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quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Homo Sapiens que gostam de protesto

 Eu gosto de analisar certas histerias sociais. Acho engraçadas e pitorescas manifestações cujos adeptos, se gastassem uns 10 minutos de sincera reflexão sobre o modus operandi da turba e as consequência das ideias defendidas, com certeza diminuiriam pela metade.

Certa vez, na Avenida Paulista ― minha primeira vez na avenida mais famosa do país ― me deparei com uma manifestação vegana; moças e rapazes estavam panfletando suas ideias de amores aos animais em um teatro bizarro que envolvia um homem representando uma vaca no matadouro, só que com um detalhe: ele não era uma vaca. Ao mesmo tempo em que rolava a representação do abate do minotauro, uma menina de no máximo 20 anos tentava religiosamente me convencer de que o veganismo era o próximo estágio da evolução humana.

Tal afirmação apaixonada me pôs a pensar: a evolução humana estaria evidenciada, então, num prato de alfafa temperada com sal do Himalaia, e não ― por exemplo ― na obra Vênus e Marte de Sandro Botticelli? Então os nossos ancestrais chegaram ao Partenon e às catedrais góticas; 9ª sinfonia de Beethoven e 4ª sinfonia de Brahms; Suma Teológica Divina ComédiaPietà e La disputa del sacramento por mero desvio de propósito(?), pois segundo a vegana evolucionista o pico do progresso humano e civilizacional estaria, na realidade, em comer couve em vez de frango.

Por incrível que pareça, eu não tenho nada contra o veganismo, acho até fofo, apesar de contentemente preferir um churrasco mal passado a um pote de salada. Eu apenas não concordo com certas causas, meios e fins buscados por certos grupos. Tal discordância parece estar gerando mal-estares irreconciliáveis na modernidade; não é mais permitido, por exemplo, não achar que a igualdade social seja o remédio para a sociedade sem que tal opinião gere afoitos e violentos contrapontos e até boicotes.

No entanto, para azar de alguns, eu sou aquele tipo preconceituoso que separa o joio do trigo quando o assunto versa sobre princípios morais e políticos, que sorridentemente discrimina a burrice aclamada pelas massas, que abertamente é hostil a ideologias que aclamam ditadores e ditaduras progressistas. Eu sou aquele que, em uma escala de prioridades de consertos a serem realizados na humanidade, deixa o veganismo abaixo da volta da TV Globinho no lugar do programa da Fátima Bernardes. E aqui está o assunto de hoje: o uso da razão na escolha das batalhas que travamos.

A razão é a arte de escolher e elencar as prioridades de nossas vidas, traçar meios para alcançar objetivos e, também, de negar futilidades em busca de avanço ético e espiritual. Segundo Jordan Peterson, em 12 Regras Para a Vida: Um Antídoto Para o Caos, o nosso avô “macacão” pré-histórico só evoluiu quando percebeu não ser nada inteligente comer 10% da carcaça de um animal ― posso imaginar veganos assustadíssimos nesse momento ― e deixar 90% para apodrecer, sendo que mais tarde ele e os demais de seu bando sentiriam fome novamente e consequentemente ele teria que caçar de novo. “Mor trampo”, pensou o macacão. Foi aí, num insight quase milagroso, que o Homo Sapiens descobriu que seria inteligente guardar aquele pedaço de zebra para o jantar, poupando-o de ter que caçar novamente ― o Ifood, aliás, é apenas uma evolução desse processo de encurtamento da caça. O avô macacão pensou, projetou, analisou e mudou sua conduta após a análise do que precisaria daqui a algumas horas, organizou suas ideias, ponderou os meios necessários, estabeleceu regras a serem seguidas no projeto, calculou as possibilidades, e descobriu a arte de poupar esforço e comida. Tudo isso, historicamente dizendo, quase que “numa paulada só”. O Homo Sapiens, agora, pensava; e porque pensava, podia escolher e, por poder escolher, também podia ser livre.

O homem, como é de seu feitio, conseguiu usar sua capacidade racional de escolha e priorização para livremente escolher as prioridades erradas. isso, sinceramente, nem é um problema real, afinal, desde quando o homem passou a pensar ele também começou a pensar errado. É assim mesmo, os homens falham. Ver a realidade não significa entender a realidade, diria Eric Voegelin em A Nova Ciência Política; entretanto, nunca na história humana os indivíduos trabalharam com tanto afinco e paixão a fim de justificar as suas escolhas erradas.

Sêneca dizia em seu estoicismo que o homem deve organizar seu interior através das virtudes, antes de propor mudanças na urbe através da política; o famoso: “arrume sua cama antes de tentar arrumar o mundo”. E não é que o romano acertou na mosca? Quase todos os problemas sociais dos homens, se examinarmos de maneira mais detida, não passam de uma desordem do espírito e, por consequência, da corrupção de suas capacidades de análise.

Separar o joio do trigo não é algo instintivo, tal como construir catedrais e defender valores civilizacionais não são tarefas inscritas nas cognições dos hipopótamos. Somente os homens podem escolher entre lutar ou declinar de uma batalha, somente os homens traçam estratégias para conquistar reinos ou corações; somente os homens são capazes de gerar prosperidade e diminuir as misérias materiais e espirituais, somente o homem é capaz de gerar riquezas e praticar virtudes; só nós podemos ser deliberadamente maduros, centrados e racionais.

É verdade que foi este mesmo homem que um dia justificou e escravizou negros em nome de um conforto fétido e espúrio, mostrando assim que ser racional não significa usar a razão com inteligência e integridade; no entanto é esta mesma razão do homem que hoje constrói milhares de colunas argumentativas e entorpece a sociedade de críticas, análises e estudos contra tal postura discriminatória. Agora é consenso entre os razoáveis que o racismo foi (e é) uma mácula na história da humanidade, e que posturas e ideias desse tipo são cancros a serem expurgados através dos caminhos da lei e da exposição social dos criminosos. A melhor solução para desmoralizar um racista é deixa-lo se expor.

Tal maturidade para condenar ideias e atitudes erradas passa por nossa inteira capacidade de escolher os bons combates, os meios dignos e morais para defender valores condizentes com a ordem natural e com a evolução histórica da civilização; ao homem cabe ser o melhor que puder, praticando as virtudes que o educam e recusando os vícios que o degradam. Protestar é um direito humano, assim como recusar ideias torpes e condenar atitudes criminosas é um dever dos homens.

P.H.Alves

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