A durabilidade de uma
social-democracia depende, majoritariamente, de dois fatores: tanto a tributação
quanto a taxa de fecundidade têm de ser crescentes.
A tributação tem de ser
crescente porque os gastos sociais são crescentes: como a população está
inevitavelmente envelhecendo — e, com isso, utilizando cada vez mais serviços bancados
pelo estado social-democrata, como saúde e previdência —, um volume cada vez maior
de dinheiro tem de ser arrecadado.
Simultaneamente, para que
este maior volume de dinheiro possa ser arrecadado, é imprescindível que a população
tributada também esteja em crescimento contínuo. Se a população a ser tributada
parar de crescer, a arrecadação tributária irá parar de aumentar.
Na mais benevolente das
hipóteses, isto é, se a população tributada for muito produtiva, a arrecadação
até poderá crescer, mas o fará a um ritmo muito
mais lento, o que já bastará para afetar todo o sistema.
Afinal, se a população continua
envelhecendo e se aposentando a um ritmo crescente (uma inevitabilidade
demográfica), mas o dinheiro necessário para manter seu bem-estar social não está
sendo arrecadado no mesmo ritmo, então temos uma irreversibilidade matemática: faltará
dinheiro para essas pessoas.
A Finlândia já chegou lá
Em 2017, uma reportagem
da Bloomberg já relatava que os políticos e economistas do país estavam
profundamente preocupados com o fato de que não haverá um número suficiente de
pagadores de impostos no futuro para financiar o estado assistencialista do
país. A Finlândia estava vivenciando uma "escassez de bebês".
Em 2016, o país teve o
menor número de partos em 148 anos — ou desde a grande fome de
1868. A taxa de fecundidade da Finlândia caiu para 1,57 filho por mulher, e
o percentual de pessoas com 20 anos de idade ou menos em relação à população em
idade de trabalhar é de 40%. Era de 60% em 1970. Ou seja, a base da pirâmide
etária encolheu acentuadamente, ao passo que o topo está só aumentando.
Este percentual de 40% é o
menor entre todos os países nórdicos.
A situação pegou os
economistas do país de surpresa. Eles não só não têm nenhuma solução para isso,
como ainda se mostram um tanto desesperados. Para Heidi Schauman,
economista-chefe do Aktia Bank, as estatísticas são "assustadoras".
Como ele próprio explica:
"Essas estatísticas mostram quão rapidamente nossa sociedade está mudando, e não temos nenhuma solução para evitar esse fenômeno. Temos um setor público grande e o sistema precisa de pagadores de impostos no futuro."
Ou seja, o governo finlandês
fez promessas que não tem como serem cumpridas.
E como as coisas evoluíram?
Pioraram. As promessas estão agora inviabilizando a própria existência do
estado finlandês.
Eis uma reportagem da Reuters,
de março do presente ano.
O governo de coalizão da Finlândia renunciou na sexta-feira, um mês antes das eleições gerais, afirmando que não teria condições de aprovar um pacote de reformas no sistema de saúde do país, reforma esta que é tida como crucial para garantir a solvência fiscal do governo.
E o autor da reportagem
prossegue falando sobre o inevitável.
Os sistemas de saúde ao redor de boa parte do mundo desenvolvido estão sob crescente pressão financeira: as pessoas estão vivendo mais e os custos dos tratamentos estão disparando, ao mesmo tempo em que há menos trabalhadores para bancar um crescente numero de aposentados e pensionistas.
Por cinco décadas (as
sociais-democracias nórdicas começaram efetivamente no final da década
de 1960), os progressistas louvaram os estados de bem-estar social nórdicos
(convenientemente ignorando outros aspectos). Mas agora a conta chegou.
Os países nórdicos, nos quais um abrangente estado de bem-estar é a base de todo o modelo social, estão entre os mais afetados.
Foi prometida uma reforma.
Mas ela não foi aprovada. A carteira está ficando vazia.
Mas a reforma foi tida como controversa e, na Finlândia, planos para cortar custos e aumentar a eficiência estão parados há anos."O retrato que eu recebi das forças políticas no parlamento nos últimos dias me forçaram a tirar conclusões. Não há saída. Estou extremamente desapontado", disse aos jornalistas o primeiro-ministro Juha Sipila, do Partido do Centro, em uma entrevista coletiva.
Eis um grito de desespero.
Tradução: "Precisamos das reformas já! Não há alternativa para a
Finlândia". Estamos esperando. Os eleitores finlandeses também.
O governo tinha como objetivo reduzir dramaticamente o aumento dos gastos com o sistema de saúde na próxima, reduzindo o orçamento para € 18,3 bilhões em 2029 contra uma estimativa inicial de € 21,3 bilhões.As reformas iriam gerar uma economia porque criariam 18 novas regiões para organizar os serviços de saúde em vez das 200 entidades que atualmente são as responsáveis.Críticos disseram que a escala da economia projetada não era realista.
É possível ver para onde
tudo isso leva: calote.
Não, o governo não irá
calotear sua dívida. Nenhum governo é insano ao ponto de atacar exatamente as
pessoas (investidores) lhe mantêm funcionando. "Calote", no caso, significa que o governo irá
mudar as regras anteriormente acordadas. Ele irá aumentar a idade mínima tanto
para se aposentar quanto para se poder usar os serviços "gratuitos" de saúde. Irá também diminuir repasses
e auxílios. Inevitável.
Outros países nórdicos também já tiveram de lidar com a necessidade de cortar custos.A Suécia está gradualmente aumentando a idade mínima para se aposentar, e abriu várias partes do seu sistema de saúde para o setor privado em uma tentativa de aumentar a eficiência.A Dinamarca irá gradualmente aumentar a idade de aposentadoria para 73 anos — a maior do mundo — ao mesmo tempo em que está reduzindo impostos, benefícios e o valor do seguro-desemprego, para estimular as pessoas a trabalharem mais.O problema tem sido particularmente mais grave na Finlândia, onde a crise financeira de 2008-09 amplificou os efeitos das mudanças demográficas, como uma taxa de fecundidade em acelerado declínio.Vários governos finlandeses já tentaram fazer vários e diferentes tipos de reformas no sistema de saúde nos últimos 12 anos. Todos fracassaram.
Observe que há um padrão.
1. Promessas demagógicas.
2. Taxa de fecundidade em declínio
3. Aumento da expectativa de
vida.
4. Déficits orçamentários
do governo (gastos maiores que as receitas).
5. Promessas de reformas que
nunca se concretizam.
6. Mais promessas.
Dizer o quê? Se eleitores
querem promessas, então, como supostamente
teria dito Maria Antonieta, "que comam promessas!".
Será generalizado
Leva um tempo para o
cenário estatisticamente inevitável se concretize. Mas irá se concretizar. Em todo o mundo ocidental.
Idades mínimas para
aposentadoria irão subir continuamente. As prometidas aposentadorias e pensões
serão continuamente reduzidas. Gastos com saúde e educação serão cortados. Haverá
vários tipos de imposição burocrática (uma forma de racionamento) para se
utilizar os serviços estatais de saúde. Remédios deixarão de ser subsidiados. Vários
repasses assistenciais serão cortados, o que inclui subsídios agrícolas e
empresariais.
Haverá uma busca por
culpados quando este calote — sim, é uma forma de calote — ocorrer.
E, em última instância, a
menos que haja uma explosão demográfica, nenhuma reforma que não passe pela
contínua elevação na idade mínima para se aposentar e nos cortes de benefícios assistenciais
será capaz de manter todo o arranjo de seguridade social bancada pelo estado
funcionando.
Esta é uma forma sutil de
calote. Mas é um calote. Os países nórdicos já começaram a calotear. Já estava
na hora.
A fé pagã
Os modelos de estado de
bem-estar foram criados
majoritariamente na década de 1960, uma época em que se imaginava que a
pirâmide etária sempre seria gorda na base (muitas crianças e jovens) e fina no
topo (poucos idosos).
Sob esse arranjo,
imaginou-se que sempre haveria relativamente poucos idosos (que recebem
dinheiro da Previdência e da Seguridade Social), muitos trabalhadores (também
conhecidos como "pagadores de impostos") e várias crianças (futuros
pagadores de impostos).
Naquele mundo, um estado
de bem-estar, embora
não fosse uma boa ideia economicamente, ao menos era matematicamente
sustentável.
Hoje, em contraste, esse
mesmo arranjo já se tornou problemático, pois estamos vivendo mais e tendo
menos filhos. Uma fatia crescente de idosos significa mais gastos
governamentais com previdência, saúde e vários outros subsídios (como
remédios), ao passo que uma fatia decrescente de crianças significa menos
futuros pagadores de impostos para bancar todo esse gasto com a seguridade
social.
Consequentemente, todo o
arranjo social-democrata está sem sustentação. A tendência mundial é uma crise fiscal de estilo
grego.
Milhões de ocidentais irão
descobrir, ao envelhecerem, que depositaram sua fé em um deus falso: o moderno estado
social-democrata. Esse deus irá calotear.
As promessas dos
políticos, em algum momento, irão se revelar desconectadas da realidade fiscal.
Haverá calotes universais em vários programas assistenciais. Isso tenderá a
solapar a confiança nos governos. Irá também acabar com a legitimidade deles
perante os eleitores.
"Mas vocês
prometeram!", dirão os eleitores. "Desculpe, calculamos mal",
dirão os políticos em resposta.
Na Finlândia, isso já
começou. No resto do mundo ocidental, é questão de tempo.
Anthony P. Geller
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