" No
torvelinho da evolução contemporânea, raros são os valores que permanecem
seguros. Todavia, os objetivos da Revolução Industrial não implicavam, a
priori, qualquer transtorno. Não se tratava, como ainda não se trata,
senão de fazer melhor o que a humanidade sempre fez, sempre teve necessidade de
fazer e sempre conseguiu fazê-lo muito mal. Não se tratava, como ainda não se
trata, senão de melhor alimentar os que têm fome, de melhor vestir as pessoas,
dar-lhes mais conforto, de diminuir seus sofrimentos e suas enfermidades, de
prolongar a sua expectativa de vida... Esses objetivos foram atingidos nos
países mais adiantados, estão para ser atingidos no Brasil, e devem sê-lo em
todos os países do mundo, por pouco claramente identificados que estejam os
métodos a seguir e os esforços que para isto são necessários."
Jean
Fourastié
Assim
iniciado, esclareça-se que a tônica do presente trabalho se pauta na constante
e contínua preocupação de todo ser humano em deter e usufruir um mínimo de
direitos que viabilizem a preservação da sua própria sobrevivência,
individualmente considerado, bem como que o seja com um mínimo de dignidade,
que, no entanto, são aspirações que imprescindem tanto da capacidade individual
de cada um em interagir com outros seres humanos, quanto da de uma eficiente
produção corporativa, com as quais cada um deve contribuir, dentro dos próprios
limites e forças, para o fortalecimento e a mantença do próprio grupo social.
Ocorre
que, para que cada um desses seres, que se pretendem humanos([1])
e que compõem um grupo social, vejam os seus próprios interesses particulares
concretizados, precisam compartilhar conhecimentos tais que contribuam - muita
das vezes até prioritariamente - para a viabilização, realização e satisfação
dos de índoles públicos, pois que, tal como prelecionado pelo professor Menelick de Carvalho Netto,
o grau de sucesso de determinado empreendimento exige que os seus
empreendedores incorporem, no projeto a ser executado, todo e qualquer risco
que possa inviabilizar ou transtornar o sucesso do pretendido resultado final,
de sorte que, detectando-se previamente esses potenciais riscos e os
incorporando ao próprio projeto a ser desenvolvido, se pode, de forma igualmente
prévia, planejar os possíveis antídotos, para que se viabilize o controle dos
possíveis efeitos danosos que possam ser ocasionados.
Logo,
todo homem que pretenda haurir maiores e melhores condições à própria vida, não
pode olvidar que deve auxiliar a viabilizar essa mesma melhoria à dos demais,
sob pena de ver assacada e destruída aquelas que egoisticamente tenha criado
tão somente para si mesmo.
Portanto,
as realizações dos interesses privados não prescindem das satisfações dos valores
fundamentais de todo homem, porque são eles (valores fundamentais) as
condições fáticas prementes à vida de todos o que, portanto, que lhes confere
natureza pública.
Logo,
o ser humano há que, primeiro, atentar, primeiramente, às satisfações dos direitos
sociais que, segundo Norberto Bobbio, são PODERES (oponíveis
e exercitáveis a e para todos), porque, somente depois de respeitados,
cumpridos, conseguir-se-á uma legítima satisfação dos direitos de naturezas
privadas.
Considerando-se
que essa é uma circunstância real de cabal importância para o entendimento
desse trabalho, antes de prosseguirmos, impõem-se esclarecer e destacar qual o
efetivo conteúdo da expressão "interesses
públicos", à medida em que, muito pelo contrário ao sentido com o qual
vem sendo empregado, não se confundem com interesses estatais, posto que esses
últimos são estritamente anímicos e não refletem nem convergem com os do povo
que congrega.
Se
público fosse sinônimo de estatal, a primazia de interesses desta
natureza interessaria única e exclusivamente ao Estado que os representasse, o
que seria uma indubitável, verdadeira e indevida teratologia, à medida em que o
Estado não se justifica por si mesmo, posto que existe para o cumprimento da
função social para a qual é criado: manter
a integridade da entidade corporativa que congrega, frente a eventuais riscos à
própria unidade nacional, e não concorrer com ela própria, que seria a
circunstância fática que autorizaria a existência de interesses estatais, dado
esse desvirtuamento da sua própria existência (Estado).
Assim
sendo, urge restar clara e definitivamente entendido que inexistem direitos
subjetivos estatais próprios que devam ser adimplidos, prioritariamente ou não,
em detrimento aos de natureza privada, pois que a segurança da unidade de um
povo depende da satisfação da sua, POVO, vontade soberana enquanto força motriz
ao seu próprio avanço, e não da vontade daquele que o representa, pois que,
somente pelo fortalecimento das partes - o privado - é se terá a solidez do
todo - o público.
Ocorre
que, para que se alcance esse resultado ante aludido, mister a adoção de
organização, método, estratégia e planejamento tais que viabilizem um real
estado de Segurança Nacional([2]),
que exige, por sua vez, o reconhecimento e o respeito dos interesses privados,
mediante o prévio reconhecimento e garantia dos de naturezas públicos, que são
todos aqueles que, não sendo prescindíveis a todo ser humano devem, por isso
mesmo, ser acessíveis a todos, porquanto concernentes à própria unidade social,
podendo-se resumí-los em dois, por serem as bases dos demais: liberdade
e igualdade.
Mister
sublinhar neste ponto que, IGUALDADE significa tão somente o direito/dever de
se ser submetido ao mesmo cenário normativo, a partir dos e segundo os juízos
hipotéticos das normas jurídicas. Igualdade não significa identidade entre
as pessoas enquanto pessoas porque tal pretensão é
absolutamente impossível à medida que cada ser humano é um “universo único”.
Logo, como tal, cada ser humano detém necessidades e capacidades diferentes
entre si, sendo indubitável utopia gizar-se isonomia entre seres.
Portanto,
tenha-se em mente que a garantia à IGUALDADE tem por cerne e escopo tão somente
impor o mesmo conteúdo normativo a todos, sem distinções. SÓ ISSO.
Assim
sendo, os requisitos administrativos estatais acima mencionados (organização,
método, estratégia e planejamento) são indiscutivelmente básicos à
administração dos interesses que são essenciais à preservação da sociedade como
um todo, pois que somente a partir da adoção desses critérios administrativos é
que se poderá detectar, sob um enfoque o mais correto possível, quais os
interesses que devem ser atendidos com prioridade máxima e constante, que não
podem ser e, não são, outros que não os de índoles públicos, cujas precedências
são essencialmente prementes à viabilização daqueles que podem ser e são
adquiridos por si e para si mesmo - os individuais - razão pela qual faz-se
imperioso conhecer, reconhecer e firmar a legitimação([3])
da estrutura de um Poder Nacional([4])
tal, que impeça a cisão do grupo social tanto quanto o seu enfraquecimento como
unidade nacional, que constante e periodicamente vem sendo pretendida por
outras nações que são tidas por mais "fortes" e assim efetivamente o
são porque foram originariamente constituídas sob essa consciência de que
somente pela satisfação dos interesses nacionais é possível a realização dos
individuais.
Conseqüentemente,
para que a sociedade brasileira se imponha no cenário internacional como Nação
efetiva e realmente independente, mister que ao povo sejam dadas condições de
saber eleger os seus representantes, que precisam ser pessoas que realmente
detenham indiscutíveis capacidades naturalmente próprias e conhecimentos
culturais e científicos tais que nos levem a interagir com as demais soberanias
internacionais, sem que essas interações nos levem a submissões indevidas a
interesses alienígenas, que comprometem as satisfações dos reais interesses
privados do povo brasileiro, assim considerados como aqueles que compõem o
todo, que é a nação, que é o Estado, que é o Brasil.
Porém,
enquanto a educação brasileira não atinge esse estágio de conhecimento
generalizado, a parcela de cidadãos -
mesmo que seja uma minoria -, que detém suficientes capacidades
intelectuais e culturas gerais - e que
vem detectando e reconhecendo os saques e as violações que mãos invisíveis têm
cometido contra os direitos e valores fundamentais dos homens brasileiros -
deve manter o aprimoramento do seu próprio conhecimento de sorte a inverter, de
uma vez por todas, a precariedade da vida que se tem experenciado nas últimas
décadas, e impor, pela prática, de forma contundente e irreversível, que somente pela
segurança do indivíduo ter-se-á a
segurança da coletividade.
Mas
como esse grupo de indivíduos poderá impor essa prática sem que detenham pelo
menos parte do Poder Nacional que garanta, pela legitimidade nacional, a
legalidade dessa conduta ?
A
resposta é realmente simples: considerando-se que a educação é fator primordial
à acessibilidade de cada um aos direitos fundamentais à liberdade e à
igualdade, até que a maioria da nação brasileira adquira conhecimento e cultura
suficientes que lhes preserve a unidade, que lhes direcionem ao crescimento
sócio-econômico de forma realmente sólida e independente, que lhes
conscientizem que a premência dos estabelecimentos de relações intersubjetivas([5])
está intimamente atrelada aos cumprimentos espontâneos
dos direitos, deveres e obrigações que lhe são inatos (das relações
intersubjetivas que forem celebradas ao longo do tempo), considerando-se que
qualquer sociedade necessita ser protegida dos abusos que contra ela são
cometidos, de sorte a preservar a sua unidade, tal como acontece em qualquer
parte deste planeta, será pela atuação do Poder Judiciário que garantir-se-á,
em um primeiro momento, o respeito a esses dois direitos fundamentais acima já
aludidos: a igualdade e a liberdade.
Considerando-se
que a economia (que é a ferramenta essencial aos exercícios dos direitos de
igualdade e liberdade às aquisições dos bens da vida que cada um entende devam
ser adquiridos às satisfações das suas necessidades) não prescinde do Direito e
a política é a base desse mesmo Direito, a Politização
da Justiça é o fenômeno que viabilizará a inserção do Brasil no
mercado globalizado; mas não tão somente no que diz respeito ao seu efeito, que
indiscutivelmente tem cunho econômico, antes sim e principalmente, no que
pertine a sua origem, conteúdo e fundamento: disseminação de conhecimento e
cultura.
Logo,
esse fenômeno da Politização da Justiça, exercido pelo Judiciário - que é a
parcela do Poder Nacional cuja função institucional é a mantença da segurança
nacional mediante a imposição coercitiva do cumprimento das leis vigentes -
deverá explicitar à sociedade, o mais claramente possível, a relação inversa
que existe entre LIBERDADE e IGUALDADE, seja por uma detida
análise em torno das medidas executivas e legislativas que sejam adotadas pelos
outros dois Poderes Nacionais, e seu cotejo com essas duas garantias
fundamentais à sobrevivência do brasileiro e estrangeiros que residam no
Brasil, seja pela fixação de normas de conduta no âmbito laboral, desde o seja
para a garantia de uma real observância e cumprimento de um dentre esses mesmos
e exatos direitos fundamentais (igualdade e liberdade).
Porém,
atente-se para o fato de que, não obstante a legislação nacional prever e
viabilizar tanto um quanto outro desses sistemas de intervenções jurisdicionais
na seara política nacional, que em princípio pertiniriam aos exercícios das
funções executiva e legislativa, essa Judicialização da Política não autoriza o
Poder Judiciário a se imiscuir no âmago estritamente político da situação
concreta que lhe for submetida ao crivo.
No
exercício dessa possibilidade legal, o Judiciário, necessária e
impostergavelmente, só poderá atuar, só estará autorizado e legitimado a assim
intervir, se e quando o for para restabelecer os direitos e garantias
fundamentais do homem, que eventualmente venham a ser, ou tenham sido afetados
por determinada medida política e/ou político-econômica, firmadas pelos Poderes
Executivo ou Legislativo.
Dito
isso, no que nos interessa mais de perto, o Poder Normativo da Justiça do
Trabalho - que significa a edição de uma decisão jurisdicional cujo conteúdo é
inteira e eminentemente de caráter jurídico, concernentes a condições de
trabalho - não poderá se imiscuir na seara exclusivamente político-econômica da
realidade submetida ao seu crivo hermenêutico sob pena de não só usurpar função
constitucional que não lhe compete - que deve ser exercida ou pelo legislativo ou
pelo executivo - mas também, e por pior, comprometer as seguranças tanto da
economia nacional quanto ao direito à vida dos próprios trabalhadores, à medida
em que poderá desestabilizar as próprias relações laborais.
Portanto,
pelo exercício do Poder Normativo, será a Justiça do Trabalho que poderá
diminuir a decalagem atualmente existente entre o fenômeno da globalização e as
ofertas do mercado de trabalho, posto que, analisando as situações concretas
que lhe forem apresentadas pelos interessados, em cotejo com os valores
fundamentais do homem, ínsitos na Declaração de Direitos Humanos - que foram
inclusive transpostos para a nossa Constituição Federal e, por isso mesmo
exigem a respectiva tutela do Judiciário - poderá, à despeito da vontade do
Estado, estabelecer o indispensável equilíbrio que deve existir entre os
direitos à LIBERDADE e IGUALDADE tanto dos empregados quanto dos empregadores,
daí a sua relevância como fórmula que potencialmente viabilizará o
estabelecimento e a fixação do equilíbrio entre a GLOBALIZAÇÃO e os MERCADOS DE
TRABALHO, mas desde que, repita-se, esse Poder Normativo seja exercido a partir
da preocupação, única e exclusiva, ao criar novas condições de trabalho, o faça
em cotejo com as garantias fundamentais dos direitos dos homens, de sorte a
fortalecer os direitos públicos, posto que, por serem estreitamente vinculados
às relações de trabalho, a economia nacional só será incrementada se respeitado
for o direito de acessibilidade de todos ao mínimo necessário à mantença da
dignidade de cada um.
[1] " ... a miséria revela-nos uma existência e
um tempo, fundamentais, que a história jamais ensinou. Mais que pobres e
indigentes, os miseráveis correm o risco de ver destruída, neles e ao seu
redor, por esta terrível agressão, a própria humanidade. Só se tornaria um
homem aquele que enfrentasse o risco da destruição, nele próprio, da humanidade
? Sim, e tão essencialmente humano que neste livro é chamado de Arcanjo: arqué significa, de fato, o princípio e
o início. Nascidos da miséria, a ela voltaremos, todos." ( SERRES, Michel, in, "A lenda dos Anjos",
Editora Aleph, SP, 1995, páginas 17)
[2] " Segurança é uma
necessidade e um direito inalienável.
O entendimento do que seja Segurança,
embora apresente as variações naturais das diversas formas pelas quais pode ser
encarada, permite discernir, em seus conceitos, uma noção de garantia, proteção
ou tranqüilidade em face de ameaças ou ações adversas à pessoa humana, às
instituições ou a bens essenciais, existentes ou pretendidos. Trata-se, neste
caso, do aspecto subjetivo da Segurança, que se acha interligado às medidas
tomadas para essa proteção, as quais constituem o aspecto objetivo da
Segurança. Ambos os aspectos se completam e haverá tanto mais sensação de
garantia quanto maiores e mais eficazes forem as medidas efetivas de
Segurança.” (Doutrina,
Escola Superior de Guerra, 1989, RJ)
[3] Que é
qualidade daquilo que é real, que não é falso, que é efetivo e verdadeiro, que
para o enfoque por ora abordado converge com o imperioso e verdadeiro reconhecimento
e aceitação da própria população.
[4] Que deve
ser o somatório de um certo número de vontades individuais que se identificam
entre si e que buscam determinados resultados e que, por depender da capacidade
e dos meios instrumentais utilizados para essa realização volitiva coletiva,
imprescinde de uma prévia identificação e eleição NATURAL daquele(s) que reúne
e detém os melhores conhecimentos e capacitação para, utilizando os meios
instrumentais existentes, representar essa vontade coletiva. Logo, a
legitimidade dos representantes nacionais é circunstância fática imprescindível
à uma escorreita, real e efetiva estruturação e execução desse Poder Nacional,
mormente porque Poder é um fenômeno e não um estado e/ou situação fictícia.
[5] Émile
Durkain,
destacou a imperatividade do incremento das relações interdisciplinares entre
os homens, que denominou "solidariedade orgânica", o que equivale
dizer, a complexidade diuturna da vida exige que cada um se especialize em
determinado ramo científico, mas necessariamente interaja com os demais
especialistas para que viabilizado seja um desenvolvimento científico
generalizado.
Dra. Regilene Santos do Nascimento
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