Era noite. Depois de um dia exaustivo de trabalho, João se sentou no sofá para assistir ao noticiário. Na tela, era apresentada mais uma manchete de corrupção no governo federal: esquemas milionários e obras inacabadas. Revoltado, balançou a cabeça e murmurou:
— Esses políticos são todos ladrões e bandidos… não dá pra confiar em nenhum! Esse país nunca vai pra frente desse jeito!
Sua esposa, que arrumava a mesa para o jantar, respondeu com um olhar cansado. João, então, completou quase sem perceber a contradição:
— Tomara que o governo libere logo o vale-gás, senão a gente não consegue cozinhar nem o feijão da semana. E, se não aumentarem o Bolsa Família, a Eloísa vai continuar usando a calça velha mais um ano.
No mesmo fôlego em que amaldiçoava os políticos, João depositava neles sua esperança. Rejeitava-os como corruptos e ineficazes, mas seguia esperando que a solução viesse justamente deles.
O brasileiro amaldiçoa os políticos como parasitas, mas continua a tratá-los como salvadores.
“embora também não confiemos nas instituições públicas, nos políticos e no próprio governo, esperamos e pedimos que o governo resolva os principais problemas do país”.
Eis a nossa esquizofrenia coletiva: denunciamos a corrupção com indignação teatral, mas continuamos a pedir aos mesmos corruptos que controlem cada aspecto da nossa vida.
Posso afirmar sem receio: é entre os jovens que esse paradoxo se revela de maneira mais clara. Em geral, eles chegam à vida adulta com impaciência e expectativas grandiosas. Desejam transformar o mundo, mas não aceitam que o progresso real é fruto de esforço, poupança, disciplina e longo prazo — elementos que não seduzem corações ansiosos. O socialismo, nesse sentido, oferece um atalho sedutor: a promessa de justiça imediata, igualdade instantânea e uma sociedade sem conflitos. É uma narrativa atraente, principalmente para quem ainda não enfrentou os desafios de produzir, poupar e competir no mercado.
a hostilidade ao capitalismo não nasce de uma análise fria e racional, mas de ressentimentos profundos e frustrações pessoais. O indivíduo que não alcança o sucesso que deseja encontra no capitalismo um bode expiatório conveniente: se não prospera, é porque o capitalismo é injusto; se não é reconhecido, é porque a sociedade é opressora; se não conquista prestígio, é porque os ricos monopolizam todas as oportunidades. Em vez de assumir a responsabilidade por suas escolhas ou aceitar a necessidade de disciplina e mérito, prefere culpar um inimigo invisível e coletivo.
Os intelectuais, professores, artistas e aristocratas desempenham papel central nesse processo. Muitos deles, incapazes de brilhar no mercado livre de ideias ou de alcançar reconhecimento em áreas produtivas, encontram no socialismo uma explicação conveniente para o próprio fracasso. Em vez de admitir limitações pessoais, projetam a culpa no “sistema capitalista”, que supostamente privilegia apenas os ricos e poderosos. Assim, tornam-se propagandistas do ressentimento, cultivando entre os jovens a ilusão de que o mundo lhes deve sucesso e prestígio sem a contrapartida do mérito.
É nesse ponto que a mentalidade anticapitalista se consolida: o jovem, alimentado por intelectuais (e professores) frustrados, aprende a ver a sociedade livre não como um campo de oportunidades, mas como uma conspiração contra si. O capitalismo passa a ser descrito não como o sistema que elevou padrões de vida e criou prosperidade, mas como um inimigo a ser combatido. A adesão ao socialismo, portanto, não nasce da análise fria dos fatos, mas da combinação entre desejos juvenis de transformação rápida e a retórica amarga de intelectuais ressentidos.
Quando esses jovens ingressam na universidade, a situação não melhora — ao contrário, piora. Ali, o ambiente que deveria ser o espaço por excelência do livre questionamento tornou-se o centro de reprodução mais intenso da ortodoxia estatista.
Não existe debate acadêmico. O que há é um monopólio ideológico: o progressismo circula livremente, enquanto toda ideia libertária ou conservadora é silenciada antes mesmo de ser ouvida.
Ouvimos a mesma cantilena, repetida até a exaustão: a sacralização da democracia majoritária, a suposta inevitabilidade do estado, a exaltação da redistribuição, o culto irracional à “igualdade” e, como consequência natural, a demonização de qualquer alternativa que aponte para a propriedade privada, o livre mercado ou a responsabilidade individual.
a ideia de que alguns grupos sociais tendem a gastar mais no presente, enquanto outros planejam mais o futuro, poupando e investindo. Para ilustrar, Hoppe mencionou que, em média, sociedades compostas majoritariamente por homossexuais poderiam apresentar maior orientação para o consumo imediato, já que, estatisticamente, não tinham filhos nem preocupações ligadas à herança familiar.
A observação, puramente teórica, foi suficiente para gerar uma denúncia formal de um aluno que se declarou ofendido. A universidade abriu um processo contra Hoppe, acusando-o de intolerância. Rapidamente, a questão deixou de ser acadêmica e virou política: não importava se o exemplo era parte de uma teoria econômica, o que contava era que havia violado um dogma cultural sensível. Hoppe só não perdeu o cargo porque seu contrato de tenure o protegia.
Nos Estados Unidos, tenure é a estabilidade acadêmica conquistada após um rigoroso processo de avaliação. Um professor com tenure não pode ser demitido por pressões políticas ou ideológicas, a não ser em casos extremos de crime ou má conduta grave. O objetivo é justamente proteger a liberdade acadêmica contra modismos ou perseguições.
No entanto, no caso de Hoppe, a proteção do tenure mostrou-se insuficiente. Embora não tenha perdido o cargo, foi hostilizado, vigiado e tratado como “professor tóxico”. Sua presença tornou-se insustentável dentro da universidade.
A universidade brasileira já não é um espaço de descobertas, mas de slogans. A teoria crítica da raça se espalha em cursos de direito e história; o feminismo se tornou pauta obrigatória nas faculdades de educação; a ideologia de gênero aparece nos livros de biologia; e programas “antifascistas” servem de rótulo para censurar qualquer discordância. Não importa a disciplina: sempre há uma cartilha ideológica esperando para ser aplicada.
Os exemplos se multiplicam. Em faculdades de arquitetura, discute-se “desconstrução do urbanismo patriarcal”; em cursos de medicina, fala-se de “epistemologias feministas do corpo”; na pedagogia, estudantes são treinados para “descolonizar o currículo”; até nas engenharias surgem disciplinas sobre “impactos sociais do capitalismo tardio”.
E o resultado disso é previsível. Pesquisas sérias ficam em segundo plano, laboratórios se tornam arenas de militância e professores transformam a sala de aula em púlpito ideológico. Quem questiona é acusado de “intolerância” ou “negacionismo”. O ambiente que deveria ser o centro do livre questionamento virou uma fábrica de dogmas. Chamam isso de educação superior, mas na prática é apenas doutrinação superior — a catequese secular do estado.
À primeira vista, é como se estivéssemos cercados por um deserto árido. As ideias de liberdade parecem definhar, derrotadas antes mesmo de entrar em campo. A militância socialista é brutal, barulhenta e escandalosa — ocupa todos os espaços e dá a impressão de ter vencido em todas as frentes.
Esta não é uma batalha perdida, mas uma batalha longa. A maré estatista e socialista pode, por enquanto, lotar auditórios e dominar manchetes, mas vive de barulho e intimidação. O futuro, no entanto, pertence às ideias corretas. E, enquanto houver quem as sustente sem medo e sem pedir desculpas, a liberdade não apenas sobreviverá — ela vencerá.
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