Dentre
as várias e ignaras ideias a respeito de grupos raciais e étnicos que polarizaram as
sociedades durante séculos e ao redor de todo o mundo, poucas foram mais irracionais
e contraproducentes do que os atuais dogmas do multiculturalismo.
Aqueles
intelectuais que imaginam que, ao utilizar uma retórica multicultural que
redefine e até mesmo revoga o conceito de atraso, estarão ajudando grupos
raciais e étnicos que ficaram para trás estão, na realidade, levando estas
pessoas para um beco sem saída.
O
multiculturalismo é um tentador paliativo aplicado àqueles grupos que ficaram
para trás porque ele simplesmente afirma que todas as culturas são iguais, ou
"igualmente válidas", em algum sentido vago e sublime. De acordo com este dogma, as características
culturais de todas as etnias e raças seriam apenas diferentes — nem melhores nem
piores.
No
entanto, tomar emprestadas características particulares de outras culturas —
como os algarismos arábicos que substituíram os algarismos romanos, mesmo nas
culturas ocidentais oriundas de Roma — implica que algumas características não
são simplesmente diferentes, mas sim melhores, inclusive os números
utilizados.
Algumas das mais avançadas
culturas de toda a história pegaram emprestados comportamentos e
características de outras culturas; e isso pelo simples fato de que até hoje
nenhuma coleção única de seres humanos foi capaz de criar as melhores respostas
para todas as questões da vida.
Todavia,
dado que os multiculturalistas veem todas as culturas como sendo iguais ou
"igualmente válidas", eles não veem nenhuma justificativa para as escolas
insistirem, por exemplo, que as crianças negras aprendam seu idioma
materno. Em vez disso, cada grupo é
estimulado a se apegar ferreamente à sua própria cultura e a se orgulhar de
suas próprias glórias passadas, reais ou imaginárias.
Em
outras palavras, membros de grupos minoritários que são atrasados
educacionalmente e economicamente devem continuar se comportando no futuro como
sempre se comportaram no passado — e, se eles não conseguirem os mesmos
resultados dos outros, então a culpa é da sociedade. Essa é a mensagem principal do
multiculturalismo.
George
Orwell certa vez disse que algumas ideias são tão insensatas, que somente um
intelectual poderia acreditar nelas. O
multiculturalismo é uma dessas ideias. A
intelligentsia sempre irrompe em
indignação e ultrajes a qualquer "diferença" ou "disparidade" de resultados
educacionais, econômicos ou outros — e denuncia qualquer explicação cultural para
esta diferença de resultados como sendo uma odiosa tentativa de "culpar a
vítima".
Não
há dúvidas de que algumas raças ou até mesmo nações inteiras foram vitimadas
por terceiros, assim como não há dúvida de que câncer pode causar morte. Porém, isso é muito diferente de dizer que as
mortes podem automaticamente ser imputadas ao câncer. Você pode pensar que intelectuais seriam
capazes de fazer essa distinção. Mas
muitos não são.
Ainda
assim, intelectuais se veem a si próprios como amigos, aliados e defensores das
minorias raciais, ao mesmo tempo em que empurram as minorias para a estagnação
cultural. Isso permite à intelligentsia
se congratular e se lisonjear de que estão ao lado dos anjos contra as forças
do mal que estão conspirando para manter as minorias oprimidas.
Por
que pessoas com altos níveis de capacidade mental e de talentos retóricos se
entregam a este tipo de raciocínio deturpado é um mistério. Talvez seja porque elas não conseguem abrir
mão de uma visão social que é extremamente lisonjeira para eles próprios, não
obstante quão deletéria tal visão possa ser para as pessoas a quem elas alegam
estar ajudando.
O
multiculturalismo, assim como o sistema de castas, encurrala e amarra as
pessoas naquele mesmo segmento cultural e social no qual elas nasceram. A diferença é que o sistema de castas ao
menos não alega beneficiar aqueles que estão na extremidade inferior.
O
multiculturalismo não serve apenas aos interesses ególatras dos intelectuais;
ele serve também aos interesses de políticos que têm todos os incentivos para
promover uma sensação de vitimização — e até mesmo de paranóia — entre grupos
de cujos votos eles precisam em troca de apoio material e psicológico.
A
visão multicultural do mundo também serve aos interesses daqueles que estão na
mídia e que prosperam ao explorar os melodramas morais. O mesmo pode ser dito de todos os
departamentos universitários voltados para estudos étnicos e sociais, bem como
de toda a indústria de assistentes sociais, de especialistas em "diversidades"
e da ampla gama de oportunistas que prosperam ao fazer proselitismo racial.
Os
maiores perdedores de toda essa história são aqueles membros das minorias
raciais que se permitem ser conduzidos para esse beco sem saída do
ressentimento e da raiva, mesmo quando há várias outras avenidas de
oportunidades disponíveis. E todos nós
perdemos quando a sociedade fica polarizada.
Minorias
que se sobressaíram e se tornaram mais bem-sucedidas do que a população geral
são aquelas cujo progresso provavelmente em nada está ligado ao fato de terem
ou não discriminado as maiorias politicamente dominantes. No entanto, foram exatamente estas minorias
que atraíram as mais violentas perseguições ao longo dos séculos e dos países
ao redor do mundo.
Todos
os negros que foram linchados durante toda a história dos EUA não chegam ao
mesmo número de homicídios cometidos em apenas um ano contra os judeus na
Europa, contra os armênios
no Império Otomano ou contra os chineses no sudeste asiático.
Há
algo inerente aos sucessos de determinados grupos que inflama as massas em
épocas e lugares tão distintos. O que
seria? Esse fenômeno inflama não apenas
as massas, como também leva a genocídios cometidos por governos, como os da
Alemanha nazista ou o regime de Pol Pot no Camboja. Podemos apenas especular as razões, mas não
há como fugir desta realidade.
Aqueles
grupos que ficam para trás frequentemente culpam seu atraso nas malfeitorias
cometidas por aqueles grupos mais bem-sucedidos. Dado que a santidade não é comum a nenhum
ramo da raça humana, é óbvio que nunca haverá escassez de pecados a serem
mencionados, inclusive a arrogância e a insolência daqueles que calham de estar
no topo em um determinado momento.
Mas a
real pergunta a ser feita é se esses pecados — reais ou imaginários — são de
fato o motivo destes diferentes níveis de êxitos pessoais.
O
problema é que os intelectuais — pessoas de quem normalmente esperaríamos
análises racionais que se contrapusessem à histeria das massas —
frequentemente sempre estiveram na vanguarda daqueles
movimentos que promovem a inveja e o ressentimento contra os bem-sucedidos. Tal comportamento é especialmente perceptível
naquelas pessoas que possuem diplomas mas que não possuem nenhuma habilidade
economicamente significativa que lhes permita obter aquele tipo de recompensa
que elas esperavam ou julgavam ter o direito de auferir.
Tais
pessoas sempre se destacaram como líderes e seguidoras de grupos que promoveram
políticas anti-semitas na Europa entre as duas guerras mundiais, o tribalismo
na África, e as mudanças sociais no Sri Lanka, um país que, outrora famoso por
sua harmonia intergrupal, se rebaixou, por influência de intelectuais, à
violência étnica e depois se degenerou em uma guerra civil que durou décadas e produziu
indescritíveis atrocidades.
Intelectuais
sempre estiveram por trás da inflamação de um grupo contra outros, promovendo a
discriminação e a violência física em países tão díspares quanto Índia,
Hungria, Nigéria, Tchecoslováquia e Canadá.
Tanto
a teoria do determinismo genético como sendo a causa dos diferentes níveis de realizações
pessoais quanto a teoria da discriminação como o motivo destas diferenças — ambas contraditórias e criadas por intelectuais — geraram apenas polarizações raciais
e étnicas. O mesmo pode ser dito da
ideia de que uma dessas teorias tem de
ser a verdadeira.
Essa
falsa dicotomia de que uma delas tem de ser a verdadeira deixa aos grupos mais
bem-sucedidos duas opções: ou eles se assumem arrogantes ou se assumem culpados
criminalmente. Da mesma forma, deixa aos
grupos menos exitosos a opção entre acreditar que sempre foram inerentemente
inferiores durante toda a história ou que são vítimas da inescrupulosa maldade
de terceiros.
Quando
inumeráveis fatores fazem com que a igualdade de resultados seja virtualmente
impossível, reduzir estes fatores a uma questão de genes ou de maldade é a
fórmula perfeita para se gerar uma desnecessária e perigosa polarização, cujas
consequências frequentemente são escritas em sangue ao longo das páginas da
história.
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