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quinta-feira, 14 de março de 2024

Os sete erros fundamentais de Karl Marx sobre a economia

 A triste aceitação dos pensamentos de Marx nunca pára, o que faz da sua refutação um imperativo. Uma lista completa dos erros do marxismo seria longa. Aqui, abordaremos apenas alguns deles: o papel do capitalista e da desigualdade em uma economia de mercado, a função do lucro, do prejuízo e do empresário, a teoria da exploração e o prognóstico de Marx sobre o colapso capitalista.

 

Primeiro erro: O papel do capitalista

Karl Marx (1818-1883) ignora o papel desempenhado pelo capitalista na economia de mercado. Ele identifica o capitalista como alguém que, como foi o caso do colaborador de Marx, Friedrich Engels (1820-1895), possui uma fortuna e recebe dividendos e pagamentos de juros sem uma realização própria. Biógrafos do líder do movimento operário comunista afirmam que Marx nunca viu uma fábrica por dentro. Friedrich Engels, o patrocinador financeiro do projeto marxista de conquista do mundo, era herdeiro de uma fortuna que seu pai havia acumulado, e que o filho gastaria não apenas como apoiador de Karl Marx e do movimento socialista, mas também como playboy. Friedrich Engels não era nem capitalista nem empresário, mas herdeiro de uma fortuna e um parasita, como Marx. Engels manteve Karl Marx financeiramente assegurado, particularmente no período após o autor socialista ter desperdiçado a herança de seu pai e, em seguida, de sua esposa.

Marx e seus sucessores ignoram que os capitalistas pré-financiam e preservam a estrutura de capital da economia. A formação de capital exige, antes de tudo, a abstenção de utilizar o potencial de consumo no presente. Os capitalistas são aqueles que financiam os processos de produção em toda sua longitude temporal até que a mercadoria chegue ao consumidor como o produto finalizado e pronto para uso.

Para entender o papel dos capitalistas na economia de mercado, é preciso considerar que cada produto passa por um longo processo de produção até chegar aos consumidores. Este processo de produção estende-se desde o planeamento, passando pelas diferentes fases de processamento, até as mercadorias chegarem aos armazéns e às salas de exposição e vendas, incluindo a comercialização das mercadorias. A receita vem apenas com a venda do produto.

Até o momento em que o capitalista recebe pela venda, muito tempo já decorreu, enquanto todo o processo esteve sujeito a riscos e incertezas. Os capitalistas recebem sua recompensa por causa da espera e de suportar riscos e incertezas, enquanto os assalariados recebem sua remuneração regularmente, muito antes de o produto chegar ao consumidor final.

 

Segundo erro: Desigualdade

Sob a concorrência de mercado, apenas os empreendedores de sucesso, aqueles que dominam os desafios de satisfazer os desejos dos clientes, permanecerão no negócio. Os empreendedores falidos desaparecem do mercado junto com seus projetos e suas empresas. Os socialistas veem somente aqueles que acumularam alguma fortuna. Lamentam a desigualdade e ignoram o fato de que o processo capitalista é um processo de eliminação que erradica os perdedores do jogo. Numa economia de mercado competitiva, a expressão "empresário de sucesso" representa um pleonasmo, porque os empresários que não têm sucesso são forçados a sair e têm de abrir espaço para os empresários que melhor servem os seus clientes.

Marx entendeu mal a essência da desigualdade em uma economia de mercado e colocou a propriedade capitalista na mesma categoria que a riqueza detinha sob o feudalismo. Marx não reconheceu que o processo de mercado cria desigualdade porque os projetos fracassados desaparecem. A desigualdade no capitalismo é resultado de um processo de eliminação. A competição de mercado funciona como um processo contínuo de correção de erros. As empresas falidas tendem a desaparecer. As falências tornam o capitalismo produtivo e são um sinal de que os mercados funcionam. Na realidade da economia de mercado, a construção marxista de uma "classe capitalista" não existe, porque cada membro deve lutar por seu status todos os dias e, sob o capitalismo livre, tanto as portas de entrada quanto as de saída estão escancaradas.

 

Terceiro erro: Lucros e perdas

Karl Marx acusou a economia de mercado da anarquia da produção, mas é, de fato, o sistema econômico socialista que sofre com o caos. A escassez requer comportamento econômico. Os preços indicam a disponibilidade relativa de um bem. Os lucros e prejuízos, que surgem da diferença entre vendas e custos, informam o empresário sobre a rentabilidade da empresa. Se o lucro e a perda desaparecem sob o socialismo, o indicador de quão bem a produção serve aos consumidores também desaparece. Sem esses sinais, a produção ocorre por acaso e pode custar mais do que os bens valem para o usuário final.

A economia socialista absorve mais recursos materiais e humanos do que a produção gera em utilidade. A lamentada "exploração" do trabalho humano, que os socialistas acusam existir no capitalismo, é a realidade sistemática sob o socialismo. Nos esforços soviéticos para industrializar a Rússia, essa economia de soma negativa do socialismo custou um preço colossal em vidas humanas e trabalho. Na segunda década do novo milênio, essa exploração das massas ainda continua em Cuba, Coreia do Norte e Venezuela.

 

Quarto erro: Planejamento econômico

Os planejadores socialistas podem fornecer esquemas para produzir bens de consumo com base em pesquisas das condições entre a população. Por exemplo, os burocratas na agência central socialista tentam determinar quantos pares de sapatos a população precisa. No entanto, os planejadores não podem atingir esses objetivos porque não têm conhecimento confiável e detalhado sobre o que os consumidores querem. Tampouco têm as diretrizes sobre os custos que a produção dos sapatos absorveria em relação a satisfazer os desejos urgentes dos consumidores, como roupas, moradia e alimentos.

Numa economia de mercado, a solução para este problema não está nas mãos de uma autoridade central de planejamento. Ao contrário, todos os participantes no mercado cooperam no processo de avaliação e delegam a produção dos bens em diferentes unidades empresariais, de acordo com as capacidades específicas dessas empresas individuais que a concorrência de mercado revela. Cada consumidor individual expressa sua valorização subjetiva no ato da compra. Os preços e as quantidades vendidas são sinais e incentivos. Em uma economia de mercado capitalista, os proprietários dos meios de produção são envolvidos em cada etapa do processo produtivo para resolver o problema da valorização. No final, a valorização dos consumidores determina o valor do capital empregado no processo produtivo.

 

Quinto erro: Empreendedorismo

No socialismo, acredita-se que os técnicos possam continuar a trabalhar sem empreendedorismo, na ausência dos capitalistas e dos gestores capitalistas. Os socialistas querem tornar supérfluos os empresários e colocar o aparelho de produção nas mãos dos trabalhadores e dos seus dirigentes. Os socialistas acreditam que podem alcançar um melhor desempenho econômico através da socialização das empresas. Os anticapitalistas chegam a essa falsa ideia porque não entendem a função do empresário nem a do capitalista.

Ao contrário do administrador, o empreendedor representa a força criativa do negócio. A tarefa do empreendedor — que pode ou não ser o dono de uma empresa — é realizar ideias de negócio. O empreendedor é quem procura a melhor forma de satisfazer os desejos dos clientes, a melhor forma de produzir com os equipamentos de produção e a melhor forma de organizar a fábrica. Um empreendedor é alguém que realiza essas ideias.

Diferente do empreendedor, a função do capitalista é manter a estrutura de capital. Os capitalistas financiam o processo de produção. Eles recebem sua remuneração apenas com a venda do bem final, enquanto os trabalhadores recebem seus salários já durante o período do processo de produção. Quando os capitalistas e os empresários desaparecem, e os socialistas tomam o poder, a estrutura de capital desintegra-se porque não resta ninguém com interesse pessoal em financiar e gerir essa estrutura tendo em mente o consumidor final.

 

Sexto erro: Exploração

De acordo com a doutrina marxista, a característica do capitalismo é que o uso do dinheiro serve para produzir bens para ganhar mais dinheiro. Marx colocou essa ideia em sua fórmula de D-M-D', que significa que o dinheiro (D) serve para produzir mercadorias (M) para ganhar mais dinheiro (D').

No modelo marxista, os lucros empresariais resultam da exploração dos trabalhadores porque os capitalistas ganham a mais-valia que os trabalhadores criam. A mais-valia depende da chamada “composição orgânica do capital”, que inclui o “capital constante” das máquinas e da propriedade e o “capital variável”, que representa a força de trabalho no processo produtivo.

Segundo Marx, a competição capitalista obriga as empresas a aumentar o capital constante. Isso reduz a participação relativa do capital variável, e a rentabilidade da firma capitalista cai desde a extração da mais-valia, pois a taxa de exploração depende do tamanho relativo do trabalho em relação ao capital constante.

O ponto central do modelo marxista é a tese de que o lucro empresarial resulta da exploração da força de trabalho e que, na medida em que a concentração do capital reduz a extração da mais-valia, os lucros encolherão e o capitalismo entrará em colapso.

Para Marx, a solução é o socialismo como um sistema sob o qual os trabalhadores retêm a parte do trabalho que o capitalista extrai como mais-valia do proletariado trabalhador.

O problema central do modelo marxista é o pressuposto de que o valor de um produto é igual ao esforço de trabalho necessário para sua produção. Marx tomou esse erro dos economistas clássicos, que não haviam notado suas implicações paradoxais e o choque da teoria do valor-trabalho com a realidade.

 

Sétimo erro: Colapso do capitalismo

De acordo com a doutrina marxista, o capitalismo sofre de crises que se tornam mais severas e destrutivas ao longo do tempo e, finalmente, trazem seu colapso completo. A competição capitalista leva a um exército de desempregados, ao empobrecimento da classe trabalhadora e a uma crescente concentração de capital. De acordo com essa teoria, a massa dos proletários crescerá, enquanto o número dos capitalistas diminuirá.

A teoria marxista conclui que, na medida em que o volume da força de trabalho ativa cai no processo de produção, os lucros diminuem e, assim, o capitalismo provoca sua própria queda.

No entanto, durante os 150 anos decorridos desde que 'O Capital' (1867) apareceu na imprensa, ocorreu o desenvolvimento oposto: em vez do empobrecimento em massa, uma nova classe média emergiu, e a pobreza extrema diminuiu em todo o mundo à medida que mais países se voltaram para o capitalismo. Hoje, há mais empresas no mundo do que nunca. Nessas empresas, os lucros servem para expandir a produção, introduzir o progresso técnico e elevar a produtividade e, com isso, os salários.

 

Conclusão

Sem Lênin e a Revolução Russa de 1917, Karl Marx manteria apenas um pequeno lugar na história das ideias. A fama de Marx não resulta da qualidade de sua obra, mas sim do papel que suas ideias desempenharam como guia para os revolucionários que empurraram a Rússia para o abismo da destruição. Como economista político, Marx errou em todos os principais temas que apresentou em sua obra e a prática de seus seguidores traz a prova desta tese.


Antony Mueller:

Doutor pela Universidade de Erlangen-Nuremberg, Alemanha e, desde 2008, professor de economia na Universidade Federal de Sergipe.

 

quarta-feira, 13 de março de 2024

COMICIO DA CENTRAL DO BRASIL E O SOCIALISMO NO BRASIL

 "Jango, os trabalhadores querem armas para defender seu governo". "Legalidade para o Partido Comunista".

Com faixas exibindo inscrições como essas, há 60 anos, acontecia o famigerado Comício da Central de João Goulart, um dos acontecimentos mais deformados da história brasileira. Um evento simpático e democrático por reformas justas, dizem muitos historiadores, divulgadores de História e jornalistas; pois eu digo: uma ova. A respeito, publiquei:


"Em 13 de março, aconteceria o famoso espetáculo conhecido como Comício da Central, no Rio de Janeiro. Dada a atmosfera criada, o Comício foi uma explícita "declaração de guerra". A Frente de Mobilização Popular, Brizola, agora o próprio Miguel Arraes, o CGT, a UNE, o Comitê Central do ilegal PCB, todos os radicais de esquerda estavam lá. Perante uma multidão de 150 mil pessoas, em boa parte militantes e trabalhadores de vários estados levados pelo CGT com recursos do contribuinte, Brizola conclamou o presidente ao fim da conciliação, garantindo que, se houvesse um plebiscito, o povo votaria a favor de dissolver o Congresso e formar uma assembleia constituinte popular para que o Congresso tenha "trabalhadores, camponeses, sargentos, oficiais nacionalistas e autênticos homens públicos". O próprio Jango, em discurso histórico, atacou a "democracia dos privilégios, a democracia da intolerância e do ódio, a democracia para liquidar com a Petrobras - a democracia dos monopólios, nacionais e internacionais, a democracia que levou o presidente Getúlio Vargas ao extremo sacrifício", como se houvesse outra "democracia" a respeitar que não a democracia regida por uma ordem constitucional liberal-democrática. Declarou que todas as refinarias passariam a ser do povo e que, em poucas horas, decretaria a regulamentação de alugueis." (Lacerda: A Virtude da Polêmica, p. 269-270)
O link abaixo é a versão historia propagada pela esquerda que sempre esteve regendo os meios de comunicação e implantando aas suas verdades.
https://www.youtube.com/watch?v=1oQ3tbIBu18

Aulas magnas por togados “magnos”

 

A politização, ao mesmo tempo incrementada e confessa do mundo universitário, me pareceu um dos legados dos eventos de Maio; um dos menos duvidosos e dos menos prazenteiros.” (Raymond Aron)

Vai bem longe o tempo em que a abertura do ano universitário simbolizava promessas de aquisição de conhecimentos acadêmicos pelas novas gerações. A reverência aos cabelos brancos dos mais velhos e experientes, assim como os discursos sobre assuntos que, de tão atemporais, haviam resistido ao mofo dos séculos, marcavam aquele rito de passagem de mentes verdinhas para uma vida adulta intelectualmente ativa. Nos cursos jurídicos, a abordagem de temas instigantes, tais como o surgimento do constitucionalismo, os institutos do direito civil legados pelo gênio romano ou o desenvolvimento do sistema punitivo fascinava os jovens mais argutos e proporcionava aos docentes – pelo menos àqueles dignos do título – a certeza de que o saber por eles acumulado não viraria pó. Porém, com a massificação do ensino superior e a crescente adesão de professores ao apelo fácil de ideologias de rótulo humanista, mas de essência autoritária, toda aquela sacralidade viria a ser pisoteada como algo nocivo, muito ancien régime, a ser radicalmente substituído pelas “luzes” de novos guias sociais.

Dois dias após a grande manifestação do dia 25 de fevereiro, o ministro Alexandre de Moraes inaugurava o ano letivo da faculdade de direito do Largo de São Francisco na USP (SP)[1]. Em fala que mais parecia dirigida a uma turma de pugilato que a um centro acadêmico, Moraes iniciou sua preleção com a referência a uma recente luta de boxe, para afirmar que “nós não podemos baixar a guarda… Não podemos dar uma de Bambam contra Popó – que durou 36 segundos. Nós temos que ficar alertas e fortalecer a democracia. Fortalecer as instituições e regulamentar o que precisa ser regulamentado.” Obsidiado pela regulação das redes sociais, seguiu alertando os alunos sobre algo por ele designado como “manual do ditador” e definido, pelo douto juiz, como sendo o modus operandi daqueles que “[atacam] a imprensa livre – emparelhando as notícias verdadeiras com as fraudulentas, colocam em dúvida a credibilidade do sistema eleitoral e, agora, não podem deixar aqueles que têm o papel de garantir o Estado Democrático de Direito, não podem deixar que eles tenham independência.” Em plena cátedra, conceituou como condutas ditatoriais – e, portanto, merecedoras de reprovação e de penas! – o que não passa do legítimo exercício constitucional da liberdade de expressão.

Aquele discurso havia sido uma indisfarçável resposta ao ato realizado em São Paulo, na antevéspera, durante o qual centenas de milhares de indivíduos haviam manifestado seu protesto contra a série de abusos judiciais, embora, no palanque, apenas o pastor Silas Malafaia os tivesse mencionado explicitamente[2]. Ainda assim, a reunião pacífica dos indignados contra aqueles que pouquíssimos ousaram nominar gerou reações em cadeia por parte do estamento togado. De fato, a defesa despudorada da mordaça, em um universo acadêmico que deveria primar pela pluralidade e pelo fomento ao debate entre divergentes, foi o prelúdio usado por Moraes para a edição das novas resoluções do TSE para as eleições deste ano. Como havia prenunciado diante dos acadêmicos da USP, Moraes e seus pares tornaram a “legislar” e, sem um voto popular, implementaram trechos inteiros do chamado PL da Censura, que havia sido embarreirado no parlamento[3]. Afinal, para “regulamentar o que precisa ser regulamentado”, vale tudo, inclusive desconsiderar os princípios constitucionais da separação de poderes e da livre manifestação opinativa.

Na semana seguinte, coube ao ministro Barroso desempenhar o papel de “queridinho” do meio acadêmico[4]. Em aula inaugural na PUC/RJ, o togado aproveitou a ocasião do dia internacional da mulher para autoproclamar-se um militante feminista de longa data e, pasme você, caro leitor, para escancarar sua postura pró-abortista. Deixando de lado o dever imposto a qualquer magistrado de abster-se de comentar matérias ainda sob sua apreciação, como é o caso do aborto, Barroso conclamou os ouvintes a uma mobilização pela descriminalização da prática – e ousou fazê-lo entre os muros de uma universidade privada e católica, cuja profissão de fé a tornaria, pelo menos em tese, avessa a condutas atentatórias à vida desde a sua concepção.

Em duras críticas à legislação brasileira sobre o tema, o togado incitou a plateia a “uma campanha de conscientização que precisamos difundir pelo país para que possamos votar no STF, porque a sociedade não entende do que se trata”. Além de prosélito e, por isso mesmo, carente da imparcialidade indispensável ao exercício da atividade judicante, Barroso ainda pavoneou sua soberba ao dizer que a matéria envolve algo “que a sociedade não entende”. Do alto da arrogância própria aos detentores de poderes ilimitados, partiu de uma generalização rasa sobre um coletivo de indivíduos supostamente “não entendedores” para avocar, para si, a prerrogativa de agir “em nome do povo, e para o bem deste”. Contudo, como bom representante da intelligentsia brasileira, Barroso não costuma interagir com seres humanos distantes de sua “bolha” e, muito menos, dar ouvidos às convicções e ao conhecimento do tal “povo”, invocado amiúde em folhetins e discursos politiqueiros e, agora, em falas de togados. Assim sendo, qual a sua autoridade para elencar os assuntos dos quais a sociedade entende ou não, ou para definir o próprio conceito de “sociedade”?

A citação em epígrafe contém uma alusão do notável R. Aron aos eventos de Maio de 68. Naquele mês, as insurreições universitárias, iniciadas a partir de reivindicações sobre reformas curriculares, varreram o mundo não-comunista de um canto ao outro, inclusive algumas capitais brasileiras. Derivadas de uma mesma raiz iconoclasta de contestação a valores tradicionais das civilizações e da academia no século XX, todas elas revelavam, segundo Aron, “pelo menos o enfraquecimento da autoridade dos adultos, dos professores, da instituição enquanto tal. A contestação da autoridade na Igreja católica e do comando no exército emana do mesmo estado de espírito. A revolução cultural [da China maoísta], que atinge seu apogeu nos anos 60, forma o contexto, o pano de fundo das perturbações[5].” Tão fundamentalista era o discurso daqueles “insurretos”, que figuras sensatas como Aron eram achincalhadas no debate público pela mera crítica ao radicalismo e à violência da esquerda universitária. Não à toa, data daquele período a publicação do manifesto panfletário intitulado “As Bastilhas de Raymond Aron”, em que Sartre se deleitava na detração de seu ex-amigo de infância.

Entre nós, tanto Moraes quanto Barroso são “herdeiros” do Maio de 68, cada um ao seu modo. Ambos se sentem incumbidos da missão de “salvarem” a democracia contra o pretenso “extremismo golpista”, sobretudo por meio do controle das informações disponibilizadas ao grande público. Em seus constantes atentados contra o império da lei, ambos desrespeitam as normas jurídicas, símbolo maior da autoridade em um Estado de Direito. Ambos se mostram tão incapazes de lidar com a crítica que buscam eliminá-la, a cada dia, mediante a decretação de censura e prisões ilegais de opositores. Ambos recobrem o seu menosprezo às instituições sob a maquiagem farsesca da construção de uma sociedade democrática e pacífica, da qual sejam excluídos os enigmáticos “discursos de ódio”.

Pelo menos desde a ditadura militar, nossa academia vem refletindo a indiscutível hegemonia da esquerda em todos os seus matizes. De uns tempos para cá, parece ter se tornado uma longa manus do aparato judiciário, cujas narrativas, por mais esdrúxulas, são plenamente endossadas pelos pseudo-intelectuais, entre risinhos de puro servilismo. O estrelato dos figurões de toga também nos cursos universitários, como ilustrado por aulas magnas cuja única “magnitude” reside na extensão do mando exercido por seus palestrantes, comprometerá a formação das futuras gerações. Expostos a conceitos propositalmente falseados, nossos operadores do direito do amanhã germinarão sob a crença de que a mera divergência das opiniões de poderosos configura “ato antidemocrático” e, por óbvio, tenderão a castrar o pouco que tiver restado de seu espírito crítico, cuidando sempre para não desafinarem do bando.

As perspectivas não são encorajadoras. Porém, cabe a nós, espíritos livres, um esforço conjunto de resistência contra as múltiplas manobras destinadas a sufocarem as nossas vezes e mentes.

Katia Magalhães - advogada 

terça-feira, 12 de março de 2024

A subida ao poder dos cristãos sionistas nos EUA (e no Brasil)

 Antes de Theodore Herzl fundar o sionismo político e publicar o “Estado Judeu”, cristãos-sionistas nos Estados Unidos e na Inglaterra já procuravam direcionar e influenciar a política de ambas as nações a serviço de uma profecia apocalíptica, fruto de uma obsessão religiosa.

A maior organização pró-Israel nos Estados Unidos não é composta por judeus, mas por cristãos evangélicos, perfazendo um total de 7 milhões de membros, superando em 2 milhões de pessoas a totalidade da comunidade judaica norte-americana.

Membros desta organização – Cristãos Unidos por Israel (CUFI), se encontraram na segunda-feira em Washington, atraindo milhares de participantes para ouvir os discursos do Primeiro-Ministro israelita Benjamin Netanyahu, do Secretário de Estado e ex-diretor da CIA, Mike Pompeo, do Vice-Presidente Mike Pence e do conselheiro para assuntos de segurança nacional, John Bolton. Recentemente, em março último, John Hagee, líder da CUFI e polêmico pregador evangélico, encontrou-se diversas vezes o Presidente Donald Trump e participou de um encontro exclusivo na Casa Branca para discussão do próximo “plano de paz” para Israel e Palestina.

A CUFI é apenas uma das muitas organizações da história americana que promoveram o estado de Israel e o sionismo, alegando que um estado étnico judeu na Palestina é um requisito para o cumprimento da profecia do fim dos tempos e necessário para que Jesus Cristo retorne à Terra – um evento que os cristãos costumam chamar de a “segunda vinda”.

Enquanto organizações como a CUFI e suas antecessoras viram a criação do estado de Israel em 1948, e a posterior vitória de Israel e conquista de Jerusalém em 1967, como o cumprimento da profecia bíblica, há uma profecia que esta seita dos cristãos evangélicos acredita e que é a única coisa entre eles e a “segunda vinda”. Estima-se que existam mais de 20 milhões desses cristãos nos Estados Unidos, muitas vezes referidos como cristãos sionistas, e eles são um importante grupo de eleitores e fonte de doações e apoio político ao Partido Republicano.

Como foi explorado em edições anteriores desta série, esses cristãos sionistas, bem como extremistas religiosos sionistas em Israel, acreditam que a mesquita de Al Aqsa e a Cúpula da Rocha (Qubbat As-Sakhrah) devem ser substituídas por um terceiro templo judaico como o anunciar do fim dos tempos.

Esses dois grupos de diferentes religiões, desde o século XIX, formaram repetidamente uma aliança oportunista para assegurar o cumprimento de suas respectivas profecias, apesar do fato de que os membros da outra fé raramente ou nunca estão na mesma sintonia em suas interpretações sobre o que ocorrerá após a construção do templo.

Essa aliança, baseada em uma obsessão mútua por acelerar a vinda do Apocalipse, continua até hoje e agora, mais do que em qualquer outra época da história, esses grupos alcançaram o topo do poder tanto em Israel quanto nos Estados Unidos. As partes I e II desta série exclusiva exploraram como este ramo do sionismo religioso passou a dominar o atual governo de direita de Israel e levou o atual governo deste país a tomar medidas definitivas para a destruição da mesquita de Al Aqsa e a iminente construção do Terceiro Templo.

Agora, esta parte (Parte III) mostrará como a contrapartida cristã deste movimento nos Estados Unidos – o sionismo cristão – também se tornou uma força dominante na política americana, particularmente após a eleição de Donald Trump para a presidência, onde esta visão apocalíptica é uma grande condutor da política do Oriente Médio de sua administração.

No entanto, esta visão apocalíptica do fim dos tempos tem sido um guia para figuras proeminentes da história norte-americana e da elite americana, mesmo antes da fundação do sionismo como um movimento político. Assim, a influência do sionismo cristão na política de administração de Trump é apenas a mais recente de uma longa lista de exemplos em que a profecia e a política se misturaram na história americana, muitas vezes com resultados que alteram o mundo.

Puritanos, Profecia e Palestina

Relatos do papel dos cristãos europeus e norte-americanos na criação do Estado de Israel geralmente começam com a Declaração Balfour de 1917, mas os esforços de certos grupos cristãos na Inglaterra e nos Estados Unidos para criar um Estado judeu na Palestina na verdade datam de séculos antes e significativamente anteriores à fundação oficial do sionismo por Theodore Herzl.

Entre os primeiros defensores da imigração física dos judeus europeus para a Palestina estavam os puritanos, um desdobramento do protestantismo cristão que emergiu no final do século XVI e tornou-se influente na Inglaterra e, mais tarde, nas colônias americanas. Puritanos influentes dedicaram considerável interesse ao papel dos judeus na escatologia, ou na teologia do fim dos tempos, com muitos – como John Owen, um teólogo do século XVII, membro do parlamento e administrador em Oxford – acreditando que o retorno físico dos judeus à Palestina foi necessária para o cumprimento da profecia do fim dos tempos.

Embora as raízes puritanas do que mais tarde se tornaria conhecido como sionismo cristão sejam frequentemente negligenciadas nos relatos modernos de onde e por que o apoio evangélico americano a Israel começou, seus adeptos ainda reconhecem claramente seu legado. Por exemplo, na segunda-feira, na conferência CUFI, Pompeo, ele mesmo um sionista cristão conhecido por sua obsessão pelo fim dos tempos, disse o seguinte ao grupo:

O apoio cristão na América a Sião – por uma pátria judaica – remonta aos primeiros colonos puritanos, e perdurou por séculos. De fato, nosso segundo presidente [John Adams], alguns anos atrás, disse “Eu realmente desejo aos judeus novamente uma nação independente na Judeia”.

Essas crenças puritanas, que persistem hoje e têm crescido constantemente em popularidade, tornaram-se mais arraigadas na Inglaterra e na América colonial com o tempo, especialmente entre a classe política abastada, e levaram a uma variedade de interpretações sobre exatamente o que a Bíblia diz sobre o fim dos tempos. Entre os mais influentes estava o desenvolvimento do “dispensacionalismo” cristão, uma estrutura interpretativa que usa a Bíblia para dividir a história em diferentes períodos de “dispensações” e vê as referências proféticas da Bíblia a “Israel” como significando uma nação etnicamente judaica estabelecida na Palestina.


A interpretação visual de Charles Russell das “dispensações” de Darby
por volta de 1886

O dispensacionalismo foi largamente desenvolvido pelo pregador anglo-irlandês John Nelson Darby, que acreditava que os destinos ordenados pelo Deus de Israel e aqueles da igreja cristã eram completamente separados, com o último a ser fisicamente removido da Terra por Deus, porém, precedido por um período de sofrimento terreno, conhecido como a Tribulação.

Na visão de Darby, a tribulação começaria após a construção de um Terceiro Templo judaico no Monte do Templo, em Jerusalém. Essa crença na remoção física dos cristãos da Terra antes da Tribulação, amplamente conhecida como “o arrebatamento”, foi inventada por Darby na década de 1820 e sua falta de apoio bíblico tem sido amplamente notada pelos teólogos de várias denominações, bem como pelos estudiosos teólogos da Bíblia. No entanto, é importante apontar que existem diferenças entre os cristãos dispensacionalistas quanto ao fato de o arrebatamento ocorrer antes, durante ou depois do período da Tribulação.

No entanto, apesar de sua existência relativamente curta como ideia concebida e na falta de embasamento bíblico, o arrebatamento foi entusiasticamente adotado por algumas igrejas na Inglaterra e nos Estados Unidos, particularmente no último. Isto foi em grande parte graças ao trabalho do altamente controverso teólogo Cyrus Scofield.

Notavelmente, a marca registrada da escatologia cristã de Darby coincide com desenvolvimentos similares na escatologia judaica, ou seja, as ideias do rabino Zvi Hirsh Kalisher e a criação de um novo ramo do messianismo judaico, o qual acreditava que os judeus devem trabalhar proativamente para acelerar a vinda de seu Messias, imigrando para Israel e construindo um Terceiro Templo no Monte do Templo, em Jerusalém. As crenças de Darby e aquelas que ele inspirou promoveram algo semelhante no sentido de que os cristãos poderiam acelerar a vinda do arrebatamento e da tribulação, promovendo a imigração de judeus para Israel, bem como a construção de um Terceiro Templo judeu.

Sionistas cristãos pavimentam o caminho para Theodore Herzl

Darby viajou para a América do Norte e vários outros países para popularizar suas ideias, encontrando vários pastores influentes em todo o mundo de língua inglesa, incluindo James Brookes, o futuro mentor de Cyrus Scofield. Suas viagens e a disseminação de suas obras escritas popularizaram suas visões escatológicas entre certos círculos de cristãos americanos e ingleses durante o renascimento religioso do século XIX. As crenças de Darby eram particularmente atraentes para a elite de ambos os países, com alguns nobres ingleses colocando anúncios de jornais pedindo aos judeus que imigrassem para a Palestina já na década de 1840.

Outra figura proeminente influenciada pela doutrina de final dos tempos, de Darby, foi o pregador americano Charles Taze Russell, cuja igreja mais tarde deu origem a várias igrejas diferentes, incluindo as Testemunhas de Jeová. Décadas antes da fundação do sionismo político moderno, Russell começou a pregar – não apenas aos cristãos, mas também aos judeus nos Estados Unidos e em outros lugares – sobre a necessidade de imigração maciça de judeus para a Palestina.

Como o rabino Kalisher havia feito algumas décadas antes, Russell escreveu uma carta em 1891 para um membro rico da família bancária dos Rothschild, Edmond de Rothschild, bem como para Maurice von Hirsch, um rico financista alemão, sobre seu plano para o assentamento judaico na Palestina. Russell descreveu seu plano da seguinte maneira:

“Minha sugestão é que os ricos hebreus comprem da Turquia, a uma avaliação justa, todo o seu interesse de propriedade nessas terras, ou seja, todas as terras do governo (terras não detidas por proprietários privados), sob a garantia de que a Síria e a Palestina sejam constituídas como um estado livre.”

O mesmo plano iria ressurgir alguns anos mais tarde, indiscutivelmente no livro sionista mais influente de todos os tempos – O Estado Judeu – publicado por Theodore Herzl em publicado em 1896.


Pregador Russel se dirigiu aos judeus de Nova York em 1910

Não se sabe se Rothschild ou Hirsch foram influenciados pela carta de Russell, embora as ideias de Russell tenham tido um impacto duradouro sobre alguns proeminentes judeus e cristãos norte-americanos no que diz respeito à promoção da imigração judaica para a Palestina.

No mesmo ano em que Russell escreveu sua carta para de Rothschild e Von Hirsch, outro influente pregador dispensacionalista escreveu outro documento que é frequentemente negligenciado ao explorar o papel dos cristãos americanos no desenvolvimento e na popularização do sionismo. William E. Blackstone, um pastor norte-americano que foi grandemente influenciado por Darby e outros dispensacionalistas da época, passou décadas promovendo com grande fervor a imigração de judeus à Palestina como um meio de cumprir a profecia bíblica.

O ponto culminante dos esforços de Blackstone veio na forma do Memorial Blackstone, uma petição que pediu que o então presidente dos Estados Unidos, Benjamin Harrison, e seu secretário de Estado, James Blaine, tomassem medidas “em favor da restauração da Palestina aos judeus”. Esta petição, que fora esquecida, solicitava a Harrison e Blaine para usar sua influência para “garantir a realização em uma data precoce, de uma conferência internacional para considerar a condição dos israelitas e suas reivindicações para a Palestina como sua antiga casa e, promover, em todos os outros caminhos justos e adequados, o alívio de sua condição de sofrimento. ”

Tal como acontece com a carta de Russell para Rothschild e Von Hirsch, não se sabe exatamente quão influente foi o Memorial Blackstone em influenciar as opiniões ou políticas de Harrison ou Blaine. No entanto, a petição do Blackstone Memorial é altamente significativa por causa de seus signatários, que incluíam os americanos mais influentes e ricos da época, a maioria dos quais eram cristãos.

Os signatários do Memorial Blackstone incluíram J.D. Rockefeller, o primeiro bilionário do país; J.P. Morgan, o rico banqueiro; William McKinley, futuro presidente dos Estados Unidos; Thomas Brackett Reed, então presidente da Câmara; Melville Fuller, presidente do Supremo Tribunal; os prefeitos de Nova York, Filadélfia, Baltimore, Boston e Chicago; os editores do Boston Globe, do New York Times, do Washington Post e do Chicago Tribune, entre outros; e numerosos outros membros do Congresso, bem como empresários e clérigos influentes. Embora alguns rabinos tenham sido incluídos como signatários, o conteúdo da petição foi contestado pela maioria das comunidades judaicas americanas. Em outras palavras, o principal objetivo do sionismo, antes mesmo de se tornar um movimento, foi amplamente apoiado pela elite cristã americana, mas com a oposição dos judeus americanos.

O Memorial Blackstone atraiu mais tarde a atenção de Louis Brandeis, um dos sionistas judeus americanos mais proeminentes, que mais tarde se referiria a Blackstone como o verdadeiro “pai fundador do sionismo”, segundo Nathan Straus, amigo íntimo de Brandeis. Brandeis acabaria conseguindo convencer um idoso Blackstone a peticionar o então presidente Woodrow Wilson com um segundo Memorial de Blackstone, em 1916, que foi apresentado em particular a Wilson quase um ano depois.

Em vez de coletar assinaturas de membros proeminentes da classe de elite dos Estados Unidos, Blackstone se concentrou desta vez em reforçar o apoio de organizações protestantes, ou seja, a Igreja Presbiteriana, de acordo com a fé presbiteriana de Wilson. De acordo com o historiador Jerry Klinger, presidente da Sociedade Americana Judaica para a Preservação Histórica, essa mudança de foco foi ideia de Brandeis, não de Blackstone.

Alison Weir, autora de Against Our Better Julgement: The Hidden History of How the U.S. Was Used to Create Israel, descreveu Brandeis como “um dos mais influentes” sionistas norte-americanos e uma figura chave nos esforços para pressionar Wilson a apoiar a formação de um estado judeu na Palestina, do qual a segunda petição de Blackstone fazia parte. No entanto, Weir afirmou que a segunda petição de Blackstone era secundária a um chamado “acordo de cavalheiros” pelo qual oficiais ingleses prometeram apoiar um Estado judeu na Palestina, se os sionistas americanos, liderados por Brandeis, conseguissem garantir a entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial.

Wilson finalmente apoiou o novo documento da Blackstone, que nunca foi apresentado publicamente ao presidente, mas em particular pelo rabino Stephen Wise. Este segundo Memorial Blackstone foi um componente-chave da campanha liderada por Brandeis que acabou por garantir o apoio americano – ou seja, apoio privado – à Declaração Balfour, que estabeleceu as intenções britânicas de apoiar um estado judaico étnico na Palestina. Notavelmente, a Declaração de Balfour tem o nome do então Secretário de Relações Exteriores da Inglaterra, Arthur Balfour, ele mesmo um dispensacionalista Cristão, embora Weir tenha dito à MintPress que Balfour era mais provavelmente influenciado por imperativos políticos do que por motivos religiosos. A única pessoa no gabinete britânico a se opor à Declaração de Balfour foi seu único membro judeu, Edwin Montagu.

A Declaração de Balfour foi dirigida a um membro da família de banqueiros Rothschild, Lionel Walter Rothschild, a última de uma série de cartas escritas aos membros da família Rothschild pedindo-lhes que usassem sua riqueza e influência política para favorecer a criação de um Estado judeu na Palestina: uma carta do rabino Kalisher, que escreveu ao barão Amschel Rothschild em 1836; outra para Charles Taze Russell, que escreveu para Edmond de Rothschild em 1891; e finalmente a Declaração de Balfour, escrita a Lionel Walter Rothschild em 1917.

Weir disse à MintPress que os Rothschilds eram relevantes nestes primeiros esforços para estabelecer um estado judeu na Palestina, devido à “sua riqueza e ao poder que o acompanha”, tornando-os muito procurados por aqueles que achavam que um estado judeu poderia ser formado na Palestina pela compra do território por ricos judeus europeus, como haviam proposto tanto Kalisher quanto Russell. No entanto, a Declaração de Balfour foi dirigida aos Rothschilds pois naquela época, os membros da família Rothschild, Edmond de Rothschild em particular, haviam se tornado um dos mais fortes defensores da causa sionista.

Embora a declaração tenha seu nome, não está claro se o próprio Balfour realmente foi o autor do documento. Alguns historiadores – como Michael Rubinstein, ex-presidente da Sociedade Histórica Judaica da Inglaterra – argumentaram que a declaração em si fora escrita por Leopold Amery, então secretário político do Gabinete de Guerra da Inglaterra e sionista, o qual, apesar de seu compromisso com a Causa sionista, ocultou suas raízes judaicas por grande parte de sua carreira por razões que ainda são fonte da especulação.

Como mostrado na Declaração de Balfour e nos esforços do lobby que levaram à sua criação, o apoio ao que logo se tornaria conhecido como sionismo entre a nobreza da Inglaterra e dos Estados Unidos já era formidável antes mesmo de Herzl começar a trabalhar em “O Estado Judeu”. Vale a pena considerar que o poder e a influência dessa classe de elites cristãs com motivação religiosa influenciaram Herzl e suas ideias, especialmente considerando que os cristãos dispensacionalistas haviam promovido um etno-estado judaico na Palestina, numa época em que a ideia era impopular entre muitos judeus proeminentes na Europa e nos Estados Unidos.

Além disso, o papel dos cristãos sionistas, como mais tarde se tornariam conhecidos, continuou bem depois que Herzl iniciou suas atividades sionistas e resultou em muitos dos atos mais influentes que levaram ao estabelecimento do Estado de Israel, incluindo a Declaração de Balfour.

Notavelmente, o próprio sucesso de Herzl em promover seus pontos de vista após a publicação do The Jewish State foi em grande parte devido ao pastor dispensacionalista inglês William Hechler. Hechler, enquanto servindo como capelão na Embaixada Britânica em Viena, forjou uma aliança e depois uma amizade íntima com Herzl e foi fundamental para a negociação de reuniões entre Herzl e proeminentes membros do governo alemão, incluindo o Kaiser Wilhelm II que emprestou a legitimidade política necessária para o movimento sionista de Herzl.


Herzl conduz o Kaiser Wilhelm II em uma visita ao recente assentamento judaico em Jaffa
Palestina, em 1998. Foto Israel GPO

Uma figura em grande parte negligenciada na ascensão do sionismo, Hechler é mencionado no diário de Herzl mais do que qualquer outra pessoa e apaixonadamente sentiu que a criação de um estado judeu na Palestina traria o fim dos tempos. Hechler também é conhecido por ter estado extremamente interessado na construção de um Terceiro Templo Judaico no Monte do Templo, tendo dedicado um tempo considerável à criação de modelos daquele Templo, alguns dos quais ele exibiu em destaque em seu escritório e mostrou a Herzl com grande entusiasmo durante sua primeira reunião.

A aliança Hechler-Herzl é um dos primeiros exemplos de como os sionistas cristãos e os sionistas judeus usaram as motivações do outro para obter ganhos políticos, apesar do fato de que os sionistas cristãos frequentemente adotam visões antissemitas e sionistas seculares e, assim como sionistas religiosos, não mantêm em alta consideração o cristianismo. Este oportunismo por parte dos sionistas cristãos e judeus tem sido uma característica chave na ascensão do sionismo, particularmente nos Estados Unidos, e o caso de Cyrus Scofield, o homem mais responsável por popularizar o sionismo cristão entre os evangélicos norte-americanos, oferece outro exemplo importante.

A surpreendente história de Cyrus Scofield

Talvez não haja outro livro que tenha sido mais influente na disseminação do sionismo cristão nos Estados Unidos do que a Bíblia de referência de Scofield, uma versão da Bíblia King James cujas anotações foram escritas por Cyrus Scofield. Scofield – que não tinha treinamento teológico formal, embora mais tarde ele alegasse ter um diploma de doutorado (doutor em divindade) – originalmente trabalhou como advogado e agente político no estado do Kansas e acabou se tornando o promotor público daquele estado.

Logo após sua nomeação para o cargo, ele foi forçado a renunciar como resultado de inúmeras denúncias de corrupção, incluindo suborno, falsificação de assinaturas em notas e roubo de doações políticas do então senador do Kansas James Ingalls. Durante esse período, Scofield abandonou sua esposa e duas filhas, uma ação que, desde então, culpou os crescentes escândalos que ele estava enfrentando, assim como seus pesados ​​hábitos de bebida.

Em meio a este pano de fundo, Scofield é dito ter se tornado um evangélico por volta de 1879 e logo se tornou associado a pregadores dispensacionalistas proeminentes da época, incluindo Dwight Moody e James Brookes. Os jornais locais da época, como o Atchison Patriot, consideravam o ceticismo e a conversão de Scofield com grande ceticismo, referindo-se a Scofield como o “advogado tardio, político e picareta em geral” que se desonrara ao cometer “muitos atos maliciosos”.

Scofield passou a pastorear igrejas relativamente pequenas, mudando-se do Kansas para Dallas, Texas e depois para Massachusetts. No entanto, apesar de sua falta de renome e sua conturbada história, em 1901 Scofield conseguiu entrar em um exclusivo clube masculino em Nova York – o Lotos Club, cujos membros na época incluíam o magnata do aço e multimilionário Andrew Carnegie, membros da família Vanderbilt e o famoso escritor americano Samuel Clemens, mais conhecido pelo seu pseudônimo, Mark Twain.


Pastor Scofield, ao centro, com os diáconos da Primeira Igreja Congregacional de Dallas,
por volta de 1880

A participação de Scofield neste clube exclusivo – assim como o patrocínio de suas atividades pelo clube, que lhe garantiu hospedagem e financiamento para produzir o que se tornaria a Bíblia de Referência Scofield – tem sido objeto de considerável especulação. De fato, muitos notaram que a presença de um pregador fundamentalista, dispensacionalista de uma cidade pequena, com um passado político em desgraça em um clube lotado com alguns dos acadêmicos, escritores e poderosos empresários (robber barons) mais elitistas do país, simplesmente não faz sentido.

Joseph M. Canfield, em seu livro O Incrível Scofield e seu Livro, afirmou que “a admissão de Scofield ao Clube de Lótus, que não poderia ter sido ideia de Scofield, fortalece a suspeita que surgiu antes, que alguém estava dirigindo o carreira de C.I. Scofield.

Joseph M. Canfield propõe a teoria em seu livro de que a pessoa que “dirige” a carreira de Scofield estava ligada ao advogado de Nova York e ativista sionista Samuel Untermeyer, membro do comitê executivo do clube e colaborador próximo de Louis Brandeis e influente na administração de Woodrow Wilson. Ele então observa que a bíblia anotada de Scofield foi mais “útil para convencer os cristãos fundamentalistas a apoiar o interesse internacional em um dos projetos favoritos de Untermeyer – o Movimento Sionista”.

Outros estudiosos, como David Lutz, têm sido mais explícitos do que Canfield em ligar o ativismo sionista de Untermeyer ao seu papel em apoiar financeiramente Scofield e seu trabalho em sua Bíblia anotada. Por fim, como o Blackstone Memorial antes dele, o patrocínio do trabalho de Scofield ao Lotos Club novamente revela o interesse da elite americana da época, cristã e judia, em promover o sionismo cristão.

Untermeyer e o Lotos Club notavelmente também financiaram as numerosas viagens de Scofield à Europa, incluindo uma fatídica viagem à Inglaterra, onde Scofield se reuniu com Henry Frowde, editor da Oxford University Press. Frowde ficou sensibilizado pelo trabalho de Scofield, em grande parte devido ao fato de que Frowde era um membro do “Exclusive Brethren”, um grupo religioso fundado por John Nelson Darby, o pai do dispensacionalismo. A Oxford University Press publicou posteriormente a Scofield Reference Bible em 1909. Vinte anos após sua publicação, tornou-se a primeira publicação de Oxford a gerar mais de um milhão de dólares em vendas.

A Bíblia de Scofield tornou-se espetacularmente popular entre os fundamentalistas americanos logo após a sua publicação, em parte porque foi a primeira bíblia anotada que buscou interpretar o texto para o leitor, bem como porque se tornou o texto central de vários seminários influentes que foram criados depois de sua publicação em 1909. Entre as muitas anotações de Scofield estão as reivindicações que se tornaram centrais para o sionismo cristão, como a anotação de Gênesis 12:3 de Scofield de que aqueles que amaldiçoam Israel (interpretado pelos cristãos sionistas como sendo o Estado de Israel desde sua fundação em 1948) serão amaldiçoados por Deus e aqueles que abençoam Israel serão igualmente abençoados.

Os cristãos sionistas modernos, como o pastor John Hagee dos Cristãos Unidos por Israel (CUFI), frequentemente citam essa interpretação que se originou com Scofield na defesa de posições extremistas pró-Israel. Por exemplo, Hagee fez a seguinte declaração em 2014:

“Você tem que voltar ao básico, com o fato de que em Gênesis (capítulo 1), Deus criou o mundo e fez uma promessa muito solene (trazida em Gen. 12:3), ‘abençoarei aqueles que te abençoarem e eu amaldiçoar aqueles que te amaldiçoam’. Daquele momento em diante, cada nação que já abençoou Israel foi abençoada por Deus. E toda nação que já perseguiu o povo judeu, Deus esmagou. E assim Ele continuará.”

Falwell e Likud: uma amizade ou outra coisa?

Apesar da ampla disseminação da Bíblia anotada de Scofield e sua popularização entre igrejas e seminários evangélicos norte-americanos, a influência pública da escatologia dispensacionalista e do sionismo cristão na política americana foi relativamente limitada durante grande parte do século XX. Contudo, a influência privada dos dispensacionalistas cristãos estava presente, como se pode ver através do papel do pregador dispensacionalista e defensor do Terceiro Templo, Billy Graham, e seus relacionamentos próximos com vários presidentes incluindo Dwight Eisenhower, Lyndon Johnson e Richard Nixon.

Então o poder político da teologia dispensacionalista mudou dramaticamente de seus aposentos privados do poder para o discurso político americano dominante com a fundação da “Moral Majority”, pelo pregador evangélico Jerry Falwell, em 1979.

No início dos anos 1970, o crescente ministério de Falwell estava trazendo milhões de dólares por ano, especialmente seu programa de transmissão nacional “A Hora Gospel do Tempo Antigo” que era veiculado na época em várias redes de TV a cabo. Apesar – ou talvez por causa – do aumento nas doações, Falwell logo foi alvejado pelo governo federal, especificamente a Securities and Exchange Commission (SEC), por “fraude e golpe” e “insolvência bruta” na gestão financeira de seu ministério, particularmente a venda do Ministério por US$ 6,6 milhões em títulos da igreja. O processo da SEC acabou por ser resolvido quando um grupo de empresários em Lynchburg, Virgínia – onde o Ministério de Falwell estava baseado – assumiu as finanças do Ministério pelos próximos anos, até 1977. Falwell culpou os problemas financeiros do seu ministério à sua “ignorância financeira”.


Jerry Falwell viaja com seu filho Jonathan, à direita, a bordo de seu jato particular em 2004.
Todd Hunley|Thomas Igreja Batista

Um ano depois de seu ministério estar aparentemente em melhor situação financeira, Falwell recebeu um convite para visitar o estado de Israel e todas as despesas de viagem foram pagas por Menachem Begin, então primeiro-ministro e líder do partido Likud. A viagem marcaria o início de uma longa amizade e relacionamento próximo entre Falwell e Begin e, mais amplamente, uma relação entre os líderes evangélicos americanos e o Partido Likud de Israel. Como o historiador israelense Gershom Gorenberg observa em seu livro O Fim dos Dias: Fundamentalismo e a Luta pelo Monte do Templo, a administração de Begin “foi a primeira a despertar o entusiasmo dos evangélicos por Israel e transformá-lo em apoio político e econômico”.

Logo depois de voltar de Israel, as finanças de Falwell ficaram sob investigação federal depois que foi descoberto que ele havia transferido as apólices de seguro de saúde de seus funcionários para uma empresa-fantasma não licenciada com apenas US$ 128 em ativos e centenas de milhares de dólares em reclamações não pagas. Assim que os problemas financeiros de Falwell voltaram a aumentar, ele recebeu um generoso presente de ninguém menos do que Begin, na forma de um Learjet privado avaliado em US $ 4 milhões. Pouco tempo depois, Falwell fundou a organização Moral Majority, “depois de consultas com teólogos e estrategistas políticos”.

Acredita-se que a Moral Majority tenha transformado a direita cristã evangélica em uma grande força política nos Estados Unidos, promovendo políticas extremamente pró-Israel, aumento os gastos com defesa, uma abordagem segundo Reagan dos desafios da Guerra Fria, bem como políticas domésticas conservadoras. Falwell frequentemente utilizou seu presente de Begin para viajar e promover a nova organização, bem como a si mesmo como grande figura pública.

Moral Majority marca um claro ponto de virada no relacionamento evangélico EUA-Israel, quando fez um apoio fervoroso para Israel em uma área de grande importância para os eleitores evangélicos e também levou muitos deles a prestar mais atenção aos eventos que estão acontecendo no Oriente Médio. No entanto, dada à forte promoção de Falwell do sionismo cristão, muitos evangélicos que se tornaram cada vez mais ativos politicamente após a fundação da organização não apenas apoiaram as políticas israelenses da época, mas também apoiaram muitas das futuras ambições de Begin e do Partido Likud. Esse apoio foi solidificado pelo início da prática contínua do Ministério do Turismo israelense em oferecer aos líderes evangélicos dos EUA visitas gratuitas de “familiarização” a Israel no início dos anos 80.

A visão de Begin da “Grande Israel” – a anexação completa da Palestina, bem como grandes partes do Líbano, Síria, Iraque e Egito por Israel – também foi compartilhada e promovida por Falwell. Em 1983, Falwell declarou que “Begin dirá rapidamente: ‘Ainda não temos todas as terras que vamos ter'”, e previu ainda que Israel jamais renunciaria ao controle sobre a Cisjordânia ocupada porque Begin estava determinado a manter a terra “que foi entregue a eles (os israelitas)”.

Falwell definiu as ambições expansionistas de Begin como uma crença religiosa na “inerrância do Antigo Testamento”, um sentimento que Falwell compartilhava. Falwell também pressionou por um reconhecimento dos EUA de Jerusalém como a capital de Israel e sentiu que a construção de um Terceiro Templo no Monte do Templo era necessária para inaugurar o fim dos tempos e a segunda vinda de Cristo.

Quando Falwell ajudou a transformar o sionismo cristão em uma força política importante nos Estados Unidos, ele também se tornou uma figura política importante na era Reagan e um importante intermediário para as relações entre os EUA e Israel. Em 1981, Begin informou Falwell sobre seus planos para bombardear uma instalação nuclear iraquiana antes de informar a administração Reagan com a esperança de que Falwell “explicasse ao público cristão as razões do bombardeio”. Segundo o acadêmico canadense David S. New, Begin disse a Falwell durante um telefonema: “Comece a trabalhar para mim.”

Além disso, Falwell frequentemente se reunia com Begin, a quem ele mais tarde chamava de amigo pessoal, e essas reuniões frequentemente coincidiam com as reuniões oficiais de Begin com Reagan. Um ano depois, Begin deu o prêmio Jabotinsky a Falwell, fazendo de Falwell o primeiro não-judeu a receber a honra por sua defesa em nome de Israel e, mais especificamente, das políticas e ambições do Likud.

Embora a Moral Majority oficialmente tenha fechado suas portas em 1989, seu legado político persistiu muito tempo depois, assim como a influência política de Falwell. De fato, seguindo o modelo de Begin, Benjamin Netanyahu, durante seu primeiro mandato como primeiro-ministro, também tinha o hábito de visitar Falwell, encontrando-se com o polêmico pastor mesmo antes de se reunir com autoridades políticas em suas visitas a Washington.


Netanyahu, a esquerda, encontra Falwell em um hotel em Washington, 19/01/98. Greg Gibson | AP

Durante uma viagem a DC em 1998, a primeira visita de Netanyahu foi a um evento co-organizado por Falwell, onde o pastor elogiou Netanyahu como “o Ronald Reagan de Israel”. O New York Times descreveu o propósito da visita de Netanyahu aos EUA não como uma visita oficial para reunir-se com funcionários do governo, mas pretendia-se “reforçar sua base de apoio tradicional nos Estados Unidos. Grupos cristãos conservadores há muito tempo são fervorosos defensores de Israel por causa de sua importância religiosa para o cristianismo”.

No entanto, essa relação entre sionistas cristãos como Falwell e proeminentes políticos israelenses de direita não ficou sem sua controvérsia, especialmente considerando que os evangélicos pró-Israel, como Falwell, têm uma história de fazer declarações antissemitas.

Por exemplo, durante um sermão de 1999, Falwell discutiu sua interpretação da profecia do fim dos tempos, amplamente compartilhada pelos cristãos evangélicos sionistas, de que a Segunda Vinda não seguiria apenas a criação do estado de Israel, mas a construção de um Terceiro Templo no Templo do Monte, onde reinaria uma figura conhecida pelos cristãos como o “Anticristo”. Respondendo a sua própria pergunta retórica, se o Anticristo está “vivo e bem hoje”, Falwell declarou: “provavelmente, por que quando ele aparecer durante o período da tribulação, ele será uma falsificação adulta de Cristo. Claro, ele será judeu.”

Os comentários de Falwell foram imediatamente condenados por uma variedade de grupos judaicos, incluindo a Liga Anti-Difamação (ADL). O rabino Leon Klenicki, então diretor de assuntos inter-religiosos da ADL, observou que a opinião de Falwell é uma “posição teológica comum” entre os evangélicos americanos e que Falwell era “uma voz influente entre os cristãos evangélicos e carismáticos” que “apoia Israel apenas por causa de seus fins cristológicos ”. “Ele nos vê apenas como aqueles que preparam a vinda de Jesus”, declarou Klenicki na época. “É uma grande decepção depois de mais de 30 anos de diálogo; ele ainda está na Idade Média”.

Outro dispensacionalista proeminente com grande influência política e literária é Hal Lindsey, autor e co-autor de vários livros, incluindo The Late Great Planet Earth. O trabalho de Lindsey influenciou muitos políticos norte-americanos proeminentes como Ronald Reagan, que ficou tão comovido com os livros de Lindsey que convidou Lindsey para discursar em uma reunião do Conselho de Segurança Nacional sobre planos de guerra nuclear e ajudou Lindsey a ser consultora influente de vários membros do Congresso e do Pentágono.

Como observado pelo historiador israelita Gershom Gorenberg, Lindsey vê os judeus como servindo a “dois papéis centrais” na escatologia dispensacionalista cristã:

O primeiro – apesar de sua insistência no amor aos judeus – é o clássico da polêmica antijudaica cristã: eles são “o povo judeu que crucificou Jesus” e o arquétipo dos que ignoram a verdade da profecia. O segundo papel é cumprir a profecia apesar deles mesmos”.

Gorenberg observa ainda que Lindsey acredita que os judeus cumpriram duas das três profecias cruciais que inaugurarão o fim dos tempos, sendo a primeira a criação do estado de Israel, em 1948; a segunda sendo a conquista e ocupação israelense de Jerusalém após o Guerra dos Seis Dias, em 1967. De acordo com Lindsey: “Resta apenas mais um evento para definir completamente o palco para a participação de Israel no último grande ato de seu drama histórico. A reconstruição do antigo templo…

Como os comentários de Falwell e Lindsey revelam, as visões escatológicas do dispensacionalismo frequentemente percebem o povo judeu como pouco mais do que peões que devem cumprir certos requisitos – por exemplo, estabelecer o estado de Israel, conquistar Jerusalém, construir um Terceiro Templo – para apressar a salvação e “arrebatamento” dos cristãos evangélicos. Enquanto isso, espera-se que judeus de Israel, que não se converterem ao cristianismo, tenham mortes horríveis, embora alguns sionistas cristãos nos últimos anos, como veremos em breve, tenham procurado ajustar essa posição teológica ainda comum.

Apesar das motivações antissemitas subjacentes ao apoio evangélico ao Estado de Israel e à visão apoiada pelo Likud do “Grande Israel”, o movimento cristão sionista politicamente ativo que Falwell ajudou a criar, traduziu-se em uma forte base de apoio a Israel e à política de direita do Likud. Isso foi crucial para alguns proeminentes políticos israelitas.

Por exemplo, uma parte significativa dos cristãos norte-americanos (55%), mais do que os judeus do país (40%), acredita que Deus entregou Israel aos judeus, enquanto esse sentimento é compartilhado por apenas 19% dos cristãos israelenses. Além disso, com relação às políticas pró-Israel do governo Trump, apenas 15% dos cristãos evangélicos acreditam que o presidente Trump favorece Israel com muita força, enquanto 42% dos judeus americanos acreditam que Trump é parcial em favor de Israel.

Em um vídeo gravado no início dos anos 2000 – mais tarde transmitido na TV israelita – Netanyahu, falando a uma família de colonos judeus, descreveu o apoio em massa dos americanos, particularmente evangélicos, como “absurdo”, dizendo:

A América é algo que pode ser facilmente movido. Movido na direção certa. Eles não vão atrapalhar; 80% dos americanos nos apoiam. É absurdo.

Em um discurso de 2017 para o grupo cristão sionista CUFI, Netanyahu deixou claro que grande parte desse apoio “absurdo” veio dos evangélicos norte-americanos, afirmando que “a América não tem melhor amigo do que Israel e Israel não tem melhor amigo que os Estados Unidos, e Israel não tem melhor amigo na América do Norte do que você”.

Richard Silverstein – um acadêmico e jornalista cujo trabalho foi publicado no Haaretz e MintPress, entre outros meios – argumentou que os políticos israelitas, particularmente Netanyahu, procuraram o apoio de grupos evangélicos, apesar de seus deslizes antissemitas e do fato de eles agirem por interesse próprio na busca de seus objetivos políticos.

Em um artigo de 2017, Silverstein afirmou que para a direita nacionalista de Israel:

O judaísmo não é um valor espiritual, é uma manifestação física de poder no mundo. Esses israelitas entendem que nem todos os judeus são seus “irmãos”. Alguns judeus são exagerados demais, liberais demais, humanos demais e universalistas demais. Estes judeus são os detritos que serão lavados pela maré da história. Os nacionalistas israelitas precisam substituir esses tradicionais aliados judeus e o fizeram encontrando novos: evangélicos cristãos, ditadores africanos, neonazistas europeus. O sionismo, tal como o define, é menos um movimento dedicado à ética e mais dedicado ao interesse próprio.”

Uma “parte vital da segurança nacional de Israel”

Quando Falwell começou a desvanecer-se da visão pública no início dos anos 2000, seu legado caiu em grande parte para um punhado de pregadores agora na vanguarda do sionismo cristão e ativismo político sionista cristão, com o filho de Falwell, Jerry Falwell Jr., ocupando um lugar de destaque entre eles. No entanto, dos pregadores que seguiram os passos de Falwell, um se destaca: John Hagee.

Hagee é o pastor da Igreja Cornerstone em San Antonio, Texas, que conta com a participação de mais de 22.000 membros ativos. Cristão carismático que acredita na escatologia dispensacionalista e acha que os cristãos são biblicamente obrigados a apoiar Israel, Hagee tem sido um grande defensor de Israel dentro dos carismáticos círculos evangélicos do cristianismo e arrecadou mais de US$ 80 milhões para Israel desde que começou a promover o evento “Uma noite para honrar Israel”, no início de 1980.

Em 2006, Hagee procurou criar o “Christian AIPAC” e reviveu uma organização extinta anteriormente fundada em 1975, conhecida como Cristãos unidos por Israel – CUFI, mencionada no início deste artigo. Desde sua refundação, o CUFI cresceu exponencialmente, agora contando com 7 milhões de membros, um número que excede à população judaica dos Estados Unidos (cerca de 5,7 milhões). Hagee preside seu conselho executivo, que incluiu Jerry Falwell, até a morte deste em 2007.


O vice-presidente Pence, à esquerda, saúda Hagee na cúpula anual do CUFI,
8 de julho de 2019, em Washington. Patrick Semansky | AP

A CUFI está isenta do pagamento de impostos nos EUA e de divulgar publicamente suas finanças, pois está oficialmente registrada como uma igreja, embora seja frequentemente comparada a um braço do lobby pró-Israel nos Estados Unidos e promove ativamente e financia assentamentos ilegais na Cisjordânia. O CUFI também defende a soberania israelense sobre toda Jerusalém e o Monte do Templo e a construção do Terceiro Templo.

Muito tem sido escrito sobre a influência do CUFI no Partido Republicano, que começou sob o governo de George W. Bush, logo após sua fundação. Como o jornalista Max Blumenthal observou em um artigo de 2006 para The Nation: “Nos últimos meses, a Casa Branca convocou uma série de reuniões off-the-record sobre suas políticas no Oriente Médio com líderes dos Cristãos Unidos por Israel (CUFI).

Como resultado dessas reuniões, o CUFI alinhou-se firmemente aos neoconservadores que estavam bem representados no governo Bush, chegando a nomear o neoconservador e cristão sionista Gary Bauer para seu conselho e nomeando Bauer como o primeiro diretor de seu braço de lobby, o CUFI Action Fund. Bauer é um membro fundador do altamente controverso e agora extinto grupo neoconservador, Projeto para um Novo Século Americano (PNAC), e também atuou no conselho executivo do grupo neoconservador Fundação para a Defesa das Democracias (FDD).

Desde então, o CUFI conquistou aliados poderosos e conta com o neoconservador Elliott Abrams; o ex-diretor da CIA, James Woosley; o neoconservador Bill Kristol; o ex-governador do Arkansas, Mike Huckabee; os senadores Lindsey Graham (R-SC), Tom Cotton (R-AR) e Ted Cruz (R-TX); o primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu; e o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, entre seus mais fiéis partidários. Em uma cúpula do CUFI, no ano passado, Netanyahu descreveu-o como uma “parte vital da segurança nacional de Israel”.

Além disso, o CUFI tem laços estreitos com o magnata dos jogos, Sheldon Adelson, o principal doador do presidente Trump e de todo o Partido Republicano. Adelson recebeu um prêmio especial de Hagee em um evento da CUFI, em 2014. “Eu nunca tive uma sensação mais calorosa do que ser homenageado pelo pastor Hagee”, disse Sheldon Adelson radiante na época.

Na mais recente cúpula da CUFI, realizada na segunda-feira, a administração Trump enviou Pence, Pompeo, o embaixador dos EUA em Israel David Friedman, o assistente do presidente e representante especial para as negociações internacionais Jason Greenblatt e o conselheiro de segurança nacional John Bolton, todos os quais discursaram no evento.

A CUFI está isenta do pagamento de impostos dos EUA e de divulgar publicamente suas finanças porque está oficialmente registrada como uma igreja, embora seja frequentemente comparada a um braço do lobby pró-Israel nos Estados Unidos e promova ativamente e financie assentamentos ilegais na Cisjordânia. O CUFI também defende a soberania israelita sobre toda Jerusalém e o Monte do Templo e a construção do Terceiro Templo.

Muito tem sido escrito sobre a influência do CUFI no Partido Republicano, que começou sob o governo de George W. Bush logo após a sua fundação. Como o jornalista Max Blumenthal observou em um artigo de 2006 para o The Nation: “Nos últimos meses, a Casa Branca convocou uma série de reuniões informais sobre suas políticas no Oriente Médio com líderes dos Cristãos Unidos por Israel (CUFI)”.

Como resultado dessas reuniões, o CUFI alinhou-se firmemente aos neoconservadores que estavam bem representados no governo Bush, chegando a nomear o neoconservador e cristão sionista Gary Bauer para seu conselho e posteriormente nomeando-o como primeiro diretor da ramificação do lobby, o CUFI Action Fund. Bauer é membro fundador do altamente controverso e agora extinto grupo neoconservador, Projeto para um Novo Século Americano (PNAC), e também atuou no conselho executivo do grupo neoconservador Fundação para a Defesa das Democracias (FDD).

Desde então, o CUFI conquistou aliados poderosos e conta com o neoconservador Elliott Abrams; o ex-diretor da CIA, James Woosley; arconista neoconservador Bill Kristol; o ex-governador do Arkansas, Mike Huckabee; os senadores Lindsey Graham (R-SC), Tom Cotton (R-AR) e Ted Cruz (R-TX); o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu; e o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, entre seus mais fiéis partidários. Em uma cúpula do CUFI no ano passado, Netanyahu descreveu a entidade como uma “parte vital da segurança nacional de Israel”.

Além disso, o CUFI tem laços estreitos com o magnata dos cassinos – Sheldon Adelson, o principal doador do presidente Trump e de todo o Partido Republicano. Adelson recebeu um prêmio especial da Hagee em um evento do CUFI, em 2014. “Eu nunca tive uma sensação mais calorosa do que ser homenageado pelo pastor Hagee”, disse Sheldon Adelson radiante na época.

Na mais recente cúpula CUFI, realizada na segunda-feira, a administração Trump enviou Pence, Pompeo, o embaixador dos EUA em Israel – David Friedman, o assistente do presidente e representante especial para negociações internacionais – Jason Greenblatt e o conselheiro de segurança nacional John Bolton, todos os quais discursaram no evento.

Além de sua própria influência como organização, o grupo fez do próprio Hagee um importante ator político. Em 2007, o então senador Joseph Lieberman (D-CT) comparou Hagee a Moisés, afirmando:

“Eu quero aproveitar a oportunidade para descrever o pastor Hagee nos termos que a Torá usou para descrever Moisés. Ele é um Ish Elohim. Um homem de Deus. E essas palavras realmente se encaixam nele. E eu tenho outra coisa. Como Moisés, ele se tornou o líder de uma multidão poderosa. Ainda maior que a multidão que Moisés levou do Egito para a Terra Prometida”. Uma mitológica marcha que pode ser feita a pé em 10 dias… – NR

Esforços de políticos proeminentes para o tribunal de Hagee já foram numerosos, até que evidências de Hagee fazendo comentários sobre o Holocausto durante a campanha presidencial, de 2008, foram considerados amplamente antissemitas. Nessas observações, Hagee afirmou que Adolf Hitler havia sido enviado por Deus para atuar como um “caçador” e forçar os judeus por meio do Holocausto a se reinstalarem na Palestina, como um meio de cumprir a profecia bíblica. O candidato republicano à presidência, John McCain, que cortejou agressivamente o endosso de Hagee, foi forçado a se distanciar de Hagee depois que esses comentários ressurgiram.

No entanto, o estigma em torno de Hagee, desde então, e sua influência estão novamente em ascensão após a eleição de Trump para a presidência, como evidenciado pela participação de numerosos altos funcionários Trump para o Encontro 2019 do CUFI Washington, no início desta semana.

Embora ele não tenha sido incluído na diretoria oficial dos conselheiros evangélicos de Trump, no começo da presidência deste, vários aliados e associados de Hagee eram ligeiramente controversos, incluindo aqui Tom Mullins, Jerry Falwell Jr. e Kenneth Copeland. Então, alguns meses após a posse de Trump, Hagee “apareceu” na Casa Branca sem avisar e se encontrou com o presidente no Salão Oval para discutir o apoio dos EUA a Israel. Ele também se reuniu com Trump algumas semanas antes deste anunciar planos de transferir a embaixada dos EUA em Israel para Jerusalém, uma reunião na qual Trump teria prometido a Hagee que a embaixada logo seria transferida e disse ao pastor: “Não vou decepcionar você”. Hagee descreveu o anúncio de Trump em Jerusalém como tendo “tempo bíblico de precisão absoluta”.

Mais recentemente, Hagee fez parte de um grupo exclusivo de líderes evangélicos que se reuniram com funcionários da Casa Branca em março passado, antes da liberação parcial do chamado “Acordo do Século”, que visa levar “paz” à Palestina. Este acordo é amplamente visto como favorecendo enormemente Israel e deve ser rejeitado pela liderança palestina.

Após a reunião, Hagee fez um pedido de oração urgente. “Nosso tópico de discussão foi discutir o futuro plano de paz relativo a Israel. Israel e o povo judeu precisam de nossas orações e nossa defesa como nunca antes”, disse Hagee em um vídeo postado na página do Twitter da CUFI, logo após a reunião. “A Bíblia dá o mandamento: ‘Por causa de Sião, não vou ficar em silêncio, e por amor a Jerusalém, não vou manter a minha paz’. Peço-lhe esta noite que ore pela paz de Jerusalém.”

Como a parte final desta série mostrará, as visões apocalípticas compartilhadas de sionistas religiosos extremistas e sionistas cristãos, a respeito de um Terceiro Templo Judaico no Monte do Templo, é um grande impulsionador por trás do Acordo do Século e também foi um fator importante no governo de Trump na decisão de reconhecer Jerusalém como a capital de Israel, e apesar das esperanças palestinas de que Jerusalém Oriental servisse como capital do seu futuro Estado. Notavelmente, os cristãos sionistas acreditam que os palestinos devem ser expulsos de Israel. Além disso, essas crenças do fim dos tempos também são um fator na pressão do governo pela guerra contra o Irã, que os cristãos sionistas – como Hagee e Pompeo – acreditam ser também um requisito para o cumprimento da profecia bíblica.

Enquanto a influência de Hagee e a influência de sua organização CUFI estão mais fortes do que nunca com Trump na Casa Branca, sua influência política com a administração Trump é, pelo menos parcialmente, devido à presença de cristãos sionistas em dois dos principais cargos no país. Poder Executivo: vice-presidente e secretário de Estado.

Pence e Pompeo empurram “guerra santa”

Embora vários funcionários de Trump tenham discursado na recente cúpula CUFI, dois se destacam – não apenas por suas posições de alto escalão, mas também por suas admissões abertas de que suas crenças sionistas cristãs guiam suas políticas. Esses funcionários são o vice-presidente Mike Pence e o secretário de Estado e ex-diretor da CIA, Mike Pompeo.

Depois que Trump escolheu seu companheiro de chapa, o fervor religioso de Pence ficou sob o escrutínio da mídia, com vários veículos notando que ele era conhecido por ser um fervoroso sionista cristão. A fé de Pence ganhou atenção especial devido às suas declarações passadas sobre Israel, que ele freqüentemente descreveu em termos proféticos.

Embora criado católico, Pence gradualmente passou a ser um “católico evangélico” e depois a um protestante evangélico e desde então se tornou uma figura política fundamental que representa o movimento cristão fundamentalista que promove o “dominionismo”, uma ideologia que varia em suas interpretações mas em última análise a natureza secular do governo dos EUA muda para uma governada pela “lei bíblica”. A associação de Pence com esse movimento levou as vozes proeminentes da mídia a acusá-lo de apoiar uma forma teocrática de governo.

Embora muitas das preocupações iniciais sobre Pence girassem em torno de seus prováveis ​​efeitos sobre a política interna, grande parte de sua atuação foi vista na política externa, incluindo a política do governo para o Oriente Médio. Sua identificação pública como um sionista cristão e seu discurso na cúpula do CUFI de 2017, o primeiro vice-presidente a falar no evento anual, levou alguns a se preocuparem que a visão sionista cristã da profecia esteja guiando as ações políticas de Pence.


Pence visita o Muro das Lamentações, o local mais sagrado do judaísmo na Cidade Velha de Jerusalém,
em 23 de janeiro de 2018. Oded Balilty | AP

Após o primeiro discurso de Pence na CUFI, Daniel Hummel, um acadêmico e membro da Harvard’s Kennedy School, disse ao Washington Post:

O sionismo cristão tem uma longa história na política americana, mas nunca conquistou o púlpito da Casa Branca. Administrações passadas freqüentemente usavam linguagem bíblica geral em referência a Israel, mas nunca a teologia evangélica do sionismo cristão esteve tão próxima do aparato de formulação de políticas do poder executivo.

Ao identificar-se com o sionismo cristão enquanto estava no cargo, Pence arrisca a busca contínua do governo Trump por um “acordo final” para resolver o conflito judeo-palestino e corrói a alegação dos EUA de que ele pode ser um “intermediário honesto” no Oriente Médio.

As preocupações de que os EUA estejam sob influência do sionismo religioso extremista e do sionismo cristão, que impediriam o país de agir como um “corretor honesto” no conflito judeo-palestino, sem surpresa, se mostraram verdadeiras. Na verdade, acredita-se que as crenças religiosas de Pence tenham sido um fator importante na decisão de Trump em reconhecer Jerusalém como a capital de Israel e transferir a Embaixada dos EUA para a cidade contestada.

Embora Mike Pence seja o membro de mais alto escalão da administração Trump, que é abertamente um sionista cristão, é Pompeo o mais aberto e também mais claro sobre como suas crenças religiosas sobre o fim dos tempos guiam sua tomada de decisão como chefe do Departamento de Estado dos EUA.

Durante toda a sua carreira política, Pompeo definiu a política de contraterrorismo dos EUA como uma “guerra santa” entre o cristianismo e o islamismo, que ele acredita ser o equivalente terrestre de uma batalha cósmica entre o bem e o mal. Em 2017, como diretor da CIA, Pompeo afirmou:

O terror islâmico radical [continuará] a pressionar-nos até que tenhamos certeza de que oramos e nos posicionamos e lutamos para que saibamos que Jesus Cristo é nosso salvador [e] verdadeiramente a única solução para o nosso mundo.”

Nesse mesmo ano, Pompeo criou um novo “centro missionário” da CIA, dirigido por Michael D’Andrea, cujo apelido é “O Príncipe das Trevas”. Pompeo, como muitos cristãos sionistas, acredita que a guerra entre os Estados Unidos e o Irã faz parte do fim dos tempos, uma crença que é totalmente alarmante, dado seu controle anterior sobre as operações secretas da CIA e seu foco no Irã, bem como seu papel atual como chefe dos diplomatas dos EUA, no qual ele também tem se concentrado em promover uma política agressiva em relação ao país dos Aiatolás.

Além de seus pontos de vista sobre a “guerra santa”, Pompeo também freqüentemente discutia suas opiniões sobre o arrebatamento enquanto servia como diretor da CIA. A TYT informou no ano passado que Pompeo havia falado sobre o arrebatamento com tanta frequência que, segundo relatos, havia assustado altos funcionários da CIA.

De acordo com Michael Weinstein – fundador da Military Religious Freedom Foundation, um grupo de vigilância sobre questões de liberdade religiosa na comunidade militar e de inteligência – que foi citado no relatório do TYT:

“Ele [Pompeo] é intolerante com qualquer um que não seja cristão fundamentalista. As pessoas que trabalharam com ele na CIA, que vieram até nós, nunca ficaram confusas – elas nunca tiveram tempo para ficar confusas. Eles ficaram chocados e então ficaram com medo de merda.”

Um vídeo de 2015 de Pompeo, que apareceu enquanto ele era diretor da CIA, também mostra o ex-congressista descrevendo a política como “uma luta sem fim … até o arrebatamento”.

Mais recentemente, um artigo do New York Times publicado em março novamente trouxe de volta à opinião pública a obsessão de Pompeo com o fim dos tempos. Intitulado “O arrebatamento e o mundo real: Mike Pompeo combina crenças e políticas”, o artigo detalha como Pompeo tornou o procedimento operacional padrão para misturar suas visões sionistas cristãs com sua abordagem à política externa. Esse artigo também fez referência à declaração feita por Pompeo no início deste ano, na qual ele opinou que era “certamente possível” que o presidente Trump tivesse sido enviado por Deus para “salvar o povo judeu da ameaça iraniana”.

Pompeo fez essas declarações durante uma viagem oficial a Jerusalém que também foi controversa por outras razões. De fato, em um vídeo do Departamento de Estado compartilhado nas mídias sociais e destinado a divulgar a viagem de Pompeo, imagens de um modelo do Terceiro Templo Judaico foram incluídas, enquanto as imagens da mesquita de Al Aqsa foram excluídas, apesar de ser o edifício mais icônico de Jerusalém.

Dado que Pompeo também visitou os túneis que desgastaram as fundações da mesquita histórica, muitos palestinos tomaram o vídeo como um sinal de que o governo Trump estava conspirando com o movimento ativista do templo em Israel, que foi discutido em detalhes na Parte II desta série.

Unindo forças para atingir Jerusalém

Bem antes de Theodore Herzl fundar o sionismo político e publicar O Estado Judaico, os cristãos sionistas nos Estados Unidos e na Inglaterra já estavam procurando direcionar e influenciar a política externa de ambas as nações a serviço de uma obsessão religiosa por inaugurar o fim dos tempos. O registro histórico mostra claramente como os cristãos sionistas influenciaram os eventos ao longo da história, particularmente no que diz respeito à fundação do estado de Israel e aos desenvolvimentos subsequentes no conflito judeo-palestino.

Na busca dessas profecias dispensacionalistas do fim dos tempos, os sionistas cristãos forjaram alianças com os sionistas judeus e cada um usou oportunisticamente o outro para anunciar os eventos comuns que supostamente facilitam a vinda de seus respectivos apocalipses ou para ajudar os mais seculares objetivos políticos. De Hechler e Herzl, a Scofield e Untermeyer, a Begin e Falwell, essas alianças moldaram a política dos governos ocidentais, particularmente os EUA e a Inglaterra, por mais de um século.

Hoje, apenas uma dessas profecias ainda precisa ser cumprida, a construção de um Terceiro Templo Judaico no Monte do Templo, atualmente ocupado pela mesquita de Al Aqsa. Agora, mais do que nunca, o governo de Israel, como mostrado na Parte II, está cheio de funcionários de alto escalão que chamam abertamente pela destruição de Al Aqsa e procuram construir apressadamente um Terceiro Templo. Da mesma forma, como este relatório mostrou, a administração Trump é grandemente influenciada por cristãos sionistas que também buscam a destruição da mesquita, na esperança de que o Terceiro Templo seja construído em breve.

No entanto, os laços do governo Trump com esta ideologia apocalíptica vão ainda mais fundo do que foi discutido neste artigo, como muitos outros membros influentes na administração Trump – especialmente os principais conselheiros de Trump, Jared Kushner e Jason Greenblatt, e o embaixador dos EUA em Israel, David Friedman: compartilhar e promover ativamente essa ideologia sionista religiosa extremista que busca reconstruir um terceiro templo. Como será visto no próximo capítulo desta série, essa ideologia também é um fator determinante para os principais doadores do Trump e do Partido Republicano, como Sheldon Adelson.

O resultado final é que o domínio dessa ideologia apocalíptica sobre os governos de Israel e dos Estados Unidos parece estar mais forte do que nunca, significando que o perigo que atualmente se enfrenta à mesquita de Al Aqsa e à paz mundial é iminente.