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sexta-feira, 31 de julho de 2020

Norberto Ceresole e a Crise Venezuelana



Hoje o nome de Norberto Ceresole talvez seja desconhecido para a maioria das pessoas que nem conhecem seu trabalho, mas este sociólogo militar e analista geopolítico foi um dos grandes teóricos da revolução bolivariana na Venezuela.

Norberto Ceresole conheceu Hugo Chávez muito antes de ele se tornar presidente, em suas primeiras viagens à Venezuela em 1995. Naquela época, o exilado argentino tentou aconselhar Chávez e convencê-lo da necessidade de uma revolução baseada em uma geopolítica continentalista e em um caudilhismo pós-democrático que se tornaria um futuro farol de liberdade para a América Latina. Ceresole procurou aplicar seu modelo revolucionário segundo o qual o exército, o caudilho e o povo formariam uma tríade capaz de se entrelaçar em um destino comum, cujo objetivo seria a soberania, a independência técnico-militar e a criação de uma frente multipolar, aliada a outras nações do Terceiro Mundo, especialmente no Oriente Médio e próxima ao nacionalismo árabe. 


O jovem comandante Hugo Chávez, ainda fortemente influenciado pelo Movimento Bolivariano Revolucionário-200, prestou pouca atenção ao professor argentino, que mais tarde seria ameaçado de deixar a Venezuela, segundo ele, pelo DISIP, sob a supervisão do MOSSAD.

De todas as críticas feitas pelo agora falecido sociólogo, talvez uma delas continue sendo decisiva para entender o declínio do processo venezuelano: para Ceresole, havia de fato duas correntes opostas dentro da revolução bolivariana venezuelana que acabariam produzindo um conflito interno a qualquer momento: “hoje, a revolução bolivariana está debatendo entre duas opções excludentes: a social-globalista e a nacional-continentalista ou bolivariana propriamente dita”. Como tantas outras vezes na história do mundo, a revolução e a contrarrevolução coexistem, provisoriamente, dentro do mesmo processo político” (1). Assim, ele formulou a hipótese de uma guerra civil dentro do Chavismo que acabaria por dividir a revolução ao meio e conduziria gradualmente o país ao caos e à ingovernabilidade. A primeira corrente, como ele mesmo aponta, seria a social-democracia ou os social-globalistas, um conjunto diversificado de correntes políticas que representam a doença infantil do esquerdismo: “A contrarrevolução não é apenas a Oligarquia Globalizadora, mas também seus parceiros de esquerda (armados ou civilizados, bolcheviques ou social-democratas, castristas ou simplesmente progressistas, todos filhos da mesma teologia e do mesmo pai messiânico), que procuram se nfiltrar no processo revolucionário nacional, que é autenticamente endógeno, para pervertê-lo e anulá-lo”(2). Esta esquerda global, pós-moderna, social-democrática e fabulosa, cujo chefe político-ideológico seria a London School of Economics e o Deep State britânico, seria composta por todo o tipo de oportunistas e agentes duplos: do ex-presidente Juan Manuel Santos na Colômbia a Luis Rodríguez Zapatero na Espanha, e incluindo outros intelectuais alter-globalistas e democratas sionistas como Jimmy Carter e Noam Chomsky, ou países e instituições religiosas como a Noruega e o Vaticano.

Contra esse esquerdismo infantil, existiria o processo revolucionário nacional populista do populismo bolivariano: um projeto geopolítico, militar e revolucionário que buscaria criar uma Grande Pátria Americana, baseada em exércitos nacionais, impulsionada por um grande líder e apoiada por um povo heróico mobilizado por uma ideologia de luta adaptada ao século XXI. Norberto Ceresole não parava de alertar que os novos movimentos revolucionários do nosso continente já não podiam contar com todo o lixo ideológico produzido no Primeiro Mundo, concebido para sustentar o domínio colonial e envenenar o espírito da nossa juventude. O bolivarianismo “não pertence nem pode pertencer a nenhuma das famílias ideológicas que hoje compõem os sistemas sinárquicos globais hegemônicos: sejam elas as lojas de direitos humanos, os indigenistas profissionais, os fascistas nostálgicos orgânicos aos serviços de inteligência ocidentais, os marxistas-leninistas com sede de vingança, os social-democratas de mercado ou os sionistas que defendem a política de extermínio do Estado (cada vez mais judaico) de Israel” (3). Por outro lado, a modernização das forças armadas, suas alianças políticas e comerciais, devem girar em torno de Estados distantes da ordem internacional, como Síria, Irã, Rússia e China, tentando com isso ampliar as bases necessárias para uma sustentabilidade a longo prazo do processo revolucionário continental. Ao invés disso, a revolução bolivariana tentou buscar um equilíbrio entre as duas correntes, a nacional-continental e a social-globalista. Este duplo jogo diplomático, que Nicolás Maduro e seu gabinete tentaram usar a seu favor até agora, parece ser uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento, mergulhando a Venezuela no caos sistemático ou na guerra civil.

Em retrospectiva, as palavras de Norberto Ceresole parecem proféticas: apontar essa fratura ideológica e política que está provocando o colapso de todos os “movimentos progressistas” de nosso continente, especialmente os que se dizem de esquerda e fingem, falsamente, desafiar a Nova Ordem Mundial. Tal afirmação não é de modo algum supérflua e demonstra um problema sério do qual a esquerda política continental não consegue escapar. Nem o PT de Lula nem o Movimiento de Revolución Ciudadana de Rafael Correa representaram um verdadeiro desafio para o sistema internacional (sendo este último assediado pelas forças que supostamente defendia, como os indígenas, ecologistas, esquerdistas e progressistas de todas as listras, que agora retornaram à teia do globalismo). Os seus governos, por outro lado, caíram em escândalos de corrupção, ineficiência administrativa, falta de soberania financeira, desorientação política ou guerra sistemática contra as suas próprias bases populares. Pior ainda, eles acabaram ficando atolados em todo tipo de pequenas disputas e crises locais, chegando a um ponto insustentável, tanto política como economicamente, como é o caso da Venezuela.

Hoje, como temia Norberto Ceresole, a revolução bolivariana parece estar caminhando para o seu próprio suicídio. Vítima de suas próprias forças desintegradoras, o aparato econômico venezuelano está afundando em uma crise irremediável:

“A magnitude da crise venezuelana é inigualável na América. Eu a comparo ao que a Polônia experimentou durante a ocupação nazista (1939-43), quando perdeu 40% de seu PIB, sob bombardeio e genocídio. A Venezuela perdeu 50 por cento. O PIB per capita caiu 60 por cento nos últimos anos. Nem a Guatemala nem El Salvador, com suas guerras civis, caíram a esse extremo; isto é realmente assustador. Houve uma destruição indescritível do capital e das forças produtivas, não há produção, a produtividade caiu por terra, as importações também caíram muito e há milhares de empresas que fecharam, 70% delas. As que permanecem em atividade trabalham a 10 ou 15 por cento da sua capacidade. As empresas estatais também fecharam massivamente; a terceira maior empresa siderúrgica das Américas trabalha a 10 ou 15% de sua capacidade. A extração de petróleo caiu de 60 a 65%. A PDVSA, que era uma das principais companhias petrolíferas da região, não pode pagar os seus salários e depende de empréstimos que provêm de dinheiro inorgânico, capital fictício. Nos termos de Marx, a população operária excedente venezuelana, maquiada pelo petróleo, explodiu, porque essa maquiagem não existe mais. Apesar dos enormes subsídios, como a doação de gasolina, gás, eletricidade, água, sua renda não permite que as pessoas comprem mais de 10% do que precisam para comer. Há desnutrição, mas para o governo não há desemprego, não são publicados números desde 2015. Não há dados sobre o PIB, nem sobre a inflação. Diz-se que no setor formal há 6% de desemprego, provavelmente porque ninguém quer trabalhar no setor formal. Muitos são trabalhadores independentes ou deixaram o país, cerca de três ou quatro milhões, facilmente, 12 ou 13% da população, equivalente a 20 ou 25% da população economicamente ativa (cerca de 16 milhões). Não há desemprego porque o salário é extremamente baixo” (4).

Isso também acontece com sua nefasta tentativa extremista de destruir o tecido orgânico da organização política hispânica, o município (associado pelos ideólogos do chavismo ao colonialismo, à democracia representativa e às estruturas capitalistas), com a intenção de substituí-lo pela comuna, uma nova forma de socialismo autogestionário que seria a próxima etapa evolutiva de uma sociedade mais justa e igualitária, na qual todos os problemas anteriores desapareceriam, como que por magia:

“A Comuna é uma expressão concreta do poder popular através do autogoverno comunitário, da administração e gestão de competências e serviços, e até mesmo da organização econômico-produtiva. O autogoverno comunitário é a democracia direca. Através das assembleias de cidadãos, as comunidades que compõem a Comunidade exercem o autogoverno e assumem o planejamento, a coordenação e a execução do governo comunal. O poder de decisão, anteriormente representado na burocracia dos governos e prefeituras, é transferido para a comunidade. As direções e decisões coletivas tornam-se assim uma verdadeira descentralização” (5).

Ou seja, realizar uma auto-demolição programada do Estado nacional e soberano, substituí-lo pelas mil e uma vontades independentes de grupos desunidos e tribais que careceriam de algum princípio de unidade, ou como lhe chamaria Ceresole: “a delirante versão pós-moderna, elaborada pelo marxismo, e não apenas pelo marxismo soviético, da raça operária, possuindo todas as virtudes humanas e nenhum dos seus defeitos”. Em suma, a democratização do poder venezuelano, formulada pelos ideólogos oficiais do movimento bolivariano, acabaria por lançar a sociedade num caos incontrolável, não muito diferente de qualquer Estado fracassado onde múltiplos grupos lutam pelo poder: “Democratizar o poder hoje tem um significado claro e unívoco na Venezuela: significa ‘liquefazer’ o poder, significa ‘gaseificar’ o poder, significa anular o poder…”, em vez da relação simbiótica entre o caudilho e as massas, onde o povo venezuelano gerou um caudilho. “O núcleo do poder hoje é precisamente essa relação estabelecida entre o líder e as massas. Esta natureza única e diferenciada do processo venezuelano não pode ser distorcida nem mal interpretada. Estamos falando de um povo que deu uma ordem a um chefe, um caudilho, um líder militar” (6). Como se pode ver até agora, os avisos de Norberto Ceresole foram ignorados e os seus piores receios foram cumpridos ao pé da letra.

Em todo caso, o crescente assédio econômico e internacional da Venezuela, somado ao contínuo desgaste político do chavismo e as contradições internas produzidas pela “Nova Classe” da sociedade promovida pela revolução (causando um grave problema de corrupção), fazem do mesmo projeto revolucionário um passo decisivo que até agora queriam adiar, mas que está se tornando cada vez mais inevitável. Para Norberto Ceresole isto significava adotar uma nova abordagem continentalista que tem sido notória pela sua ausência extrema até agora. Em nossa opinião, porém, tal partida seria insuficiente diante da crescente polarização que está ocorrendo a nível mundial. Para isso, a nossa alternativa requer uma reconfiguração das forças combatentes em torno de um populismo abrangente, cuja missão será, em primeiro lugar, vencer a resistência produzida pelas forças liberais e social-globalistas entrincheiradas em cada nação. Esta luta deve ser o primeiro passo para a constituição de uma futura resistência ao sistema mundial pós-moderno.

Notas


1 - Norberto Ceresole, «Caracas, Buenos Aires, Jerusalén. Ejercito + Caudillo + Pueblo», en https://rebelioncontraelmundomoderno.wordpress.com/2019/07/20/caracas-buenos-aires-jerusalen-ejercitos-caudillo-pueblo/
2 - Ibíd.
3 - Ibíd.
4 - Entrevista al economista marxista Manuel Sutherland: «Estoy en contra de una invasión militar, pero no puedo aplaudir al Gobierno de Maduro», en https://www.rebelion.org/noticia.php?id=258943
5 - Víctor Álvarez R., Del Estado burocrático al Estado comunal, ob. Cit., pp. 154-155.
6 - Norberto Ceresole, «Caracas, Buenos Aires, Jerusalén. Ejercito + Caudillo + Pueblo», en https://rebelioncontraelmundomoderno.wordpress.com/2019/07/20/caracas-buenos-aires-jerusalen-ejercitos-caudillo-pueblo/

Quando foi que você e eu assinamos o tal 'contrato social'?

"Se vocês cidadãos não gostam da existência de um governo detentor do monopólio da coerção, da segurança e da justiça, não gostam de impostos, não gostam de regulamentações, e não gostam do status quo, então por que simplesmente não fazem as malas e vão embora?  Vocês implicitamente concordaram com as regras vigentes.  Se não gostam delas, então deem o fora!"

Este é o argumento comum oferecido por estatistas sempre que um cidadão se põe a falar sobre a imoralidade da coerção estatal, de seus impostos, de suas regulamentações, de seu confisco de renda e de propriedade, e de seu monopólio sobre a justiça, a segurança e a moeda.

Embora tal argumento seja extremamente fraco, vale a pena nos concentrarmos mais detidamente nele, pois ele mostra de maneira bastante acurada o quão profundo o estatismo está enraizado na mentalidade das pessoas.

A primeira e mais fácil resposta a este "desafio" estatista é: Por que sou eu quem deve dar o fora?  Não estou roubando ninguém, não estou agredindo ninguém. Por que o fardo moral recai sobre mim quando, na verdade, é você quem está me apontando uma arma?  Eu sou apenas uma pessoa pacífica pedindo para não ser espoliada, ao passo que você está me apontando uma arma com o intuito de me expropriar e utilizar a minha propriedade e a minha renda para financiar aqueles programas governamentais que você acha o máximo.

Não creio ser nada controverso dizer que, em termos morais, é o estatista quem tem a obrigação de comprovar ter o direito intrínseco de coagir e ameaçar os outros.  Enquanto isso não for feito, o ameaçado não tem nenhuma obrigação de comprovar seu direito de ser deixado em paz, sem ser molestado.  O ônus cabe ao agressor e não ao agredido.

Esse é o ponto mais básico.  Enquanto o estatista não responder de onde vem seu direito natural de espoliar terceiros para proveito próprio ou para o proveito de outrem, a "negociação" está emperrada e ele não tem nenhum direito de seguir adiante com sua espoliação.  Toda a pendenga poderia terminar aqui.

Porém, em prol do debate, vamos mais adiante.  Falemos agora sobre o argumento de que o seu consentimento está explicitado no simples fato de você permanecer no país.  "Se você está aqui e continua morando aqui, então você está automaticamente consentindo com as regras vigentes!", bradam os estatistas.

Este é outro raciocínio sem nenhuma sustentação e sem nenhuma lógica.  Suponha que você se muda para uma nova vizinhança e, do nada, seu vizinho começa a despejar o lixo dele na porta da sua casa.  Pela lógica estatista, se você não concorda com este comportamento dele, então é você quem tem de se mudar dali.  Se você não se mudar, então você está automaticamente consentindo em ter sua propriedade violada desta forma.

Faz sentido?  Pois é isso que os estatistas estão defendendo, embora não utilizem este cenário.

Confrontados com esta situação, os estatistas recorrem então à regra da "aceitação implícita e tácita".  Mais especificamente, eles dizem que, ao se mudar para esta vizinhança, você estaria implícita e tacitamente aceitando o comportamento dos seus vizinhos, não podendo, portanto, reclamar das regras deles. 

O problema deste raciocínio é que ele ignora o status moral e legal de quem faz as leis.  Por exemplo, suponha que eu convido você para vir à minha casa.  Quando você chega, eu abro a porta e lhe digo: para ficar aqui em casa, você tem de usar este nariz de palhaço.  Isto certamente vai lhe parecer bastante estranho, mas ainda assim eu posso dizer: "Ei, é a minha casa e estas são minhas regras.  Se quiser entrar, tem de ser assim".  Neste caso, sendo eu o proprietário, você não pode simplesmente dizer: "Olha, eu vou entrar na sua casa, sim, e não vou usar o nariz de palhaço."  Se fizesse isso, você estaria invadindo a minha propriedade e desrespeitando as leis vigentes dentro dela, as quais foram estipuladas antes da sua entrada.  Isso, portanto, é algo que você não tem o direito de fazer.

Agora, imaginemos o cenário contrário.  Suponha que eu vá à sua casa e lhe diga: "Você tem de usar um nariz de palhaço".  Além do espanto total, sua outra provável reação será a de perguntar quando foi que você disse que concordava em ser obrigado a utilizar um nariz de palhaço dentro da sua casa.  Ao que irei responder: "Ora, você se mudou para perto de mim.  E eu uso nariz de palhaço na minha casa.  Portanto, o simples fato de você estar morando perto de mim significa que você, de uma maneira um tanto mística e tácita, consente em também utilizar nariz de palhaço dentro da sua casa, mesmo que você não goste da ideia."

Os estatistas simplesmente pegam este cenário que é evidentemente absurdo em nível local e o expandem para um nível nacional: se você está aqui, então você deu seu consentimento tácito a tudo o que se passa nele.

Mas é realmente assim que as coisas devem funcionar?  Como seria a sua vida se todos lhe atribuíssem "consentimentos implícitos e tácitos"?  Como seria o mundo?  Alguém aceitaria este sistema?

Portanto, quando os estatistas dizem que "ao estar aqui, você automaticamente consentiu com as regras", eles estão fugindo da questão principal.  Eles já estão pressupondo a nossa aceitação daquilo que ainda tem de ser provado.  No exemplo do nariz de palhaço, há uma distinção clara entre o sujeito que diz que você tem de usar o nariz na propriedade dele e o sujeito que diz que você tem de usar o nariz na sua própria casa.  O primeiro sujeito tem o direito de lhe impor o uso do nariz (e, se você não aceitar, tem a liberdade de sair da casa dele); já o segundo não tem este direito.  Tudo depende de quem está legitimamente exercendo sua jurisdição.  Na propriedade dele, ele é soberano.  Na sua propriedade, ele não é.

A mesma regra tem de ser aplicada ao estado.  As pessoas que fazem as leis de um país são as genuínas donas do país?  O país é propriedade delas?  Desde quando?  Elas adquiriram esta suposta propriedade do país de maneira justa?  Houve o consentimento de 100% da população (qualquer porcentagem abaixo desta indica que há indivíduos sendo espoliados)?  Estas são perguntas morais que não podem ser ignoradas, mas que são totalmente desconsideradas pelos estatistas.

E há, por último, o argumento de que nós libertários estamos constantemente utilizando algumas infraestruturas estatais, como estradas, ruas, aeroportos, correios.  Sendo assim, o simples fato de utilizarmos estes bens e serviços significa que estamos consentindo com a existência do estado e com a espoliação de nossa renda para a consecução destes serviços.

Outro problema de raciocínio.  Em primeiro lugar, o fato de eu inevitavelmente utilizar sistemas monopolísticos, dos quais eu simplesmente não tenho como escapar, de modo algum indica consentimento.  Dizer que utilizar as ruas de uma cidade indica consentimento com o estado é o mesmo que dizer que um prisioneiro que come a comida fornecida pela penitenciária está consentindo em estar preso. 

Em segundo lugar, sempre é bom lembrar que libertários, como todos os outros cidadãos, também pagam impostos.  Sendo assim, é nosso dinheiro que foi utilizado para a construção destas infraestruturas estatais.  Logo, não há absolutamente nada de contraditório em utilizá-las.  Aliás, você tem todo o direito de fazer uso delas, mesmo desprezando-as profundamente.

Para finalizar, todo este argumento de 'consentimento implícito' e 'consentimento tácito' não passa de uma patética cortina de fumaça criada para se desviar a atenção daquilo que realmente importa: as minhas palavras.  E as minhas reais palavras (aquilo que realmente penso, e não aquilo que estatistas querem imputar a mim) não são de consentimento, mas sim de discordância e dissenso

Que isso fique bem claro.  As minhas verdadeiras palavras são: Eu não dou meu consentimento.  E estas minhas palavras claramente explicitadas e proferidas não podem ser sobrepujadas por um místico 'consentimento implícito' que magicamente passa a existir em decorrência do simples fato de eu estar em um determinado local.

Resta óbvio que tudo isso não passa de um estratagema ridículo criado por pessoas que simplesmente querem ter poder absoluto, mandar na vida dos outros e escolher vencedores e perdedores.  Uma vez perpetrado o esbulho, elas tentam embasá-lo e justificá-lo recorrendo a truques comportamentais, dizendo que determinadas atitudes minhas significam que eu realmente estou pedindo para ser governado, que eu implicitamente estou suplicando para ser controlado e mandado.

Não, eu não pedi implicitamente por nada disso.  E eu explicitamente digo que "Não, eu não consinto em ser espoliado e controlado".

Thomas Woods

Cearenses possuem maior ascendência genética nórdica

A pesquisa genética pioneira “GPS-DNA Origins Ceará” analisou as amostras de saliva de 160 cearenses, de todas as regiões do Estado e de várias etnias, a fim de mapear os povos que formaram essa população. A pesquisa inédita de mapeamento genético no país revelou que os genes dos nórdicos que habitaram o norte gelado da Europa têm a maior predominância na origem de onde o cearense é descendente. A segunda maior predominância são os ameríndios.

Luís Sérgio Santos, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC – Universidade Federal do Ceará) e coordenador da pesquisa, explica que o resultado foi obtido a partir da metodologia GPS-DNA, criada pelo geneticista israelense-estadunidense Eran Elhaik, consultor no estudo cearense. As amostras de saliva foram cruzadas com um banco de dados em laboratório, nos Estados Unidos, e permitiram a identificação de 28 grandes agrupamentos genéticos, chamados de “bolsões”.

A pesquisa

Um dos objetivos era responder à pergunta-chave dos estudos de Parsifal Barroso no livro “O Cearense”, lançado em 1969. À época, o autor se valeu de documentos e outros registros para construir sua teoria, mas, 50 anos depois, a tecnologia permitiu uma análise mais profunda das hipóteses.

Ao longo de 10 meses, os pesquisadores coletaram 160 amostras incluindo de grupos étnicos, como indígenas e quilombolas, e algumas personalidades em todo o lugar do estado brasileiro.

A ferramenta Geographic Population Structure (GPS) escaneia o DNA e triangula coordenadas geográficas para descobrir onde ele foi forjado e a quais bolsões (agrupamentos) genéticos pertence. O método entende que os bolsões passaram por misturas ao longo da história e tenta combinar a informação genética a um banco de dados de mais de 100 mil assinaturas de DNA.

Segundo o geneticista israelense-estadunidense Eran Elhaik, criador do GPS, o método é preciso e consegue recolocar 83% das populações no mundo de volta a seu país de origem. Luís Sérgio Santos, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenador da pesquisa, explica que os exames das amostras cearenses permitiram a identificação de 28 bolsões.

Os resultados: a predominância do gene nórdico europeu 

“A colonização do Brasil veio da Península Ibérica, mas a pesquisa, de certo modo, desconstrói essa tese. Ela mapeia até o ano 400, então é um tempo muito anterior à fundação de Portugal. Os resultados mostram que o branco europeu que colonizou o Brasil era escandinavo, viking, visigodo, e antes disso, alemão. Por serem predadores, destruidores e impassíveis, eles deram um banho genético na Europa”. – Explica o pesquisador.

As regiões que tiveram mais força na identidade cearense foram o sul da França e a chamada Fenoscândia – que abrange Noruega, Suécia, Finlândia e Dinamarca. Na segunda posição do ranking da maior influência genética, fica o ameríndio, que provém da Sibéria e entra no novo continente por meio do Estreito de Bering, ponte natural entre a Rússia e os Estados Unidos.

Para o médico Evangelista Torquato, especialista em reprodução humana e responsável técnico da pesquisa, o levantamento pioneiro atende a dois pontos. O primeiro, da velha curiosidade sobre a pergunta “de onde eu vim?”. O segundo, do uso prático das informações pela Medicina. “Determinadas comunidades no mundo têm certos tipos de doenças, como judeus e negros. O próprio Nordeste cearense tem doenças genéticas mais específicas que estão na nossa ancestralidade”.

Raízes indígenas e nórdicas: a predominância entre ambas

O pesquisador Luís Sérgio Santos explicou o motivo de que, se o Ceará tem predominância de ancestrais europeus, por que não há tantos cabelos loiros e olhos mais claros. Isso se dá pois o “índio tem uma genética muito forte. Ele ‘dilui’ o branco e cria o pardo. Esse gene ameríndio está em todos nós, em maior ou menor quantidade”, afirmou. Mas também podemos pensar ou acrescentar aí os fatores de adaptação climática, uma vez que o estado do Ceará abrange uma área que vai do semi-árido ao tropical litorâneo.

Ele acrescenta que os dados genéticos só se sustentam se embasados em levantamentos históricos para explicar os fluxos migratórios ao longo dos séculos. Por exemplo: o estudo mostra que, apesar da contribuição histórica na formação do brasileiro, a presença do negro não teve tanta força no Ceará. As maiores influências do tipo são de povos bantos do Congo, na África subsaariana, e de outro povo que habitava a ilha de Madagascar. Ele faz um fluxo interno no continente africano e acaba chegando por meio da escravidão”.

Uma hipótese para a baixa influência do negro no Estado está na própria leitura de Parsifal Barroso. “O Ceará demorou muito a ser colonizado e é envolto por serras, o que o autor acha que retardou o processo de colonização. Além disso, nossa mão de obra era mais indígena. Quem cuidava da pecuária eram os índios, e praticamente não tinha agricultura por causa da seca”, conta Luís Sérgio.

Como salienta o médico Evangelista Torquato, embora a regressão do mapeamento tenha remontado mil anos atrás, pode-se avançar ainda mais. “É totalmente possível fazer um mapeamento do povo brasileiro. Podemos ter outras surpresas”, adianta, salientando que a Região Sul do País tem características bem distintas da amazônica, por exemplo.

Para Igor Queiroz Barroso, presidente do Conselho Administrativo do Grupo Edson Queiroz e neto de Parsifal Barroso, desvendar a origem do cearense por meio da ciência é uma forma de compreender não só o passado, mas o presente. “A origem vem para você poder revelar, se aproximar da verdade. Será que a Caatinga é que forma o cearense? Sou um judeu brasileiro por isso ou por aquilo? Tenho braquicefalia porque venho de determinada raça ou porque durmo na rede? Isso é ciência, trazer respostas através de testes”, diz Barroso.

Para o neto do escritor, além da contribuição científica, a conclusão do estudo é uma realização pessoal, pois expandiu os horizontes já indicados pelo avô. “A pesquisa retorna 40 mil anos antes dos nossos colonizadores. Vai muito além do que Parsifal imaginou que se poderia chegar. Estou trazendo a pesquisa do meu avô um pouco mais próxima da verdade, e me sinto feliz por isso”, disse animado.

Participaram da pesquisa doando amostras pessoas de diferentes origens e localidades como, por exemplo, Maria de Lourdes da Conceição Alves, a “Cacique Pequena”. Liderança dos índios Jenipapo-Kanindé e o ex-governador do Estado, Gonzaga Mota.


Fontes:

Nícolas Paulino e Alessandro Torres. Origem do cearense: nórdicos superam índios e negros na genética. Diário do Nordeste, 27 de Julho de 2020. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/metro/origem-do-cearense-nordicos-superam-indios-e-negros-na-genetica-1.2970540

quarta-feira, 29 de julho de 2020

keynesianismo: mágica ou estelionato?


Para a maioria dos economistas e colunistas de jornais, o que gera crescimento econômico é o aumento da demanda por bens e serviços. A ideia é que aumentos ou reduções na demanda causam aumentos ou reduções na produção de bens e serviços na economia.

Ou seja, o que conduziria a produção seria a demanda.

Outra crença semelhante é que a produção total da economia aumenta de acordo com um múltiplo de um aumento nos gastos do governo, dos consumidores e das empresas.

Eis um exemplo que ilustra, segundo essa teoria, como um aumento nos gastos eleva a produção total por um múltiplo desse aumento dos gastos.

Suponhamos que, de cada unidade monetária recebida ($ 1,00), os indivíduos gastem $ 0,90 e poupem $ 0,10. Adicionalmente, suponhamos que os consumidores tenham aumentado seus gastos em $ 100 milhões.

Como resultado, as receitas dos varejistas aumentam $ 100 milhões. Estes varejistas, por sua vez, em resposta a este aumento em sua renda, consomem 90% destes $ 100 milhões — ou seja, eles aumentam seus gastos com bens e serviços em $ 90 milhões.

Os recebedores destes $ 90 milhões, por sua vez, gastam 90% destes $ 90 milhões, ou seja, $ 81 milhões. Já os recebedores destes $ 81 milhões gastam 90% desta soma, ou seja, $ 72,9 milhões, e assim por diante.

Observe que, por este raciocínio, os gastos de uma pessoa se tornam a renda de outra pessoa.

A cada etapa da cadeia de gastos, as pessoas gastam 90% da renda adicional que recebem. Este processo irá terminar — sempre de acordo com a teoria — com uma produção total $ 1 bilhão (10 x $ 100 milhões) maior do que era antes de os consumidores terem decidido aumentar seus gastos em $ 100 milhões.

Note que, quanto maior a porcentagem gasta dessa renda adicional, maior será o multiplicador. Consequentemente, maior será o impacto do gasto inicial na produção total.

Por exemplo, se as pessoas mudarem seus hábitos e gastarem 95% de cada unidade monetária recebida, o multiplicador será 20. Inversamente, se elas decidirem gastar somente 80% e poupar 20%, o multiplicador passará a ser 5.

Tudo isso significa que, quanto menos for poupado, maior será o impacto na produção total.

Por essa lógica, não é nenhuma surpresa que a maioria dos economistas de hoje seja seguidora da ideia de que, por meio de estímulos fiscais e monetários, é possível impedir que uma economia entre em recessão. Igualmente, por meio destes mesmos estímulos, seria possível tirar a economia de uma recessão.

O popularizador do poder mágico do multiplicador, John Maynard Keynes, escreveu:

Se o Tesouro se dispusesse a encher garrafas com papel-moeda, as enterrasse a uma profundidade conveniente em minas de carvão abandonadas que logo fossem cobertas com o lixo da cidade e deixasse à iniciativa privada, de acordo com os bem experimentados princípios do laissez-faire, a tarefa de desenterrar novamente as notas (naturalmente obtendo o direito de fazê-lo por meio de concessões sobre o terreno onde estão enterradas as notas), o desemprego poderia desaparecer e, com a ajuda das repercussões, é provável que a renda real da comunidade, bem como a sua riqueza em capital, se tornassem sensivelmente mais altas do que são.

O multiplicador é verdadeiro?

Será que poupar mais seria ruim para a economia, como indica o modelo do multiplicador?

Peguemos o exemplo de um agricultor que produziu 20 tomates. Ele consome 5 tomates para seu sustento. Sobram à sua disposição 15 tomates poupados (esta é sua poupança real). Com esses 15 tomates poupados, o agricultor pode adquirir outros bens. Ele pode, por exemplo, obter pão na padaria local, pegando 5 tomates pelo pão. Ele também compra um par de sapatos na sapataria local, pagando 10 tomates pelos sapatos.

Observe que a poupança real à sua disposição limita a quantidade de bens de consumo que o agricultor pode adquirir. Seu poder de compra é restringido pela quantidade de tomates que ele poupou, isto é, por sua poupança real.

Quando este agricultor efetiva sua demanda por pão e por sapatos, ele está transferindo cinco tomates para o padeiro e dez tomates para o sapateiro. Assim, os tomates que o agricultor poupou não apenas sustentam, como ainda aumentam o bem-estar e o padrão de vida do padeiro e do sapateiro.

Igualmente, o pão e o par de sapatos que o padeiro e o sapateiro respectivamente pouparam sustentam a vida e aumentam o bem-estar do agricultor.

Perceba que são os bens de consumo poupados — os quais sustentam o padeiro, o agricultor e o sapateiro — que possibilitam que todo o fluxo de produção se mantenha.

Suponha agora que estes produtores e proprietários de bens de consumo, em vez de trocá-los por outros bens de consumo, decidam trocá-los por melhores ferramentas e maquinários. Com máquinas e ferramentas melhores, eles podem produzir bens de consumo em maior quantidade e com maior qualidade no futuro.

Ao trocarem uma fatia de seus bens poupados por ferramentas e maquinários, os proprietários dos bens de consumo estão, na prática, transferindo sua poupança real para aqueles indivíduos especializados em fabricar estas máquinas e ferramentas. Ou seja, uma poupança real está sustentando estes indivíduos enquanto eles estão ocupados fabricando essas máquinas e ferramentas.

E, tão logo máquinas e ferramentas são construídas, isso permite um aumento na produção geral de bens de consumo. Esta maior oferta de bens de consumo (por causa do aumento da produção) permite uma maior poupança, tudo o mais constante. E essa maior poupança, por sua vez, permite um maior aumento na produção de máquinas e ferramentas.

Mais máquinas e ferramentas permitem aumentar a produção de bens de consumo, o que aumenta o poder de compra das pessoas na economia.

Logo, contrariamente ao pensamento popular, mais poupança na realidade expande o fluxo de produção de bens de consumo.

Pode um aumento na demanda por bens de consumo levar a um aumento na produção total por um múltiplo do aumento inicial da demanda? Não. O aumento na demanda por bens e serviços está restringido pelo aumento na poupança real.

Para poder saciar um aumento na sua demanda por bens, o padeiro tem de ter os meios de pagamento — ou seja, pão — para pagar pelos bens e serviços que ele deseja. Vimos que o padeiro adquire cinco tomates em troca de uma unidade de pão. Ou seja, ele paga pelos tomates com seu pão. Igualmente, o sapateiro sacia sua demanda por dez tomates pagando com um par de sapatos. O agricultor sacia sua demanda por pão e sapatos utilizando seus quinze tomates poupados.

Assim que a oferta de bens de consumo aumenta, isso permite um aumento na demanda por bens gerais, tudo o mais constante. O aumento na produção de pães pelo padeiro permite que ele aumente sua demanda por outros bens. Neste sentido, o aumento na produção de bens gera um aumento na demanda por outros bens. Os indivíduos produzem com o objetivo de poderem demandar bens que irão lhes sustentar e melhorar seu padrão de vida.

Pessoas vendendo mais bens de consumo poderão agora demandar mais bens gerais. Logo, é o aumento na produção de bens o que aumenta a demanda por bens. E isso só ocorreu porque a oferta aumentou a um nível maior que o da subsistência.

Em suma: o que permite o aumento na oferta de bens de consumo é o aumento na quantidade de bens de capital, ou seja, nas máquinas e ferramentas. E, por sua vez, o que permite o aumento na produção de máquinas e ferramentas é a poupança real. Podemos, assim, inferir que o aumento no consumo tem de ocorrer em linha com o aumento na produção.

Disso também podemos deduzir que o consumo, por definição, não pode fazer com que a produção aumente em um múltiplo deste aumento no consumo. O aumento na produção se dá de acordo com o que a infraestrutura existente permite, e não é restringido pela demanda dos consumidores.

Introdução do dinheiro

Obviamente, a introdução do dinheiro nesta economia não altera absolutamente nada a realidade. O dinheiro é apenas um meio de troca que ajuda a facilitar as transações entre produtores e consumidores — por si só, o dinheiro não tem como gerar nenhum objeto real.

O dinheiro não é um meio de produção; ele não produz nem bens de consumo e nem bens de capital. Sua introdução não permite uma maior produção de sapatos, tomates e pães. O dinheiro é simplesmente um meio de troca que facilita as transações.

Em última instância, bens e serviços não são adquiridos com dinheiro, mas sim com outros bens e serviços. As pessoas produzem bens e serviços em troca de dinheiro, e então utilizam esse dinheiro para adquirir outros bens e serviços. O objetivo da produção de bens e serviços é o consumo de outros bens e serviços. O dinheiro apenas irá facilitar as transações.

No final, o dinheiro é apenas o meio de troca utilizado por todos; seu papel é apenas intermediário. Por si só, ele não tem como gerar mais produção. Sim, as pessoas trabalham e produzem para ganhar dinheiro, mas elas querem esse dinheiro porque ele as permitirá adquirir outros bens e serviços. O que o indivíduo realmente quer em troca dos bens e serviços que ele vende (o que inclui sua mão-de-obra) são outros bens e serviços.

Entretanto, vale ressaltar: embora seja apenas um meio de troca, manipulações na quantidade existente deste meio de troca têm o poder de afetar negativamente toda a economia, pois geram severas más alocações de recursos escassos e, consequentemente, os ciclos econômicos. De novo: alterar a quantidade de dinheiro na economia não tem como aumentar a produção, mas irá gerar alocações errôneas de recursos escassos, degenerando em ciclos econômicos.

Aumento na demanda do governo e o crescimento econômico

Examinemos agora o efeito de um aumento na demanda, causado pelo governo, sobre a produção total de uma economia.

Nesta economia até então formada por um padeiro, um sapateiro e um agricultor, um quarto indivíduo entra em cena. Este indivíduo detém o monopólio da coerção, e pode exercer sua demanda por bens por meio da força. Ou seja, ele é o governo.

Pode a demanda desse indivíduo — o governo — gerar maior produção, como imagina a sabedoria popular? Muito pelo contrário: irá apenas empobrecer os produtores. O padeiro, o sapateiro e o agricultor serão forçados a abrir mão de seus produtos em troca de nada, e isso por sua vez irá enfraquecer o fluxo de produção dos bens de consumo.

Se você considerar que o governo só poderá gastar aquilo que ele antes confiscou destes três produtores, seria simplesmente ilógico dizer que sua entrada nesta economia tem o poder de "estimular a produção e fazer a economia crescer".

Não apenas um aumento nos gastos do governo não tem como aumentar a produção em um múltiplo positivo, como, ao contrário, inevitavelmente levará ao enfraquecimento de todo o processo de geração de riqueza.

Como Mises explicou:

É sempre necessário enfatizar este truísmo: o governo só pode gastar ou investir aquilo que ele toma de seus cidadãos [via impostos ou empréstimos]. E seus gastos e investimentos adicionais restringem, na mesma quantidade, a capacidade destes cidadãos de gastar ou investir.

Para aumentar seus gastos, há três medidas que o governo pode tomar: aumentar impostos (ou seja, aumentar o confisco da produção do padeiro, do sapateiro e do agricultor); pegar recursos emprestados (do padeiro, do sapateiro e do agricultor); ou imprimir dinheiro.

Não é preciso ser um profundo conhecedor de economia para entender que nenhuma dessas três medidas cria riqueza.

1) Se o aumento dos gastos do governo advier de mais impostos, então a produção de riqueza está sendo confiscada em troca de nada.

2) Se o aumento dos gastos advier do endividamento do governo (com o governo pegando recursos emprestado dos produtores), então igualmente haverá menos recursos para ser transacionados voluntariamente nesta economia entre os produtores. O excedente produzido (poupança real) está sendo desviado para o governo e não para sustentar as atividades produtivas dos outros produtores.

3) Se o aumento dos gastos advier da simples criação de dinheiro pelo próprio governo, os preços dos bens e serviços subirão, pois a criação de mais dinheiro não tem como gerar mais bens.

Nenhuma dessas três medidas cria riqueza. Consequentemente, nenhuma dessas três medidas pode estimular uma economia, tampouco tirá-la de uma recessão.

O raciocínio é tautológico: para o governo gastar, ele tem antes de tomar de alguém (seja via impostos, seja via endividamento) ou imprimir dinheiro. Se ele tomou de alguém, esse alguém está agora impossibilidade de consumir ou de investir. Se ele imprimiu dinheiro, nada foi criado.

Assim, os gastos do governo não podem ser vistos como uma força criativa. Todo o gasto do governo ocorre à custa dos outros indivíduos da sociedade. Por definição.

O mundo real funciona ao contrário do que Keynes explicou

Em nossa economia hipotética, 500 unidades de pães, sapatos e tomates são produzidas em um dado período de tempo. Dessas 500 unidades, 250 unidades (ou seja, 50%) são destinadas ao consumo do setor privado, 100 unidades (ou seja, 20%) são destinadas ao investimento e 150 unidades (30%) são destinadas ao governo.

Se, devido a um crescimento econômico ocorrido em um dado período, a produção aumentar em 10%, então a economia terá agora 550 unidades. Assim, caso a economia mantenha a mesma proporção do destino do produto de antes (50% para consumo; 30% para o governo e 20% para investimentos), o resultado agora será: 275 unidades destinadas ao consumo, 110 são destinadas ao investimento, e 165 destinadas ao governo.

Ou seja, ao contrário do que Keynes afirmou, a verdade é que apenas se houver um aumento na produção, poderá haver um aumento no consumo privado e nos gastos do governo.

Mais ainda: o tal "efeito multiplicador", na prática, funciona ao contrário do que Keynes previu. Havendo um aumento da produção, o aumento em todos os outros gastos será menor do que esse aumento da produção. E é assim simplesmente porque a propensão a consumir não pode ser maior do que a produção. Lógica pura.

Conclusão

O fato de que a demanda depende da produção é uma realidade que não pode ser abolida por meio de gastos governamentais ou de aumento da quantidade de dinheiro na economia. Aumentar os gastos do governo ou a quantidade de dinheiro na economia não pode alterar esta realidade.

A teoria de Keynes não só está errada, como a realidade é completamente oposta a ela.


Frank Shostak