Agora, coloquemos o estado neste cenário para vermos
como ele afeta a atividade do capitalista.
O estado é convencionalmente definido como uma
instituição que possui o monopólio da jurisdição de seu território, sendo o
tomador supremo de decisões judiciais para todos os casos de conflito,
inclusive conflitos
envolvendo o estado e seus próprios funcionários. Adicionalmente, e em
consequência desta característica, o estado possui também o direito de
tributar, isto é, de determinar de maneira unilateral o preço que seus súditos
têm de lhe pagar para que ele efetue essa tarefa de tomar decisões supremas.
Tendo o monopólio da jurisdição e o poder de
tributar — sendo que ambos esses poderes lhe conferem um terceiro poder, que é
o poder de legislar, regular, controlar e restringir —, o estado adquire a
singular condição de poder escolher quem irá e quem
não irá prosperar.
Agir sob estas restrições — ou melhor, sob esta
falta de restrições — é o que constitui a política e as ações
políticas. Consequentemente, já deveria estar claro desde o início que a
política, por sua própria natureza, sempre significará transgressões, fraudes e
delitos.
Mais especificamente, podemos fazer a priori uma previsão sobre quais as
consequências que a imposição de um estado terá sobre a conduta dos
empreendedores.
Na ausência de um estado, são os consumidores quem
determinam o que será produzido, com que qualidade e em qual quantidade, bem
como quais empreendedores irão prosperar e quais irão à falência. Com a
intervenção do estado, a situação enfrentada pelos empreendedores torna-se
inteiramente diferente.
Agora passa a ser o estado e seus funcionários, e
não os consumidores, quem em última instância irá decidir quem irá prosperar
e quem irá falir.
Dado que o estado vive repleto de dinheiro de
impostos, de dinheiro adquirido via endividamento (dívida esta que será paga
por toda a sociedade via impostos) e de dinheiro criado por
seu próprio Banco Central, ele pode gastar em maior volume do que qualquer
outra entidade. Consequentemente, o estado pode sustentar qualquer empreendedor
concedendo-lhe subsídios, empréstimos a juros baixos
ou fornecendo contratos
exclusivos para obras públicas. Ele pode também socorrer qualquer
empreendedor que esteja passando por dificuldades (porque os consumidores não
mais querem seus produtos).
Por outro lado, o estado também pode arruinar
qualquer empreendedor ao simplesmente decidir investigar suas operações e
encontrar alguma violação (sempre haverá uma,
inevitavelmente) de leis e regulamentações estatais. Ou mesmo qualquer
deslize tributário.
Sendo o monopolista da violência, o estado (seus
membros) pode achacar e extorquir aqueles empresários de quem ele não gosta, os
quais não poderão simplesmente se negar a pagar o achaque, pois sabem que, se o
fizerem, sua empresa
poderá ser prejudicada das mais diversas formas. [N. do E.: no Brasil, quem
trabalha na construção civil sabe que em algum momento um fiscal do governo
surgirá pedindo um "agrado"].
Ademais, o estado pode ele próprio utilizar o
dinheiro que extrai da população para tentar se tornar um
empreendedor. E dado que ele não precisa se preocupar
em ter lucros e evitar prejuízos — pois ele sempre poderá suplementar suas
receitas por meio de impostos, endividamento ou criação própria de dinheiro —,
ele sempre poderá sobrepujar qualquer produtor privado que esteja produzindo
bens ou serviços similares.
Finalmente, em decorrência de seu poder de legislar,
de criar leis e de alterar regras, o estado pode conceder privilégios exclusivos
para algumas empresas específicas, isolando-as ou protegendo-as da
concorrência, seja por meio de tarifas protecionistas, de barreiras
alfandegárias ou mesmo por uma simples e direta reserva de mercado. Ele também
pode expropriar parcialmente — e criar uma série de empecilhos sobre — outras
empresas.
Nesse ambiente, torna-se imperativo que todos os
empreendedores prestem total e constante atenção ao mundo político. Para permanecer vivo e possivelmente
prosperar, um empreendedor terá agora de dedicar muito tempo e esforço a
tarefas que nada têm a ver com a satisfação de seus clientes, mas sim com a
satisfação do poder político.
E, desta forma, baseando-se em sua compreensão
acerca da natureza do estado e da política, ele terá de fazer uma escolha: uma
escolha moral.
Ele pode escolher se juntar ao estado e se tornar
parte desta vasta
organização criminosa.
Ele pode subornar políticos, partidos políticos ou
funcionários públicos, seja
com dinheiro ou com promessas tangíveis (algum emprego futuro no setor
"privado" como "membro do conselho administrativo" ou como
"conselheiro" ou "consultor"), com o objetivo de obter para
si próprio algumas vantagens econômicas em detrimento das outras empresas
concorrentes.
Ele pode pagar propinas para
assegurar contratos (de obras públicas ou de fornecimento de material para
empresas estatais) ou garantir subsídios para ele próprio em detrimento dos
outros concorrentes. Ou ele também pode pagar propinas para conseguir
a aprovação ou a
manutenção de legislações que assegurem a ele e à sua empresa
privilégios legais e lucros monopolistas — ao mesmo tempo em que parcialmente
expropria e oprime seus concorrentes.
Desnecessário dizer que vários empresários optaram
por este caminho. Em específico, grandes bancos, grandes indústrias, mineradoras e
empreiteiras se tornaram desta maneira intricadamente envolvidos com o estado,
e vários empresários hoje bilionários construíram suas fortunas muito mais em
decorrência de suas habilidades
políticas do que em decorrência de suas habilidades como empreendedores
preocupados em bem servir aos consumidores.
A escolha
Mas há a outra escolha: um empreendedor pode optar
pelo caminho honroso — e ao mesmo tempo muito mais difícil.
Este empreendedor está a par da natureza do
estado. Ele sabe que o estado e seus funcionários estão ali apenas para
intimidá-lo, chantageá-lo e extorqui-lo, para confiscar sua propriedade e seu
dinheiro. Pior: ele sabe que eles são hipócritas arrogantes e presunçosos,
que afetam superioridade moral e se acham acima de todo o bem e todo o
mal.
Sabendo disso, essa espécie bastante rara de
empreendedor terá então de se esforçar e tentar fazer o seu melhor para sempre
se antecipar e se ajustar a toda e qualquer manobra maléfica do
estado. Ele não irá se juntar à gangue. Ele não pagará propinas para
assegurar contratos ou privilégios do estado.
Ao contrário, ele estará sempre tentando, na medida
do possível, defender o que quer que tenha restado de sua propriedade e de seus
direitos de propriedade, e tentará ainda obter o máximo de lucro possível
operando nesta situação estressante.
Ou seja, é só para verdadeiros heróis.
Hans-Hermann Hoppe
Hans-Hermann Hoppe
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