que irá reduzir a
utilidade marginal da renda de dinheiro para alguns e aumentá-la para outros com ambos os efeitos cancelando-se mutuamente. Todavia esta impressão pode estar errada.
Como matéria de fato, seria uma negação do que tem sido assumido no início: que uma elevação de tributação, ou seja, uma maior contribuição monetária forçada sobre a renda de produtores que a desaprovam, tem na verdade tomado lugar e tem sido percebida como tal - e iria então envolver uma contradição lógica. Intuitivamente, a falha na crença que a tributação é “neutra” com respeito à produção torna-se aparente tão logo o argumento é conduzido para o seu fim extremo. Poderíamos então adicionar ao
raciocínio que mesmo a completa expropriação de toda a renda dos produtores e a sua transferência a um grupo de não produtores não iria [p.50] fazer nenhuma diferença, desde que o aumento do ócio para os não-produtores resultante da redistribuição seria inteiramente compensado por um sobre empenho em trabalhar aumentado por parte dos produtores (o que é certamente um absurdo). O que é ressaltado neste tipo de raciocínio é que a introdução de tributação ou o seu aumento em qualquer nível não apenas implica o favorecimento dos não–produtores às expensas dos produtores, mas também simultaneamente muda, para produtores e não-produtores de renda monetária, igualmente, o custo anexado aos diferentes métodos de alcançar (ou aumentar) a renda monetária. Porque agora é relativamente menos custoso obter renda monetária adicional através de meios não-produtivos, ou seja, não por realmente produzir mais bens, mas por participar no processo de aquisição não-contratual de bens já produzidos. Mesmo
que os produtores estejam certamente mais intencionados na obtenção de dinheiro adicional como conseqüência de um imposto mais alto, eles irão progressivamente fazê-lo não por meio de intensificação de seus esforços produtivos, mas antes, por meio de
métodos exploratórios. Isto explica porque a tributação não é e nunca será neutra. Com a tributação (aumentada) uma diferente estrutura legal de incentivos é institucionalizada: uma que muda os custos relativos de produção para renda monetária versus não-produção, inclusive a não-produção para fins de laser e a não-produção para retorno monetário, e também versus a produção para retorno não-monetário (escambo).
Adicionalmente, se tal estrutura diferente de incentivos é aplicada a uma mesma  população, então, necessariamente, deverá resultar uma diminuição na produção de bens produzidos para retorno monetário.
Ainda que a tributação sobre a receita e as vendas sejam as técnicas mais comuns, elas não exaurem o repertório de métodos de redistribuição social-democrata.
Não importa como os impostos são redistribuídos; aos indivíduos que compõem uma dada sociedade, não importa, ao menos por ora, em que extensão a receita monetária é igualada, desde que estes indivíduos possam manter (e de fato o fazem) diferentes estilos de vida e desde que eles aloquem porções diferentes de suas receitas monetárias a eles consignadas para consumo ou formação de riqueza privada não-produtiva, mais cedo ou mais tarde diferenças significativas entre as pessoas irão novamente emergir, senão com respeito à sua receita monetária, então com respeito à riqueza privada. Não surpreendentemente, estas diferenças tornar-se-ão mais firmemente pronunciadas se houver uma lei de herança puramente contratual. Então, o socialismo social-democrata, motivado como é pelo zelo igualitarista, incluirá a riqueza privada em seus esquemas políticos e imporá um tributo sobre ela e, também, particularmente, imporá um tributo sobre a herança de modo a satisfazer o clamor popular sobre as “desmerecidas fortunas” derramadas sobre os herdeiros.
Economicamente, estas medidas imediatamente reduzem a quantidade de formação de riqueza privada. Assim como o gozo da riqueza privada é tornado relativamente mais custoso devido à tributação, menos riqueza irá ser novamente criada, e um aumento do consumo terá lugar – inclusive dos estoques existentes de fortunas não produtivamente usadas – e o padrão geral de vida, o qual, obviamente, depende do conforto derivado da riqueza privada, irá afundar.


E Vide como no Brasil vige o imposto sobre transmissão causa mortis e a previsão constitucional para a instituição do imposto sobre grandes fortunas (CF/88, art.153, VII).
Conclusões similares sobre os efeitos de empobrecimento são alcançadas quando o terceiro maior campo das políticas tributárias – aquele dos “patrimônios naturais” – é analisado. Por razões a serem discutidas abaixo, este campo, próximo aos dois campos tradicionais, quais sejam, o da tributação da receita monetária e da riqueza privada, tem ganhado maior proeminência no decorrer do tempo sob o encabeçamento da igualdade de oportunidades. Não é muito difícil descobrir que a posição de uma pessoa na vida não depende exclusivamente de sua receita financeira ou da riqueza de bens nãoprodutivamente usados. Há outras coisas que são importantes na vida e que trazem um ganho adicional, mesmo embora possam não estar na forma de dinheiro ou outros bens
de troca: uma boa família, uma educação, saúde, uma boa aparência, etc. Chamarei estes bens não-intercambiáveis que possam ser derivados de um ganho psíquico de “patrimônios naturais”. O socialismo redistributivista, guiado por ideais igualitaristas, também está irritado pelas diferenças existentes em tais patrimônios, e tenta, se não erradicá-las, então ao menos moderá-las. Todavia estes patrimônios, sendo bens nãointercambiáveis, não podem ser facilmente expropriados, para então serem seus frutos redistribuídos. 
Também não é muito prático, para se dizer o mínimo, alcançar este objetivo por meio de redução direta dos ganhos não-monetários dos patrimônios naturais de maior receita ao nível dos das pessoas de menor receita por meio de, digamos, provocar a ruína da saúde do saudável para então fazê-lo igual ao doente, ou de amassar a face de uma pessoa de boa aparência para fazê-la se parecer com as outras pessoas menos afortunadas em termos de beleza12. Então, o método comum que o socialismo social-democrata advoga de modo a criar uma igualdade de oportunidades é a tributação dos patrimônios naturais. Aquelas pessoas sobre as quais se pensa receberem um ganho monetário relativamente maior de algum dom, tal como saúde, são sujeitas a uma tributação adicional, a ser paga em dinheiro. Este tributo é então redistribuído a aquelas pessoas cuja respectiva receita é relativamente baixa para ajudá-las a compensá-las por este fato. Uma tributação adicional, por exemplo, é imposta ao saudável para ajudar o não-saudável a pagar as contas do médico, ou sobre o de boa aparência para ajudar o feio a pagar por uma cirurgia plásticaF ou até mesmo a comprar para eles uma bebida de modo que assim possam esquecer sua sorte. As consequências econômicas de tais esquemas redistributivistas devem ser claras. À extensão com que a receita psíquica, representada por saúde, por exemplo, requer algum esforço produtivo, de tempo e de gastos, e como as pessoas podem, em princípio, saltar de papéis produtivos para os não-produtivos, ou canalizar seus esforços produtivos para diferentes linhas de produção, não-tributadas ou de menor tributação, de bens não-intercambiáveis ou intercambiáveis, elas agirão assim por causa dos custos acrescidos envolvidos na produção de saúde pessoal. A produção geral de saúde em questão irá cair, o padrão geral de saúde será reduzido. E mesmo com patrimônios verdadeiramente naturais, tais como a inteligência, acerca do que as pessoas podem admissivelmente fazer pouco ou nada, conseqüências do mesmo tipo irão resultar, embora apenas com uma retardação temporal de uma geração. Ao notar que tem se tornado relativamente mais custoso ser inteligente e menos custoso ser não-inteligente, e desejando tanta renda (de todas as formas) quanto possível para a sua prole, o incentivo para as pessoas inteligentes para produzirem descendentes terá sido diminuído e para os não-inteligentes, aumentado. Dadas as leis da genética, o resultado será uma população que será, de toda forma, menos inteligente. Adicionalmente, em qualquer caso de tributação de dons naturais, verdadeiro para o exemplo da saúde assim como para o da inteligência, devido ao fato de a receita monetária ser tributada, uma tendência similar àquela resultante da tributação sobre a renda irá se estabelecer, ou seja, uma tendência de redução dos esforços para o fim de se alcançar retornos financeiros e ao contrário, um progressivo engajamento em atividades produtivas para retornos não-monetários ou em toda sorte de empreitadas não-produtivas. Obviamente, tudo isto irá, mais uma vez, reduzir o padrão geral de vida. 

Lembremos que no Brasil o sistema público de saúde - SUS já autoriza cirurgias plásticas com fins
estéticos, bem como as de diminuição de estômago e também as de mudança de sexo.
Porém isto ainda não é tudo o que tem de ser dito sobre as conseqüências do socialismo de estilo social-democrata, na medida em que também serão gerados efeitos, ainda que remotos, de grande importância na estrutura social-moral da sociedade, os
quais se tornarão visíveis quando considerarmos os efeitos de longo prazo da introdução de políticas redistributivistas. Provavelmente não será mais uma surpresa que, no tocante a este aspecto, também, as diferenças entre o socialismo de tipo russo e o socialismo de estilo social-democrata, enquanto altamente interessantes em alguns detalhes, não são de um tipo fundamental.
Tal como devemos relembrar, os efeitos do socialismo na formação da personalidade são de dupla ordem, reduzindo os incentivos ao desenvolvimento de habilidades produtivas e favorecendo ao mesmo tempo o desenvolvimento de talentos políticos. Estas são precisamente também as conseqüências gerais do socialismo socialdemocrata.
Assim como o socialismo social-democrata favorece os papéis nãoprodutivos bem como os produtivos que escapam ao conhecimento público e que por isto não podem ser alcançados pela tributação, o caráter da população irá concomitantemente se modificar. Este processo pode ser vagaroso, mas tanto quanto a
peculiar estrutura de incentivos estabelecida por políticas redistributivas perdurar, será constantemente operativa. Menos investimentos no desenvolvimento e melhoramento das habilidades produtivas irão ocorrer, e como conseqüência, as pessoas tornar-se-ão cada vez mais incapazes de manter a sua renda por conta própria, por meio de produção ou contrato. Como aumentam tanto as alíquotas quanto as hipóteses de tributação, as pessoas cada vez mais desenvolvem as personalidades mais dissimuladas, mais uniformes e mais medíocres possíveis – ao menos no que tange à aparência em público. Ao mesmo tempo, assim que a renda de uma pessoa simultaneamente vai se tornando dependente da política, ou seja, da decisão da sociedade sobre como redistribuir os tributos (o que é conseguido, para se ter certeza, não por contrato, mas antes, pela sobreposição da vontade de uma pessoa sobre a vontade recalcitrante de outrem!), o quanto mais dependente vier a ser, mais as pessoas terão de fazer política, ou seja, terão de investir mais tempo e energia no desenvolvimento de seus talentos especiais para o alcance de vantagens pessoais às expensas (ou seja, de um modo nãocontratual) dos outros ou para evitarem ser objeto de tal exploração por parte deles.
A diferença entre ambos os tipos de socialismo apóia-se (apenas) no seguinte:
sob o socialismo de tipo russo, o controle da sociedade sobre os meios de produção e, portanto, sobre a receita produzida com eles, é completa, e de longe parece não haver mais espaço para engajar-se no debate político acerca do próprio degrau de politização da sociedade. O assunto está definido – justamente como também está definido na outra ponta do espectro, sob o puro capitalismo, onde não há nenhum espaço para política e todas as relações são exclusivamente contratuais. Sob o socialismo social-democrata,
na outra mão, o controle social sobre a receita produzida privativamente é apenas parcial, e o controle completo ou aumentado existe somente como um direito da sociedade não ainda atualizado, consistindo apenas em uma ameaça potencial pendurada sobre as cabeças dos produtores privados. Todavia, viver com a ameaça de ser inteiramente tributado, mais que antes o fora, explica uma característica interessante do socialismo social-democrata com relação ao desenvolvimento geral relacionado ao caráter crescentemente politizado das pessoas. Isto explica porque sob um sistema de socialismo social-democrata o tipo de politização é diferente do socialismo de estilo russo. Sob este último, tempo e esforços são gastos de forma não-produtiva, ao se discutir como distribuir a receita socialmente arrecadada; Sob o anterior, com certeza, isto também é feito, mas o tempo e os esforços são também usados para disputadas questões políticas para se definir sobre a maior ou menor extensão da parte que deve caber ao estado sobre as receitas socialmente administradas. 
Sob um sistema de meios socializados de produção, onde este assunto está definido de uma vez por todas, há então relativamente mais retiro da vida pública, resignação e cinismo a serem observados. 
No socialismo social-democrata, na outra mão, onde a questão ainda jaz aberta, e onde os produtores e não-produtores, como um todo, podem ainda vislumbrar alguma esperança de melhorar sua posição por meio do decréscimo ou acréscimo da tributação, verifica-se menos de tal amealhamento e, ao contrário, mais frequentemente as pessoas se engajam em agitação política seja a favor do - ou contra o - aumento do controle da sociedade sobre as receitas produzidas privativamente.
Com a similaridade geral explicada, bem como esta diferença específica entre ambos os tipos de socialismo, resta a tarefa de apresentar uma breve análise sobre algumas forças modificadoras que influenciam o desenvolvimento geral de personalidades politizadas e improdutivas. Estas nascem por meio de diferentes abordagens sobre o padrão desejado de distribuição de renda. Tanto o socialismo russo quanto o social-democrata vêem-se de frente com a questão de como distribuir a renda socialmente controlada. Para o socialismo de tipo russo a questão define-se no quantum a pagar aos indivíduos que foram alocados nos diversos postos na economia de administradores. Para o socialismo redistributivista a questão relaciona-se a quanto dos tributos alocar e a quem. Enquanto, em princípio, há inumeráveis meios de se fazer isto, a filosofia igualitarista de ambos os tipos de socialismo efetivamente reduz as opções disponíveis a três tipos gerais. 
O primeiro é o método de mais ou menos igualar a renda monetária de todos (e possivelmente também a riqueza privada usada de forma não produtiva). Professores, doutores, operários da construção civil e mineradores, gerentes de fábricas e camareiras recebem, todos, o mesmíssimo salário, ou a diferença entre estes é pelo menos consideravelmente reduzida. 
Não é preciso comentar muito para notar que esta abordagem reduz os incentivos para  trabalhar com mais afinco, pois doravante não fará muita diferença – em termos de salário – se alguém trabalha diligentemente o dia todo ou perambula “enrolando” a maior parte do tempo.
Então, sendo a desutilidade do trabalho um fato da vida, as pessoas irão progressivamente “enrolar”, e a renda média, que a todos parecia garantida, irá constantemente cair, em termos relativos. Portanto, esta técnica relativamente reforça a tendência em direção ao isolamento, à desilusão, ao cinismo, e mutatis mutantis, contribui para uma relativa redução na atmosfera geral de politização.  
A segunda abordagem tem um objetivo mais moderado de garantir uma renda mínima, a qual, embora normalmente conectada à renda média, é bem inferior a ela16. Isto também reduz o incentivo ao trabalho, desde que, com relação às pessoas que sejam apenas
produtoras de renda marginal, cujos salários superem apenas levemente o mínimo, tenderão a reduzir o trabalho ou até mesmo parar de trabalhar, e ao invés, aproveitar mais o laser, fixando-se à espera do salário mínimo. Por conseguinte, mais pessoas ainda irão cair abaixo da linha do salário mínimo, ou mais pessoas irão manter ou adquirir aquelas características às quais o pagamento de salários mínimos é agregado e como conseqüência, novamente, a renda média à qual o salário mínimo está atrelado irá cair a um nível inferior do qual estava anteriormente, Todavia, obviamente, o incentivo a trabalhar é reduzido a um grau inferior sob o segundo esquema, quando comparado ao primeiro. Por outro lado, o segundo esquema conduzirá a um grau de politização relativamente maior (e menos de um isolamento resignado), porque, ao contrário do  salário médio, o qual pode ser objetivamente conseguido, o nível ao qual um salário mínimo é fixado é completamente subjetivo, uma questão arbitrária, possibilitando assim uma particular tendência de vir a se tornar um assunto político permanente.
Indubitavelmente, o mais alto grau de politização ativa é alcançado quando o terceiro esquema distributivo é escolhido. Seu alvo, ganhando mais e mais proeminência para a democracia-social, é alcançar a igualdade de oportunidades. A idéia é criar, por meio de medidas redistributivas, uma situação em que a chance de qualquer um de alcançar alguma posição possível (renda) na vida é igual –
precisamente tal como nas loterias, onde cada ticket tem a mesma probabilidade de ser vencedor ou perdedor - e, adicionalmente, possuir um mecanismo corretivo que ajude a retificar situações de “indesejada má sorte” (seja lá o que isto signifique) que possa vir a
ocorrer no curso do jogo de chances em andamento. Tomada de forma literal, esta idéia é absurda: não há nenhum modo de igualar as oportunidades de alguém que viva nos Alpes com as de alguém que resida no litoral. Adicionalmente, parece muito claro que
a idéia de um mecanismo corretivo seja simplesmente incompatível com a idéia de loteria. Ainda assim, é precisamente este alto grau de abstração e confusão que contribui para o apelo popular deste conceito. O que constitui uma oportunidade, o que faz uma oportunidade ser diferente ou ser a mesma, pior ou melhor, o quanto ou que tipo de compensação se faz necessária para igualar as oportunidades que admitidamente não possam ser igualadas em termos físicos (como no exemplo dos Alpes), o que venha a ser uma indesejada má sorte e o que venha a ser uma retificação, todas estas questões são completamente subjetivas. Elas são dependentes de avaliações subjetivas, e, mutantes como são, então existe – se de fato for aplicado o conceito de igualdade de oportunidades – uma reserva ilimitada de todos os tipos de demandas distributivas, para
toda sorte de razões e para toda sorte de pessoas. Isto ocorre, em particular, porque a igualdade de oportunidades é compatível com demandas por diferenças em renda monetária ou em riqueza privada. A e B podem ter a mesma renda e ambos podem ser igualmente ricos, mas A pode ser negro, ou mulher, ou ter uma má visão, ou ser residente no Texas, ou ter dez filhos, ou não ter marido, ou ser maior de 65, enquanto B pode ser nada disso, mas alguma outra coisa, e então A pode argumentar que suas oportunidades de alcançar qualquer coisa na vida são diferentes, ou ainda mais, piores, que as de B, e que ele deveria de alguma forma ser compensado por isto, resultando que sua renda monetária, que antes era a mesma, agora seja diferente. B, por sua vez, poderia argumentar exatamente da mesma forma ao simplesmente reverter a implícita avaliação de oportunidades. Como conseqüência, terá lugar um grau jamais visto de politização. Qualquer coisa parece propícia agora, e tanto produtores quanto não-produtores, os primeiros por motivos defensivos e os segundos por propósitos agressivos, serão orientados a gastar mais e mais tempo no papel de levantar, destruir e contestar demandas distributivas. Por conseguinte, certamente, esta atividade, assim como o engajamento em atividades recreativas, é não apenas completamente nãoprodutiva como também contrasta com o fim de gozar o laser, implicando o gasto de mais tempo para o único propósito de interromper o gozo sossegado da riqueza produzida, assim como sua nova produção.
Não obstante, não é apenas a crescente politização estimulada (acima e além do normal do socialismo em geral) que acontece ao se promover a idéia de equalização de oportunidades. Há, mais uma vez, e esta é talvez uma das mais interessantes características do novo socialismo social-democrata, quando comparado com a sua
tradicional forma marxista, um novo e diferente caráter resultante deste tipo de politização. Sob qualquer política de distribuição, deve haver pessoas que o apóiam e o promovem. Normalmente, embora não de forma exclusiva, isto é feito por aqueles que
mais lucram com ela. Então, sob um sistema de equalização de renda e riqueza e também sob aquela política de salário mínimo, são principalmente os sem-posses, os apoiadores da politização da vida social. Dado o fato que na média ocorre serem eles relativamente menos capazes intelectualmente, e em particular, verbalmente, o resultado para a política é a de sofrer uma grande carência intelectual, para dizer o mínimo. Colocado de forma mais enfática, a política tende a ser algo chato, taciturno e monótono, mesmo a um considerável número dos próprios sem-posses. Por outro lado, ao se adotar a idéia de equalização de oportunidades, as diferenças de renda monetária e de riqueza não apenas terão a permissão de existir, mas também tornar-se-ão bastante pronunciadas, provido que sejam justificáveis do ponto de vista das discrepâncias subentendidas na estrutura de oportunidades que as diferenças anteriores ajudam a compensar. Agora, neste quadro político os com-possesH também podem participar.
Como [p.59] matéria de fato, sendo estes os que, na média, comandam as habilidades verbais, e a tarefa de definir as oportunidades como melhores ou piores, sendo essencialmente um de seus poderes a retórica persuasiva, este é exatamente o papel que
desempenham no jogo. Por conseguinte, os com-posses tornar-se-ão a força dominante capaz de sustentar o processo de politização. Progressivamente, serão pessoas destas camadas que se moverão para o topo da organização do partido socialista, e coerentemente, a aparência e a retórica dos políticos socialistas adotarão um formato
diferente, ao tornarem-se mais e mais intelectualizados, ao mudarem de apelo e ao atrairem uma nova classe de apoiadores.
Com isto alcancei o estágio na análise do socialismo social-democrata onde apenas uns poucos retoques e observações são necessários para ajudar a ilustrar a validade das considerações teóricas acima. Embora não afetem a validade das conclusões alcançadas acima, dependendo exclusivamente da verdade das premissas e da correção das deduções, infelizmente não existe um caso quase perfeito, quaseexperimental para ilustrar os feitos do socialismo social-democrata quando comparado com o capitalismo, assim como houvéramos encontrado no caso das Alemanhas Oriental e Ocidental com respeito ao socialismo de tipo russo. Ilustrar este ponto envolveria uma comparação entre sociedades manifestamente diferentes onde o ceteris claramente não seja o paribus e então não seria mais possível casar ordenadamente certas causas com certos efeitos. Freqüentemente, experiências no socialismo socialdemocrata simplesmente não perduraram o suficiente, ou foram interrompidas repetidamente por políticas que não poderiam ser classificadas como pertencentes ao socialismo social-democrata. Ou melhor, desde o início, elas foram misturadas com tais outras políticas tão diferentes – e mesmo inconsistentes – como resultado de compromissos políticos, que na verdade as diferentes causas e efeitos estão tão emaranhados entre si que nenhuma evidência ilustrativa veemente pode ser produzida para nenhuma tese de qualquer grau de especificidade.
Não obstante, algumas evidências existem, ainda que de uma qualidade um pouco mais dúbia. Primeiramente, no tocante a observações de âmbito global, a tese geral sobre empobrecimento relativo causado pelo socialismo redistributivista é ilustrado pelo fato que o padrão de vida é relativamente maior, e tem aumentado com o passar do tempo, nos Estados Unidos da América do que na Europa ocidental, ou, mais especificamente, que nos países da Comunidade Européia (CE). Ambas as regiões são aproximadamente comparáveis com respeito ao tamanho da população, diversidade étnica e cultural, tradição e herança, e também com respeito a recursos naturais, mas os Estados Unidos são comparativamente mais capitalistas e a Europa mais socialista.
Qualquer observador neutro dificilmente falharia em observar este aspecto, como também pode ser indicado por tais índices globais tais como o dispêndio estatal como percentagem do PIB, o qual é aproximadamente 35 por cento nos Estados Unidos, quando comparado com os cerca de 50 por cento ou mais na Europa ocidental. Também se enquadra neste cenário o fato de que os países europeus (em particular a Grã-Bretanha) tenham exibido índices de crescimento econômico mais impressionantes no século dezenove, o qual tem sido descrito repetidamente pelos historiadores como sendo o período clássico do liberalismo, que no século vinte, o qual, em contraste, tem sido caracterizado pelo socialismo e estatismo. Da mesma forma, a validade da teoria é
ilustrada pelo fato que a Europa ocidental tem sido sucessivamente ultrapassada em índices de crescimento econômico por alguns dos países do Pacífico, tal como Japão, Hong Kong, Cingapura e Malásia; e que os últimos, ao adotarem um rumo relativamente mais capitalista, tem alcançado neste período um padrão de vida muito maior que os países mais inclinados ao socialismo que começaram mais ou menos ao mesmo tempo com aproximadamente a mesma base de desenvolvimento econômico, tal como a Índia.
Voltando agora a observações mais específicas, temos as recentes experiências de Portugal, onde em 1974 o regime autocrático de socialismo conservadorista de Salazar (sobre este tipo de socialismo leia o próximo capítulo), que manteve Portugal como um dos mais pobres países da Europa, foi substituído em uma revolução pelo socialismo redistributivista (com elementos de nacionalização), e onde desde então o padrão de vida tem caído até mais do que antes, literalmente tornando o país em uma região do terceiro mundo. Também temos a experiência socialista da França de Miterrand, que produziu uma imediata deterioração da situação econômica, tão notável – sendo o mais óbvio um drástico aumento do desemprego e repetidas desvalorizações da moeda – que em menos de dois anos, uma aguda redução do apoio popular para o
governo forçou uma reversão na política, quase cômica no tanto que significava uma completa negação do que apenas há algumas semanas atrás tinham sido defendidas sob as convicções mais profundas.
O exemplo mais instrutivo, contudo, pode novamente ser provido pela Alemanha e, desta vez, a Alemanha Ocidental18. De 1949 a 1966 existiu um governo liberal-conservador que mostrou um notável compromisso com os princípios de uma economia de mercado, mesmo embora que logo de início houvesse um considerável grau de elementos de socialismo-conservadorista misturados e que ganharam mais importância com o tempo. De qualquer forma, de todas as maiores nações européias, durante este período a Alemanha Ocidental foi, em termos relativos, definitivamente o país mais capitalista, e o resultado disto foi que se tornou a sociedade mais próspera de Europa, com índices de crescimento que ultrapassaram todos os de seus vizinhos. Até
1961, milhões de refugiados alemães, e em seguida milhões de trabalhadores estrangeiros dos países do sul da Europa integraram-se à sua economia em expansão, e o desemprego e a inflação eram quase desconhecidas. Então, após um breve período de transição, de 1969 a 1982 (quase um mesmo período) prevaleceu um governo liberalsocialista social-democraticamente orientado. Ele elevou os tributos e as contribuições da seguridade social consideravelmente, aumentou o número de servidores públicos, alocou fundos de impostos adicionais nos programas sociais já existentes e crou outros novos, que de forma significativa aumentaram os gastos em todo tipo dos então chamados “bens públicos” [p.62], portanto, alegadamente “igualando oportunidades” e fomentando a “qualidade de vida” a todos. Por recorrer à política keynesiana de gastos deficitários e inflação descontrolada, os efeitos do aumento de recursos mínimos socialmente garantidos para os não-produtores às expensas dos produtores mais pesadamente tributados poderiam retardar-se por uns poucos anos (o mote da política econômica do então Chanceler Helmut Schimidt era “antes 5% de inflação do que 5% de desemprego”). Eles apenas viriam a se tornarem mais drásticos algum tempo depois, contudo, desde que a inflação descontrolada e expansão de crédito tinham criado - e prolongado – o superinvestimento, ou melhor, o mal-feito investimento, típico de uma bolha. Como resultado, não apenas havia muito mais que 5% de inflação, como também o desemprego subiu de forma brutal e alcançou 10 por cento. O crescimento do PIB foi se tornando cada vez mais lento até que, em termos atuais, caiu em termos absolutos
durante os últimos poucos anos do período. Ao invés de ser uma economia em expansão, o número absoluto de pessoas empregadas decresceu; mais e mais pressão foi gerada sobre os trabalhadores estrangeiros para que saíssem do país e barreiras de imigração foram erguidas simultaneamente para níveis ainda mais altos. Tudo isto aconteceu enquanto a importância da economia informal cresceu vigorosamente.
Mas estes foram apenas os efeitos mais evidentes de um modelo econômico estritamente definido. Haveria outros efeitos de uma espécie diferente, os quais realmente seriam de uma importância mais duradoura. Com o novo governo socialista–liberal a idéia de equalização de oportunidades chegou à vanguarda ideológica. Como havia sido premeditado teoricamente, foi em particular a difusão oficial da idéia mehr Demokratie wagen (“risco mais democracia”) – inicialmente um dos mais populares slogans da nova era (Willy Brandt) – que levou a um grau de politização jamais visto.
Toda sorte de demandas era levantada em nome da igualdade de oportunidades; e dificilmente havia qualquer esfera da vida, da infância à velhice, do laser às condições de trabalho, que não fosse examinada intensivamente atrás de possíveis diferenças com respeito a oportunidades definidas como relevantes que pudessem ser oferecidas a outras pessoas. Sem surpresa, tais oportunidades e tais diferenças eram encontradas constantemente, e coerentemente, o reino da política aparentava expandir-se quase diariamente. “Não há nenhuma questão que não seja política” podia ser ouvida mais e mais freqüentemente. Com o fim de se manter na frente desta evolução os partidos no poder tiveram de mudar, também. Em particular, os social-democratas, tradicionalmente um partido de colarinho azul, tiveram de desenvolver uma nova imagem. Com a idéia de equalização de oportunidades ganhando terreno, tornaram-se, progressivamente, como possível de ser previsto, o partido da intelligentsia (verbal), dos cientistas sociais e dos professores. E este “novo” partido, quase como que para provar o ponto em que um processo de politização há de ser apoiado principalmente por
aqueles que possam obter algum ganho de seus esquemas distributivos e que o trabalho da definição das oportunidades é essencialmente arbitrário e uma questão de força retórica, tomou então como uma de suas preocupações principais canalizar as mais
diversas energias políticas colocadas em movimento no campo da equalização, sobretudo, as oportunidades de educação. Em particular, eles “igualaram” as oportunidades para o ensino médio e superior, ao oferecer os serviços respectivos não
apenas de forma gratuita, mas também pagando a grandes grupos de estudantes para obter vantagem deles. Isto não somente aumentou a demanda por educadores, professores e cientistas sociais, cujos salários naturalmente adviriam dos tributos.
Acresça-se a isto, de uma certa forma ironicamente, para um partido socialista - que argumentava que igualar as oportunidades educacionais implicaria uma transferência de renda dos ricos para os pobres - que ao levar a efeito um subsídio pago aos mais inteligentes às expensas de uma complementar redução na renda dos menos inteligentes e, à extensão que exista um maior número de inteligentes entre as classes média e alta que entre a classe baixa, este será um subsídio fornecido ao com-posses, pago pelos sem-posses20. Como o resultado deste processo de politização, conduzido por um número cada vez maior de educadores pagos por impostos e ganhando influência sobre quantidades cada vez maiores de estudantes, lá emergiu (como previsto) uma mudança
na mentalidade do povo. 
Progressivamente, passou a ser completamente normal satisfazer toda sorte de demandas pelo uso de meios políticos, e reclamar toda sorte de alegados direitos contra outras pessoas supostamente melhor situadas e suas propriedades; Adicionalmente, por uma geração inteira de pessoas crescendo durante este período, tornou-se cada vez menos natural pensar em melhorar de vida pelo esforço
produtivo ou contratação. Então, quando a atual crise econômica, criada pela política redistributivista, veio à tona, as pessoas jamais estiveram tão pouco preparadas para vencê-la porque, com o passar do tempo, esta mesma política havia enfraquecido precisamente aqueles talentos e habilidades que agora seriam mais urgentemente
requeridos. Suficientemente revelador, quando o governo socialista-liberal foi deposto em 1982, principalmente por causa de seu desempenho econômico obviamente miserável, ainda prevalecia a opinião que a crise deveria ser resolvida não pela eliminação das causas, ou seja, das excessivas provisões mínimas para não-produtores e não-contratantes, mas antes por outra medida redistributiva: por igualar de forma forçada o tempo de trabalho disponível para as pessoas empregadas e desempregadas.
Ademais, em linha com este espírito o novo governo conservador-liberal de fato não fez mais do que diminuir a taxa de crescimento da tributação.

H.H.Hoppe


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