Apenas observe o cenário ao seu redor: há uma lista,
em contínua expansão, de coisas a que as pessoas afirmam ter o
"direito" de receber "gratuitamente". Vai desde saúde,
educação e transporte até estabilidade no emprego, aposentadorias
nababescas, lazer, cultura e cirurgias de mudança de sexo.
No entanto, quando se considera o assunto
seriamente, simplesmente não há nenhuma base lógica e racional para tais
demandas. Há apenas desejos e vontades, em ampla escala, por bens e serviços —
algo que supostamente implica a necessidade de que eles se tornem um direito.
A partir daí, é apenas um passo para que grupos de
interesse façam pressão e lobby sobre o governo, e recorram a tentativas
legislativas ou judiciais para criar tais direitos — os quais serão, em
seguida, promovidos como melhorias sociais.
Mas isso apenas leva a novas perguntas.
Pode um desejo automaticamente virar um direito? Um
direito é a mesma coisa que um desejo? Por quê? Por que não?
Se eu sofri uma falência renal e preciso de um rim,
teria eu o direito de pegar o seu? Se preciso urgentemente de um tratamento
médico, posso obrigar outra pessoa a custeá-lo? Posso obrigar um médico a me
tratar gratuitamente? Qual a diferença entre estes dois cenários?
Seria um direito algo que pode (ou deve) ser
concedido (ou negado) pelo voto da maioria?
Em sua opinião, a Constituição, uma Medida
Provisória ou uma lei do Congresso criam
direitos, ou será que tais instrumentos simplesmente reconhecem direitos que as pessoas inerentemente possuem pelo fato
de serem humanas?
Se você fizer estas mesmas perguntas ao cidadão
comum, esteja certo de que irá ouvir uma pletora de respostas diferentes e
conflitantes.
Este breve ensaio não irá fornecer respostas
detalhadas para todas as perguntas. Tampouco irá fazer todas as perguntas
relevantes. Seu propósito é mais limitado que isso. Se ele ao menos levar o
leitor a pensar um pouco mais detidamente sobre a questão, o objetivo já terá
sido alcançado.
Uma
definição prática
Para um direito ser genuinamente válido é necessário
que todos nós, como seres humanos, tenhamos a capacidade de usufruir
esse mesmo direito, ao mesmo tempo e da mesma maneira.
A obviedade dessa afirmação vem do fato de que, para
algo ser realmente um direito, todos os outros seres humanos devem logicamente
ter esse mesmo direito. Não pode haver nenhum conflito ou contradição lógica. Um
indivíduo não pode, sem cair em contradição, alegar que possui um direito e, ao
mesmo tempo, negar esse direito para terceiros. Fazer isso seria o
equivalente a admitir que esse direito não é realmente um direito, mas sim um
privilégio.
Por isso, tem de ser possível que todos os
indivíduos possam usufruir esse suposto direito simultaneamente, sem nenhuma contradição lógica. Se, quando eu
exerço um direito que alego possuir, estou fazendo com que seja impossível
outra pessoa exercer esse mesmo direito ao mesmo tempo, então minha ação
implica que este suposto direito é exclusividade minha. Minha ação implica
que tal direito é apenas meu, e não de outra pessoa. O que é um direito para
mim é uma obrigação de terceiros. Ou seja, não é direito, mas sim privilégio.
Exemplo básico. Se eu alego ter o direito de receber
serviços de saúde gratuitos, então, na prática, estou dizendo que outra pessoa tem
o dever de me fornecer estes serviços — ou, de modo mais realista, estou
dizendo que outra pessoa tem o dever de pagar para que eu receba estes
serviços.
Ou seja, outro indivíduo tem de ter sua renda
(propriedade) confiscada para custear meus serviços médicos.
Obviamente, esta outra pessoa, a partir deste
momento, não mais tem o mesmo direito que eu tenho. Meu direito é receber
serviços gratuitos; o "direito" dela é me financiar estes
serviços. Meu direito criou um dever para essa pessoa: ela agora é
obrigada a efetuar uma ação que ela não necessariamente queria
efetuar. Embora nós dois sejamos igualmente humanos, a liberdade de
escolha desta pessoa foi subordinada à minha liberdade de escolha. Aquele direito
que concedi a mim (saúde gratuita) está sendo negado a esta outra pessoa, pois
ela, ao ficar com o fardo de pagar pela minha saúde, perdeu seu
"direito" à saúde gratuita.
Para que eu adquirisse um direito, essa pessoa teve
de arcar com uma obrigação. Pior ainda: ela teve sua propriedade espoliada, o
que seria uma flagrante agressão ao seu direito de propriedade.
A seguir, apresento duas listas. A primeira
relaciona os itens aos quais pessoalmente acredito que você tem o direito. A
segunda é uma lista de coisas às quais pessoalmente creio que você não tem o direito (e prontamente concedo
a você todo o direito de discordar de mim).
Coisas
a que você tem direito:
1. não ter a sua vida retirada de você (a menos que
você tente retirar a vida de outro sem justificativa ou motivo de legítima
defesa);
2. pensar o que quiser;
3. falar o que quiser (o que nada mais é do que a expressão
verbal ou escrita do item #2) desde que faça isso utilizando seus próprios meios.
4. manter a propriedade material daquilo que você construiu
por conta própria, daquilo que ganhou de presente, e daquilo que adquiriu via transação
pacífica e voluntária.
5. empreender e ganhar a vida fazendo aquilo que
quiser, desde que não agrida a vida e a propriedade de terceiros (que é uma consequência
do item #4).
6. criar e educar seus filhos como quiser.
7. viver em paz e com liberdade, desde que não ameace
a paz e a liberdade de terceiros.
Coisas
a que você não tem direito:
1. internet de banda larga e alta velocidade;
2. cheeseburgers, vinhos ou um iPhone;
3. a casa, o carro, o iate, o jatinho, a renda, o salário,
a empresa ou a conta bancária de outra pessoa;
4. viver à custa do trabalho de terceiros com os
quais você não fez um acordo voluntário (você não tem o direito de escravizar ninguém
ou mesmo de confiscar uma parte dos ganhos de outras pessoas);
5. obrigar um curandeiro, um renomado cirurgião, ou
qualquer profissional entre esses dois extremos a tratar de você;
6. escolas, faculdades, métodos contraceptivos,
colonoscopias ou estádios financiados via impostos (ou seja, com dinheiro
coercitivamente confiscado de terceiros);
7. qualquer bem que não seja seu, por mais que você realmente
queira e acredite ter o direito de possuir;
8. estipular como outras pessoas devem educar seus
filhos (principalmente obrigá-las a colocá-los em escolas);
9. qualquer bem ou serviço gratuito — a menos, é
claro, que o proprietário legítimo delas opte por distribuí-las livremente;
10. qualquer coisa que algum político tenha
prometido dizendo que você tem o direito a ela (moradia, transporte, lazer,
cultura, felicidade, beleza etc.).
Sim, há algumas zonas cinzentas. Por exemplo, embora
eu creia que você tem o direito de criar e educar seus filhos como quiser, maus
tratos, abusos e negligência não são defensáveis. No entanto, vamos manter o
foco no nos princípios essenciais.
Direitos
positivos versus direitos negativos
Veja a lista novamente, com cuidado. Qual é a
diferença essencial entre a natureza da primeira lista e a natureza da segunda
lista?
Acertou. Na primeira
lista, nada é exigido de terceiros, exceto que eles deixem você em paz. Nada
é confiscado, nada é expropriado e nenhuma ação positiva é imposta. A liberdade,
a propriedade e a vida das outras pessoas seguem intactas. Nenhum passivo foi
criado.
Já na segunda lista, no entanto, para que você tenha
o direito a algo, outras pessoas têm de ser obrigadas
a fornecer esse algo para você. A liberdade, a propriedade e até mesmo a vida
de terceiros foram negativamente afetadas. Trata-se de uma diferença monumental.
A primeira lista abrange os "direitos naturais", que
também são chamados de "direitos negativos". Eles são naturais porque são inerentes
à natureza humana; são direitos que todos nós como seres humanos usufruímos
pela simples virtude de sermos humanos. Eles derivam de nossa essencial natureza
de sermos indivíduos singulares e sensatos. E são negativos porque não impõem obrigações
a terceiros, exceto um compromisso de não agredir. De novo: a única imposição que
tais direitos impingem a terceiros é a de não efetuar uma determinada ação.
Já os itens na segunda lista são chamados de "direitos
positivos" porque outras pessoas devem fornecê-los a você ou serem coagidas a
fazê-lo caso se neguem. Ou seja, tais direitos necessariamente impõem a
terceiros a obrigação de efetuar ações positivas.
Ao passo que o direito negativo simplesmente impõe a
terceiros o dever de não iniciar coerção contra inocentes — seja na forma de
violência bruta, seja na forma furtiva obrigá-lo a pagar por bens e serviços
que serão ofertados a terceiros —, o direito positivo tem como consequência exatamente
a agressão contra terceiros inocentes.
Adicionalmente, os direitos naturais ou negativos são
irrefutáveis: eles não podem ser negados, pois, se isso ocorrer, a pessoa que
os nega estará caindo em contradição, pois estará negando sua própria condição
de ser humano.
Conclusão
Embora eu acredite que nem você nem eu temos o
direito a nenhuma daquelas coisas disparatadas na segunda lista, devo
acrescentar que nós certamente temos o direito de criá-las, de buscá-las,
de recebê-las como presente de
benfeitores voluntários, ou de obtê-las
via transações comerciais. Apenas não temos o direito de obrigar terceiros a
nos fornecê-las.
Se qualquer um de nós tivesse esse direito de tomar
essas coisas de terceiros, então por que outras pessoas também não teriam o
mesmo direito de tomá-las de nós?
A existência de "direitos negativos" significa simplesmente
que ninguém pode escravizar, coagir ou despojar terceiros de sua propriedade. Acima
de tudo, significa que cada um de nós pode oferecer resistência a tais condutas
quando outros incorrerem nelas.
No mais, querer ter acesso a bens e serviços sem ter
desempenhado nada a ninguém significa simplesmente querer escravizar
terceiros. Se não fosse por este corrompido encanto de que é possível ter
algo em troca de nada, as pessoas há muito já teriam rejeitado a ideia de que
desejos implicam direitos.
Porém, se a atual tendência desta noção de que
desejos são direitos não for revertida, nossa cobiça pela propriedade alheia seguirá
nos corrompendo de maneira cada vez mais profunda. As consequências podem ser
nefastas. Na mais benevolente das hipóteses, estaremos criando uma sociedade
mimada que muito exige e pouco produz.
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