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sábado, 29 de janeiro de 2011

As nossas escolas - A mentira como um método

No dia 11 de abril, publiquei aqui posts sobre aulas de um professor de história do Anglo de Tatuí, o já muito famoso “Carlão”. Cheguei a transcrever o que vai num vídeo de 9 minutos e 3 segundos que está no Youtube. Ele é, diga-se, uma verdadeira estrela do site. A maioria dos alunos parece adorar as suas performances. Num dos filmes, vêem-se vários celulares ligados, registrando a sua “dança”, com as telas iluminadas. Impossível ele não saber que está sendo filmado. Um verdadeiro astro. Se você ainda não viu a sua, digamos, palestra sobre os EUA, clique na imagem acima ou aqui. Este vídeo, a exemplo de outros, já estavam no Youtube desde o ano passado. Foi retirado e posto novamente no último dia 20.
Andei escrevendo, há alguns meses, sobre a distorção do material didático nas escolas, o que me rendeu críticas vindas do subjornalismo que mascateia opiniões. Ali Kamel produziu excelentes artigos a respeito no Globo. Entendam: é claro que o tal professor Carlão de Tatuí” — ou “Zezão de São Paulo” ou “Noam Chomsky do MIT” —, em si, tem importância reduzida. O tema que interessa é a manipulação deliberada da realidade em favor de uma ideologia. O que importa discutir é a desinformação como uma militância política.
Aconteceu o que eu imaginava. Para responder às muitas críticas dos comentaristas às aulas do professor, formou-se uma verdadeira corrente de alunos seus, todos muito indignados. Vetei os que traziam ofensas e tal. E guardei alguns. Trato disso no post abaixo deste. Antes, faço questão de republicar o que diz o tal Carlão no vídeo acima (em vermelho). Volto depois.
… porque a principal forma de riqueza estadunidense está em cima de uma indústria; a indústria alimentícia, a indústria de automóveis, a indústria de refrigerantes, a indústria de roupas está toda atrelada à indústria bélica. Isso todo mundo sabe. [mostra um cogumelo atômico na projeção do telão].
Aqui nós temos 1945, ou “até daqui a pouco” e aqui nós temos duas bombas jogadas, uma em Hiroshima e uma em Nagasaki. Porque eles matam! Essa é a idéia da riqueza estadunidense. E eles matam, eles continuam matando. Porque é a principal indústria, porra! “Num” tem muito que se pensar. O que gera a riqueza estadunidense é a indústria bélica. [“passa”, diz para quem cuida do projetor].
Mas não só no Oriente, porque a idéia de indústria bélica começou no século XIX, dentro da América Latina. Depois eles partiram pra África; depois eles partiram pra a Ásia, e agora estão no Oriente Médio, não é? Quer dizer, e tudo isso daqui que nós ‘tamos colocando é justamente o fruto dessa cobiça dos Estados Unidos. E você não pode esquecer que tudo isso é mercado consumidor que acaba sendo gerado pras principais indústrias que apóiam essa mesma indústria bélica, porra! [“passa”, diz para quem cuida do projetor].
E o pior é que… Dá uma olhada nisso! [mostra a tela com imagem de feridos em guerra] O pior é que eles mentem, porra! Eles conseguem controlar a mídia de uma tal forma, que nós acreditamos que tudo que o Jornal Nacional fala é verdade, que o Jornal da Record fala é verdade, que não existe um nazismo presente filtrando a porra das informações.

Você não consegue enxergar neles nada de errado, porque eles conseguem criar uma verdade pela mídia. Então mentem, sim. E mentem mais. E são várias pessoas que mentem. Você não vai encontrar nada, nunca isso aqui na mídia. [mostra imagem de um telejornal]. Você vai encontrar aqui, uma coisa soft, uma coisa light, a felicidade, não é? [mostra imagem de um homem muçulmano segurando o filho morto] Não um pai segurando o filho. [-passa!].
E o pior é que não se dão por satisfeitos. Eles precisam humilhar, não só mentir. Não é? [mostra telão] E aqui, olha, puta que o pariu!, gosto tanto dessa cena, em Cabul, eu acho tão bonita! Aqui nós temos um monte de iraquianos, um estadunidense aqui, “uma” estadunidense, deve tá com uns quinze mão na chana dela, ela tá sorrindo de alegria, não é?, que coisa absurda!, não é, e finalmente, claro, nós temos o grande ícone dessa neocruzada, hoje testada pelos Estados Unidos, que é uma neocruzada, não é? Afinal de contas, antes de ser uma busca pelo petróleo, que seria a contramão de qualquer tendência, hoje, mundial, é uma guerra contra o islamismo.
E ofende a nossa inteligência… tribunal no Iraque? Se a ONU não permitiu a invasão no Iraque e eles invadiram, como é que a gente vai ter um tribunal hoje no Iraque, pra julgar os condenados do quê? Afinal de contas, que crime que eles cometeram? Se você conseguir me responder o crime que eles cometeram, palavra de honra, aí dá até pra descartar isso aqui, mas não tem jeito, olha isso aqui [telão] um caminhão-bomba atingiu o quartel general da polícia italiana.[incompreensível]
Mas eles exterminam o futuro também! Não pensem vocês que eles só brincam com o presente: eles trabalham o passado, fodem com o presente pra aniquilar lá no futuro. [telão] Isso aqui é uma criança, isso aqui é uma criança, eu me surpreendo, às vezes, quando eu começo a pensar, como é que a gente pode continuar acreditando que um mundo melhor possa ser construído com a presença deles? Incomoda. Eu acho que é o mesmo que, talvez, os gregos pensassem dos romanos. Essa criança ainda tá feliz, aquela também. [Passa].
Mas não só. É no mundo inteiro. Eles são cosmopolitas. É por isso que, eu não sei se vocês perceberam, todos os Estados Unidos são obesos. É claro que salvo nos filmes que nós assistimos. Essas pessoas não fazem parte de um Spa, patrocinados pelos Estados Unidos. No mundo inteiro. E não tem jeito! Se nós não entendermos de alguma forma, veja, a única forma de se impedir um país capitalista imperialista é evitar consumir produtos desse país, eu não consigo enxergar outra forma. Eu sei que eles fazem isso, porque eles vão impedir na base, porque a indústria do lucro é a indústria da guerra.
Eles vão financiar sempre, sempre. [mostra imagens do Bush, de armas e de pessoas e crianças armadas]. Esse revólver eu achei de uma coisa tão bonita! Porque aonde eles entram, entra o mercado também. Onde eles dominam, é um mercado que [inaudível]... E as indústrias estadunidenses patrocinam a guerra porque precisam de mercado consumidor. Não precisa falar muito, quanto maior a miséria, maior a riqueza. Como é que será que uma pessoa pode ter a consciência de viver bem sabendo que existe isso? Eu não consigo, eu não consigo imaginar. Eles conseguem! volto a colocar também: não são todos, hein, só 50% mais um. São seres humanos! Eu não coloquei o Brasil aqui pra não chocar.
Não vai acabar! É essa minha preocupação: não vai acabar. Eu particularmente acho que não, eu não vou tá vivo pra ver, não. A gente precisa dar uma basta, mas devagar, resistir, tentar se conter a tomar uma coca-cola. Eu sei que é difícil. É preciso pagar e deixar o Hollywood, o cigarro. Devagarzinho. Isso vai acabar. Isso vai acabar assim: [imagens do planeta e de um cogumelo atômico]. Aqui é o nosso planeta, ou vai acabar dessa forma, ou as duas coisas juntas. Eu acho que é o mais provável, ou não! Ou talvez a gente consiga, de uma forma ou de outra, resistir a isso. Eu não sei como, palavra! Eu não tenho uma fórmula pra isso. Eu acho que nós poderíamos encontrar alguma alternativa. Por isso que eu tô fazendo uma homenagem a esse povo com as torres gêmeas. Eu tô muito sensível a isso, tem pessoas inocentes que morreram nas torres gêmeas. Por isso que, sem macaquice, eu vou até lá chamar o Luis pra falar sobre isso. [sai da sala]
Mentiras e mistificações- é mentira que toda a indústria americana esteja atrelada à indústria bélica;
- é mentira que os EUA promovam “a guerra” em busca de mercado consumidor. Onde? Em Bagdá? Em Cabul?;
- é mentirosa a relação “quanto maior riqueza (nos EUA), maior pobreza no mundo”. Os EUA enfrentam hoje uma recessão, e a China, por exemplo, nunca foi tão rica. Ou mesmo o Brasil;
- é mentirosa a tese de que o boicote a produtos americanos prejudicaria o “império”, até porque a globalização atomizou a produção em busca de mão-de-obra mais barata. A China, o Brasil e até o pobre Vietnã produzem boa parte de produtos que têm etiquetas de empresas americanas e européias. Um boicote é coisa de uma mente delirante. Mas, ainda que desse certo, iria desempregar pessoas em países pobres;
- é mentira que a ONU permita (ou não) invasões; o Conselho de Segurança pode vetar resoluções; no caso do Iraque, não houve veto. Só não houve aquiescência com a invasão. A diferença faz… toda a diferença. Os EUA não desrespeitaram resolução nenhuma.
O problema da aula deste senhor não é seu esquerdismo barato, mas seu esquerdismo ignorante — e caro, sim, para os pais dos alunos. Um professor que diz que uma militar americana está sorrindo porque há “uns 15 com a mão na chana dela” se autodefine: tenta responder à brutalidade que supostamente acusa com outra. Sei bem que as aulas de cursinho, em muitos casos, optam pelo espetáculo e pela linguagem de futebol de várzea. Algumas empresas pedem que os alunos dêem notas a seus professores, e estes se tornam, então, reféns do Ibope. Carlão deve receber sucessivos “dez com louvor”. Já fui professor. Sei como funciona a máquina. Esse mecanismo de aferição de popularidade é detestável e torna o docente, muitas vezes, um animador de auditório.
Mas há duas coisas aí:
a – ninguém obriga o professor a ter esse emprego;
b – pode-se, suponho, dar uma aula de historia ou de qualquer outra disciplina sem mentir. Carlão me diga quais são as suas referências bibliográficas — não valem jornaizinhos do PC do B, do PSTU ou de militantes políticos —, e vamos, então, conversar. Eu duvido que essa sua “palestra” esteja nas apostilas do Anglo, por mais equivocadas que fossem do ponto de vista ideológico. Como duvido que o Anglo — ou a escola de Tatuí que tem convênio com o curso pré-vestibular — aprove a sua pantomima “em homenagem” ao 11 de Setembro. Carlão se vestiu de terrorista árabe (ver abaixo), com aviãozinho na mão, e dançou ao som de Ivete Sangalo: “Vai rolar a festa”. Uma performance tão idiota quanto macabra. Morreram mais de três mil pessoas naqueles atentados.

Um professor de história pode e deve debater o 11 de Setembro com os seus alunos e a posterior reação do país agredido. Exijo que ele defenda, como defendo (deixo bem claro), a ação americana? Não! Mas há formas de censurá-la sem apelar para a mentira, para a baixaria, para um vocabulário chulo. Digo e assino embaixo, senhores alunos do Carlão — e sou eu a fazê-lo, não a VEJA (assim como a aula é do Carlão, não do Anglo): na transcrição acima, o que há de suposta informação é nada menos do que mentira e mistificação. O resto é proselitismo ideológico. Ele tem o direito de fazê-lo? Na minha opinião, não em sala de aula. E a razão é simples: está estabelecida ali uma relação de autoridade, por mais “bacana” e camarada que ele seja. E ele não pode expor os alunos às suas idiossincrasias políticas. Pouco importa se é professor de história ou de biologia.
Ademais, o que dizer de um professor que afirma que os EUA vão à guerra para ganhar mercado consumidor e, minutos depois, que se trata de uma “nova Cruzada” contra o islamismo? Será que Carlão é assim tão inocente? Sabem quem se refere ao Ocidente como a união dos “novos cruzados com os sionistas”? Osama Bin Laden. Sim, a “teoria” de Carlão tem autoria: a Al Qaeda. E isso eu posso provar se ele quiser. E ele não poderá provar que toda a indústria americana é subordinada à indústria bélica.
Seus alunos me acusam, numa verdadeira corrente — e é bom que saibam que não tenho receio de correntes —, de magnificar um simples vídeo de Internet, sem conhecer o “verdadeiro Carlão”. Bem, pretendo me poupar desse desgosto, mas reparem: ele falou aquelas coisas; ele dançou aquela música, ele vestiu aquela roupa. Seja qual for o verdadeiro Carlão, aqueles “carlões” que se vêem também são ele.
O professor, como vocês viram, deu a senha aos estudantes: “Tudo culpa da mídia; não acreditem na mídia”. Deixe-me ver: a esta altura, lutam contra a mídia Dilma Rousseff, Tarso Genro, Alexandre Nardoni, Anna Carolina Jatobá e Carlão. Outro que não gostava da mídia era Renan Calheiros. Delúbio Soares tem horror dela. Marcos Valério a deplora com todas as forças. Zé Dirceu a considera hedionda. Ah, sim: Lula também não gosta. Tanto é assim, que resolveu criar uma só pra ele: a tal TV Pública — o problema é que ninguém vê.
“Por que Carlão? É só ele?” É claro que não. Falo dele porque estou lidando com uma informação pública, que está na Internet. Se mera ocorrência isolada, eu nem tocaria no assunto. Mas sei que o homem é uma legião. Eles se espalham por aí, escolas afora, especialmente nas particulares, oferecendo sua “consciência” aos estudantes, que depois levam alguns anos para se livrar das deformações.
Ademais, deploro essas aulas-espetáculo, de que ele está longe de ser o único representante. Nos comentários que me chegaram, dizem os estudantes qualquer coisa como: “Ele torna legal o que poderia ser muito chato”. Nada contra isso em particular, embora o “legal” devesse ser substituído por “compreensível”. A didática era assunto que já preocupava os gregos. O que lastimo é que parte desse desempenho teatralizado esteja a serviço, nos vídeos que vi, da mentira mais grotesca.
Não há nada mais simples — e intelectualmente mais covarde — do que atribuir aos Estados Unidos, ao capitalismo e ao mercado as mazelas do mundo. Até o petismo mais rombudo e estúpido já desistiu dessa tara ideológica. Será que Carlão ensina aos alunos dele o que aconteceu quando tentaram criar uma altenativa? Será que ele relatou a seus alunos os 35 milhões de mortos de Stálin, os 70 milhões de mortos de Mao, os 3 milhões de mortos de Pol Pot, os mortos da ditadura cubana, que eliminou, na relação por 100 mil habitantes, 2.600 vezes mais do que a ditadura militar brasileira?
Peçam para ele lhes dar essa aula. E ponham o resultado no Youtube. Comentarei com prazer. E noto: não fui eu a filmar a aula nem a torná-la pública num site que está no mundo inteiro. Lamento. Lamento muito o que estão fazendo nas escolas com nossas crianças e com nossos jovens. O Brasil amarga os últimos lugares nos exames internacionais — o desempenho das escolas particulares é igualmente sofrível. Como se vê, não é por acaso.
Ah, sim. Carlão não diz “americanos”, mas “estadunidenses” porque, “explicou-me” um de seus fãs, “americano é quem nasce nas Américas, seu ignorante”. Vai ver eu não sabia… É claro que o valente considera isso mais um ato de resistência. Deveria evitar também o termo “índio”, já que deriva de um engano de Cristóvão Colombo, não é mesmo, Carlão? Conta aí pra eles… Santo Deus!
Uma última observação. De tudo o que ele fala, mentiras à parte, há uma compreensão da história que é de arrepiar. Referindo-se aos americanos, pergunta: “Como é que a gente pode continuar acreditando que um mundo melhor possa ser construído com a presença deles?” Logo, deve-se entender que um mundo melhor só se constrói SEM a presença deles — uma tese, sem dúvida, esposada hoje pelo terrorismo islâmico.
E filosofa em seguida: “Eu acho que é o mesmo que, talvez, os gregos pensassem dos romanos.” Ora, o Império Romano não se construiu roubando de ninguém o direito natural de ser também império. Venceu guerras. Não fosse ele, seria outro. Quem universalizou a civilização helênica foram os senhores romanos, não os escravos gregos. Não reconhecer isso é deixar de fazer história para fazer apenas julgamento moral do passado. Se ele, que odeia tanto o Império Americano — e, como se vê, quer destruí-lo — faz um paralelismo com os romanos, então devemos concluir, na sua linha de, por assim dizer, raciocínio, que o Império Romano também foi um mal para a humanidade. Nessas alturas da estupidez, nem o marxismo chegou.
É assim que se está ensinando história no Brasil. E isso, creiam, explica muita coisa.

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