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segunda-feira, 27 de abril de 2020

COVID 19 E O FUTURO

Em nome das “medidas preventivas de distanciamento” a OMS sacrifica as crianças dos países pobres

Há ainda outro dado extremamente chocante nessa decisão precipitada de confinar todo o mundo em casa.

No dia 26 de março a OMS recomendou “suspender temporariamente a realização de campanhas de vacinação em massa devido ao aumento do risco de promover a circulação [de pessoas] na comunidade”
No dia 26 de março, a Organização Mundial da Saúde publicou um documento intitulado “Princípios diretores para as atividades de imunização durante a pandemia da Covid-19”, no qual se afirma que, em vista das medidas preventivas de distanciamento físico, “recomenda-se suspender temporariamente a realização de campanhas de vacinação em massa, devido ao aumento do risco de promover a circulação [de pessoas] na comunidade”.38
Seguindo essa recomendação, a Iniciativa Global para a Erradicação da Pólio suspendeu sua campanha de vacinação, apesar de seus assessores científicos calcularem que isso aumentará o número de paralisias em crianças, e que alguns países livres dessa doença infecciosa voltarão a se contagiar. E a pólio é apenas uma das tantas vacinações que foram suspensas na África, segundo o jornal madrilense El País: “A jornalista Leslie Roberts documenta em Science que milhões de crianças já se viram privadas de suas vacinas de pólio, sarampo, papiloma, febre amarela, cólera e meningites. Fala-se em 14 milhões, mas é uma estimativa baixa, certamente muito baixa”.39
Segundo o Centro de Controle de Doenças de Atlanta, 23 países já suspenderam suas campanhas contra o sarampo e mais 16 estão pensando em fazê-lo, apesar de ele matar 3% a 6% dos infectados (muitas vezes mais que o coronavírus) e de a maioria de suas vítimas serem crianças malnutridas.
Naquilo que o jornal espanhol apelida “dilema do diabo”, as autoridades da maioria dos países ricos escolheram, volens nolens,poupar as potenciais vítimas da Covid-19 (talvez por constituírem a maioria dos eleitores), sacrificando as crianças dos países pobres, que vão morrer ou ficar inválidas por causa dessa orientação irresponsável da OMS.40
Concorda conosco o leitor, à vista desses dados, que o mundo contemporâneo – graças à irresponsabilidade da OMS, de seus líderes políticos e de sua mídia, que criaram o pânico – está se suicidando por medo de morrer de Covid-19? Isso é tão óbvio, que uma pergunta surge espontaneamente: Quem se beneficia com esse suicídio coletivo da nossa sociedade contemporânea?

Os quatro principais beneficiários desse suicídio

Do ponto de vista geopolítico, o grande beneficiário da crise gerada pela epidemia iniciada em Wuhan foi o próprio regime comunista da China. Mas, no seio das sociedades ocidentais, três correntes ideológicas – as quais, aliás, se têm mostrado as grandes propagandistas do confinamento radical da população – serão as maiores beneficiárias dele: os ecologistas radicais, os promotores da governança mundial e a esquerda radical.
  1. O Partido Comunista da China
Apesar da imensa responsabilidade das autoridades comunistas pelo surto ainda não esclarecido do vírus SARS-CoV-2, e de sua primeira difusão em Wuhan e toda a província de Hubei,41 o maior beneficiário dele, tanto interna quanto externamente, é sem dúvida o regime comunista de Pequim. John Grey, professor emérito da London School of Economics, o sintetiza em um artigo para o NewStatesman: “Ninguém conhece todos os custos humanos da paralisação chinesa. Mesmo assim, o regime de Xi Jinping parece ter-se beneficiado da pandemia. O vírus forneceu uma justificativa para expandir o estado de vigilância e introduzir um controle político ainda mais forte. Em vez de desperdiçar a crise, Xi está utilizando-a para expandir a influência do país. A China está se inserindo no lugar da UE, ajudando governos nacionais em dificuldades, como a Itália. Muitas das máscaras e kits de teste fornecidos provaram estar com defeito, mas o fato parece não ter afetado a campanha de propaganda de Pequim. […] O presidente sérvio Aleksandar Vucic foi mais direto e realista: ‘Não existe solidariedade europeia, […] isso foi um conto de fadas. O único país que pode nos ajudar nessa situação difícil é a República Popular da China. Para o resto deles, obrigado por não terem feito nada’”.42
Essa expansão da influência chinesa – não somente diplomática, mas ideológica – é auspiciada pelas correntes de esquerda “bolivariana”, como testemunha a brasileira Paola Estrada, da Secretaria Internacional Operativa dos Movimentos Sociais Populares na América Latina: “Está ficando cada vez mais evidente que, durante a pandemia, a China vem assumindo um papel muito mais destacado do que tinha antes, tanto no âmbito econômico e comercial quanto no aspecto político e ideológico. Ainda é difícil projetar cenários do desfecho desse processo, no entanto é inegável que o governo chinês tem sido aplaudido pelo mundo todo pela sua capacidade, eficácia e velocidade em enfrentar o avanço da epidemia na China – garantindo as medidas de isolamento social, construindo hospitais, fabricando testes e insumos hospitalares, qualificando profissionais e investindo em ciência e tecnologia. […] Em tempos de pandemia, em que temos de lidar com tantas mudanças, incertezas, tristezas e ataques da direita e do imperialismo, o exemplo do povo venezuelano, do povo cubano e do povo chinês enchem nossos corações com a esperança de que outro mundo é possível”.43
  • Os ecologistas
Logo após a adoção das medidas de confinamento pelos governos, os ecologistas proclamaram aos quatro ventos estar provado que, diante de uma ameaça global, era possível impor medidas drásticas que afetassem a vida diária das populações.44 Uma vez terminada a crise sanitária, sugerem eles que seria inconsequente não declarar a “urgência climática” e impor medidas igualmente drásticas para diminuir a produção de CO2.45
Na Espanha, cinco associações (Amigos de la Tierra, Greenpeace, Ecologistas en Acción, SEO/BirdLife e WWF) se dirigiram à Comissão Europeia e ao governo espanhol, solicitando que os pacotes públicos para reativar a economia sejam empregados para “acelerar a passagem para uma economia descarbonizada e verde”. A distribuição de fundos deveria penalizar “aquelas atividades mais insustentáveis” e ser condicionada a um compromisso “para deter a perda de biodiversidade” e favorecer a “descarbonização”.46
Mais ainda, por iniciativa do deputado europeu Pascal Confin, nasceu a “Aliança Europeia para uma Recuperação Verde”, a qual inclui 180 líderes europeus (79 eurodeputados de 17 países, 37 diretores gerais de multinacionais, 28 associações empresariais e sete ONGs, além de grupos de especialistas). Sua finalidade é promover uma saída “verde” à crise econômica do coronavírus e “desencadear um novo modelo econômico europeu”. Para a Aliança, o “núcleo da estratégia econômica” deve ser “a luta contra a mudança climática”, e os “investimentos massivos” a serem feitos para salvar a economia devem alinhar-se com “princípios ecológicos”. A Aliança apoia a carta que 13 ministros do Meio Ambiente e Clima da União Europeia enviaram a Bruxelas, exigindo a manutenção do Pacto Verde idealizado pela recém-assumida Comissão von der Leyen.47
  • Os “globalistas”
Assim que os países europeus começaram a fechar suas fronteiras e tomar medidas protecionistas, disputando as máscaras e os testes de péssima qualidade enviados “generosamente” pela China, os promotores da “sociedade aberta” começaram a proclamar que a única solução para a pandemia seria uma resposta coordenada e global.
Bill Gates publicou em vários jornais uma coluna intitulada “Uma estratégia mundial contra a Covid-19”, dizendo que embora os governos tenham fornecido respostas nacionais, seus líderes devem reconhecer que, enquanto o vírus estiver presente em algum lugar, “será um problema para todo o mundo”. Acrescentou que “precisamos de uma estratégia mundial” para que os recursos financeiros e médicos (máscaras, testes, etc.) sejam distribuídos de maneira eficaz, e os países se comprometam a seguir as diretrizes da OMS.48
Antônio Guterres, ex-presidente da Internacional Socialista e atual secretário-geral da ONU, apresentou um relatório especial intitulado “Responsabilidade compartilhada, solidariedade global: a resposta aos efeitos socioeconômicos da Covid-19”, no qual pediu para consagrar pelo menos 10% do PIB mundial a um fundo de solidariedade destinado à resolução da crise.49
O último laço no pacote foi dado por Gordon Brown, ex-primeiro ministro trabalhista inglês, sugerindo nem mais nem menos que uma forma temporária de governo global para encarar as crises gêmeas – médica e econômica: “O que precisamos é de um executivo de trabalho” – disse o político, que hoje atua como enviado especial da ONU para a educação global.50 Em uma entrevista a El Paísele reiterou: “Precisamos de uma [reunião de] cúpula de compromissos para dotar a emergência sanitária dos fundos necessários. […] E em segundo lugar, de um Executive Task Force [equipe com poderes executivos] no G20, porque as boas palavras já não bastam. Precisamos passar à ação nos próximos dias, e fazê-lo de modo coordenado. É necessário um órgão executivo que dê resposta ao problema que você [o jornalista] menciona sobre [as críticas] às instituições internacionais. […] É preciso uma liderança política compartilhada”. Segundo Brown, na fase atual de esforços para preservar os empregos uma resposta nacional pode bastar, mas na fase seguinte “precisaremos de coordenação fiscal, coordenação monetária e colaboração entre os distintos bancos centrais. E não falo somente de um modelo como o da UE. Refiro-me ao âmbito global. […] Na fase de crescimento, precisaremos de um esforço coordenado de estímulo fiscal em todo o mundo”.51
A nível latino-americano, o chamado Grupo de Puebla – integrado por presidentes e ex-presidentes (Lula da Silva, Dilma, etc.), líderes políticos, acadêmicos e sindicalistas de orientação socialista – publicou uma nota declarando que a atual crise “não tem outra solução senão a da integração da América Latina e do Caribe, e a cooperação em nível mundial”, na qual a OMS “deve ter um papel ainda mais preponderante do que hoje”. O documento convida “governos, organizações e povos do mundo a uma reflexão serena, quando a pandemia termine, sobre um Novo Modelo de Desenvolvimento, que coloque primeiro valores até então desconhecidos, como meio ambiente, inclusão social, redução de desigualdade, segurança alimentar, desarmamento militar, multilateralismo e progressividade fiscal”.52
  • A esquerda radical

A esquerda radical está à espreita para surfar a onda. Em artigo publicado no Intercept, a escritora e ativista Naomi Klein explicou ter aprendido nas duas últimas décadas que “durante os momentos de mudança cataclísmica, aquilo que era previamente impensável passa subitamente a ser realidade”.53
Ao sopro do mesmo vento, o filósofo esloveno Slavoj Zizek sustentou que “o coronavírus nos obrigará a reinventar um comunismo baseado na confiança na gente e na ciência”. Não se trataria do comunismo de outrora, mas sim “de algum tipo de organização global que possa controlar e regular a economia, como também limitar a soberania dos Estados-Nação”. O filósofo italiano Franco Berardi Bifo não ficou atrás: “Há alguém a quem esta lógica não agrada porque recorda o comunismo? Pois bem, se não existem palavras mais modernas, usaremos ainda aquela, de fato antiga, mas sempre muito bela”.54
Agindo com toda coerência, a esquerda radical está repropondo abertamente a nacionalização de companhias elétricas e de telecomunicações, de hospitais privados, hotéis etc., como declarou desenvoltamente Pablo Iglesias, líder do partido Podemos e vice-presidente do atual governo espanhol de coalizão, durante uma reunião de seu gabinete de crise.55
Mais grave ainda é o fato de propostas pertencentes até aqui a programas da esquerda alternativa – como a de um “salário universal de base” – serem retomadas hoje por representantes do establishment. Importa assinalar que o proposto salário universal não se limita a uma ajuda temporária aos trabalhadores desempregados por causa de uma crise econômica ou financeira, o que todas as pessoas sensatas consideram necessário, num arco que vai desde um analista do Acton Institute56 até o secretário da conferência episcopal espanhola.57 Nem corresponde à imagem imaginada por Milton Friedman, de dinheiro distribuído por helicóptero para resolver problemas temporários de liquidez na economia.58 Trata-se, na realidade, de um salário mínimo permanente distribuído a toda a população, cada um podendo escolher se quer ou não quer trabalhar, conforme suas aspirações individuais, o que supostamente garantiria sua total “emancipação”.
O salário universal era a ideia-farol do programa de Benoît Hamon, o malogrado candidato do PS francês à presidência. Ele aproveitou a epidemia, aliás, para relançar sua proposta, alegando que “o salário universal de existência é uma ferramenta incomparável de emancipação. […] Libertando cada um de uma dependência exclusiva ao salário que ganha no emprego, o salário universal dá a cada indivíduo a capacidade de negociação e de escolha. […] A emancipação social passa por esta prática individual da liberdade. […] A crise dará à luz um novo mundo”.59
Em uma carta aberta publicada no jornal londrino The Independent, nada menos que 500 acadêmicos e líderes políticos, principalmente do Reino Unido e dos Estados Unidos, pediram a implantação desse salário universal, afirmando que “sem uma intervenção governamental drástica” – para nós, um remédio pior que a doença (**) –, a economia cairá “numa profunda recessão e possivelmente numa segunda Grande Depressão”. Logo, “um salário de base incondicional deve jogar um papel central na resposta de emergência a esta crise”.60
(**) O “socialismo de guerra” preconizado por esses acadêmicos e líderes, pela criação de uma enorme massa de liquidez financeira criada ex nihilo para adquirir dívidas públicas e privadas, aumentando os déficits e dívidas públicas, mereceu a lúcida crítica do analista financeiro Maurizio Milano: “A evidência histórica nos ensina que as ‘emergências’ são o caldo de cultura ideal para que aumente a invasão dos Estados, trazendo sociedades desresponsabilizadas e frágeis, com detrimento da liberdade, da segurança e do bem-estar geral”.61
Ao unir-se a essa carta aberta, Beppe Grillo, o ex-cômico fundador do Movimento Cinco Estrelas na Itália, declarou a respeito do salário universal: “A emergência que estamos vivendo poderia favorecer uma mudança histórica, revolucionária, que foi sempre considerada superficialmente, por muitos, como uma loucura, mas que poderia mudar para melhor nosso futuro”.62

Um “mundo novo”: na lei… ou na marra!

Alguns impacientes querem precipitar essa mudança revolucionária pela via violenta. Em artigo no jornal L’Opiniono deputado Guillaume Larrivée, do partido Les Républicains (centro-direita, do ex-presidente Sarkozy), especula que na França “a brutalidade da deflagração econômica e financeira alimentaria uma revolta social, com base num terreno fértil de preocupações e reivindicações já muito vivas (como o demonstraram nos últimos dois anos os ‘coletes amarelos’ e a contestação à reforma das aposentadorias), reavivando as feridas da luta de classes e de gerações, assim como as fraturas territoriais do ‘arquipélago francês’, até acender os braseiros do motim”. E o parlamentar francês conclui, sublinhando em negrito: “Eu o escrevo sem exagero: a França estaria, então, em marcha rumo à guerra civil”.63
Essa previsão pessimista do deputado gaulês foi confirmada por um relatório do Serviço Central de Inteligência Territorial (o equivalente na França ao FBI), no qual se alerta sobre o risco de incêndio da contestação social no fim do lockdown: “O confinamento impede que o descontentamento popular se expresse, mas a cólera não diminui; e a gestão da crise, muito criticada, alimenta a contestação”, diz o relatório. Os agentes temem a criação de “comitês de luta” nos imóveis das periferias urbanas e o favorecimento da “transversalidade das lutas”, propiciado pelos setores da extrema esquerda.64
Na realidade os distúrbios já começaram: “Le Havre, Évreux, Bordeaux, Villiers-sur-Marne, Mantes-la-Jolie, Chanteloup-les-Vignes, Villeneuve-la-Garenne, La Courneuve, Trappes, Grigny… É a lista não exaustiva dos episódios de violência urbana registrados entre os dias 12 e 19 de abril” – informa Le Figaro“As emboscadas são metodicamente preparadas, com armazenamento de projéteis, lança-projéteis e barricadas para fazer o ‘burburinho’ nas redes sociais. Eles observam a reatividade da polícia e do pessoal mobilizado. O objetivo é claro: afirmar que é deles esse território, e que o controlam – explica ao jornal um veterano policial de um “setor sensível”. Com uma só certeza para a polícia: ao menor incidente denunciado como um “abuso policial”, roça-se no motim e se multiplicam nas redes sociais os chamados à represália, assegura o jornal parisiense.65
A situação poderá evoluir rapidamente de alguns primeiros protestos de violência controlável, como aqueles dos “coletes amarelos” do ano passado, a protestos massivos e incontroláveis, como os acontecidos em Santiago, Valparaíso e outras cidades chilenas, que forçaram o governo a ceder às pressões da esquerda e iniciar um processo que poderá resultar na adoção de uma constituição de estilo “bolivariano”. E trata-se de um país que, até pouco tempo atrás, se orgulhava de ter a maior renda per capita da América Latina.

Uma “janela de oportunidade” transitória que os articuladores do “mundo novo” não querem deixar passar

Se esse cenário se agravar, os distúrbios servirão de argumento para acelerar os programas de socialização da economia por via legal. Em todo caso, as três correntes acima – dos verdes, dos globalistas e da ultraesquerda – são unânimes em afirmar peremptoriamente que “nada voltará a ser como antes”.
De onde provém tanta segurança da parte de agentes de correntes ideológicas até agora eleitoralmente marginais? Talvez do fato de esperarem superar as divergências existentes entre elas, mas acima de tudo de que, para lançar-se numa aventura, contam com dois fatores que lhes abrem de par em par uma inesperada “janela de oportunidade”: o medo da população em face do avanço ou eventual retomada da pandemia; e o respaldo moral que o Papa Francisco vem dando às suas agendas.

O pânico levou à submissão voluntária da população ao confinamento imposto pelas autoridades

Contrariamente ao que tem acontecido no Brasil e em algumas regiões dos Estados Unidos, onde a população tem saído às ruas para protestar contra o confinamento, o que o pânico tem conseguido na Europa até o momento é uma atitude submissa das populações diante das severas restrições à liberdade de movimento impostas pelas autoridades.
Num país habitualmente rebelde como a França, 96% das pessoas consultadas aprovaram as medidas de confinamento ditadas pelo presidente Emmanuel Macron, no dia seguinte ao seu anúncio, e 85% lamentaram que não tivessem sido impostas antes! Isso se verificou apesar da perfeita consciência da população quanto aos sacrifícios financeiros que decorriam do confinamento.74 O mesmo aconteceu na Espanha, onde uma sondagem solicitada pelo jornal El País75 revelou que apenas 21,9% acham que “deve-se flexibilizar o confinamento para reativar o quanto antes a economia, mesmo que isso suponha uma maior propagação do coronavírus”; e 59,3% dos entrevistados sustentaram que “deve-se manter ao máximo o confinamento, mesmo que isso suponha uma maior deterioração econômica e mais desemprego”. Na opinião deles, um impacto na economia será negativo e duradouro em nível mundial (61,1%); para a Espanha (69,7%); e para o próprio lar dos consultados (31%).
Sob o título “Nos países ricos a saúde permanece a prioridade”, o jornal Le Figaro informa que, “segundo uma sondagem Kantar realizada entre os dias 9 e 13 de abril no Canada, França, Alemanha, Itália, Japão e Estados Unidos, 37% da população perdeu uma parte das rendas, e 16% as tiveram amputadas pela metade. Entretanto, uma ampla maioria dos sondados continua a aprovar as dispendiosas medidas adotadas para lutar contra o vírus”.76
Mais grave ainda, o pânico favorece a aceitação prévia, pela população, da chantagem que está sendo proposta para sair do confinamento: submeter-se ao controle estatal através de aplicativos nos telefones celulares, que indicará às pessoas se elas estiveram em contato com alguém contaminado pelo coronavírus.
Uma pesquisa realizada na França por uma equipe da Faculdade de Economia da Universidade de Oxford revelou que cerca de 80% das pessoas interrogadas (mil possuidores de celular) declararam que, sem nenhuma dúvida ou provavelmente, instalariam tal aplicativo se ele fosse disponibilizado. A maioria estaria até mesmo de acordo em que as companhias telefônicas instalassem automaticamente o aplicativo nos celulares de seus clientes (com a possibilidade de desinstalação), e 2/3 dos interrogados declararam que, provavelmente ou sem dúvida, manteriam o aplicativo instalado pelo fornecedor.
É tal a aprovação dessa chantagem (liberdade de movimentos c/ controle), que até 40% dos interrogados passariam a ter uma opinião mais favorável ao governo Macron se esse instrumento de vigilância estatal fosse colocado à disposição deles! Os pesquisadores informam que esses resultados são amplamente similares aos obtidos na Alemanha, Reino Unido e Itália.77

A “Síndrome de Estocolmo” em escala planetária. Uma infestação diabólica coletiva?

A velha estratégia do garrote e da cenoura está obtendo resultados que alguns meses atrás seriam inimagináveis, mudança esta resultante apenas do pânico induzido pela Covid-19, e pela sensação de segurança resultante das promessas dos governos de abrir as torneiras do financiamento público para garantir rendas aos particulares e a solvência das empresas. “O que se verifica, neste momento, é o fortalecimento do Estado como força protetora dos cidadãos”, sugere a revista Isto é no seu artigo já citado, que leva o expressivo título: “A nova ordem mundial”: “O Estado volta a ser a grande força protetora, a única capaz de criar um sistema robusto para dar segurança ao cidadão, garantindo a saúde, a educação e o incentivo à pesquisa científica”.78
A ingenuidade chega ao ponto de as pessoas aceitarem com apatia uma versão apresentada pelas autoridades comunistas da China, como sendo modelo de sucesso no controle de uma pandemia resultante de suas próprias atitudes irresponsáveis, quando não criminosas. Por exemplo, ninguém reagiu quando o boletim UN News, produzido pela própria ONU, noticiou em sua edição de 16 de março: “China mostra que o coronavírus Covid-19 pode ser detido”. E transcreve o que afirmou que o representante da OMS naquele país: “Esta lição de contenção é uma lição que outros países podem aprender e adaptar às suas próprias circunstâncias”.79 Ora, todo o mundo sabe que na China a população está submetida a políticas oficiais de controle social, por meio de programas de identificação facial e de cotação da população, levando a prêmios e castigos.
Como é possível entender que as massas do Ocidente, embriagadas até três meses atrás com os valores de emancipação, autonomia e individualismo, aceitem a perspectiva de um controle em estilo chinês de suas vidas, com a passividade de cordeiros rumo ao matadouro? Isto revela que elas foram vítimas de uma baldeação ideológica sem precedentes na História da humanidade. Sua reação natural deveria ser a do filósofo Conte-Sponville: “O confinamento é a maior restrição de liberdade que eu tenha vivido; e tenho pressa, como todo o mundo, de sair dele. Em longo prazo, nem se coloca a opção de sacrificar a liberdade à saúde. Prefiro pegar a Covid-19 num país livre, a escapar dele num Estado totalitário!”.80 Aquilo que os ecologistas radicais, os partidos verdes e os manipuladores de Greta Thunberg só conseguiram muito parcialmente (com base em projeções apocalípticas das consequências do propalado aquecimento global supostamente antropogênico), o pânico do coronavírus e as cantilenas protetoras dos governos, “em estado de guerra” contra a pandemia, obtiveram após menos de dois meses de confinamento da população. Essa situação “faz as pessoas experimentarem uma espécie de prisão domiciliar, ainda não vivida nas sociedades contemporâneas”, como bem disse a revista Isto é.81
Tratar-se-ia de uma versão planetária da Síndrome de Estocolmo, pela qual a vítima de um sequestro desenvolve uma relação de cumplicidade e forte vínculo afetivo com seu captor.82 Comprova-o a variação espetacular da popularidade dos dirigentes europeus, apesar de estarem arruinando as respectivas economias com as medidas imprudentes de confinamento: Kurz, Áustria (+33%), Conte, Itália (+27), Johnson, Reino Unido (+20%), Merkel, Alemanha (+11%), Macron, França (+11%).83

A presença de Satã no mundo moderno, publicado por Mons. Léon Cristiani em 1959. Para o autor, a China manifestava sintomas de possessão diabólica, enquanto a Rússia era vítima “apenas” de uma infestação preternatural, mas o Ocidente também se achava sob a influência do Maligno
Em face de um resultado tão fulgurante, profundo e universal obtido por essa manipulação psicológica das massas, um observador católico deve se perguntar se ela não veio acompanhada de uma infestação preternatural coletiva. Uma hipótese análoga foi levantada em relação ao comunismo chinês e russo, no livro A presença de Satã no mundo modernopublicado por Mons. Léon Cristiani em 1959. Para o autor, a China manifestava sintomas de possessão diabólica, enquanto a Rússia era vítima “apenas” de uma infestação preternatural, mas o Ocidente também se achava sob a influência do Maligno.84 Não será o incremento dessa influência um dos fatores da atual passividade da opinião mundial diante da perspectiva de uma ditadura, primeiro sanitária, depois ecológica e socialista, e finalmente ateia?

O papel das “palavras-talismã” e o método para exorcizá-las

Prossegue o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira afirmando que, uma vez conseguida essa unilateralidade no espírito do paciente, os agentes do processo devem escolher algumas “palavras-talismã” de sentido legítimo, mas ardilosamente manipuladas por eles para suscitar uma constelação de emoções, simpatias e fobias, fáceis de serem exploradas publicitariamente e passíveis de serem fortemente radicalizadas.
Eis algumas expressões assim manipuladas atualmente, dotadas dessa forte carga emocional, e repetidas até o cansaço pela mídia: “responsabilidade compartilhada”, “solidariedade global”, “respostas cooperativas”, “estratégia mundial”, “proteção inclusiva”, “salário universal”, “conversão ecológica”, “casa comum”, “pátria grande”, etc.
Presas pelo fascínio da “palavra-talismã”, as pessoas vão “aceitando sem mais, como ideais supremos e ardentemente professados, os significados sucessivamente mais radicais que ela vai assumindo”. O ilustre autor exemplifica com a palavra “diálogo”, amplamente instrumentalizada por setores do clero católico favoráveis a capitulações da Igreja diante dos erros do mundo moderno. Ontem o comunismo; hoje a ecologia radical, os planos de uma governança mundial inteiramente laica e o “outro mundo possível” da esquerda radical.
Terá sucesso a gigantesca operação de engenharia social e baldeação ideológica em curso? Devemos considerar que na base do processo está o binômio medo-simpatia. É impossível negar que o medo diante da propagação do SARS-Cov-2, aliado à simpatia pelas promessas de proteção sanitária e financeira do Estado, se encontram juntos em vastos setores da população. Isso é de molde a fornecer esperanças aos estrategistas da esquerda, de poder conduzir milhões de pessoas a aceitar um “mundo novo”, supostamente menos frenético e egoísta, e mais solidário e próximo da natureza. Mas, acima de tudo, mais controlado pelo Grande Irmão ecológico-socialista.
Mas essa vitória não é inelutável, e pode ser furada como um balão enquanto está em curso. Basta para isso “exorcizar” as palavras-talismã, explicitando analiticamente seus sentidos. Assim se perturba nas vítimas do processo a fruição emocional dos seus sentidos ilegítimos e a adesão das pessoas a eles: “Para ‘exorcizar’ a palavra-talismã e inutilizar seu efeito mágico, importa antes de tudo descobrir, na pluralidade dos sentidos que ela tem, o mito que nela se incuba”. Isto se faz comparando seus sentidos mais aplaudidos e irradiantes com seu sentido inocente e trivial, para verificar “qual o conteúdo recôndito que transparece nas suas aplicações míticas e radicais”. Quem souber explicitar e denunciar o mito, “proporcionará aos pacientes da baldeação ideológica inadvertida os meios para abrirem os olhos à ação que sobre eles se exerce, para se darem conta dos rumos aos quais ela conduz, e para se defenderem contra ela”.
Uma das maiores dificuldades com que se defrontarão os que quiserem empreender esse labor esclarecedor e salvador em âmbito católico, é que o Papa Francisco e o Vaticano estão servindo de companheiros-de-viagem dos promotores da baldeação ideológica em curso.

O papel do fator religioso no processo de baldeação ideológica rumo ao “mundo novo”

Na atual operação de baldeação ideológica, temos de um lado o pânico da Covid-19, e de outro o fator “simpatia”, impregnado da aspiração romântica de sair do stress e do individualismo do mundo moderno, para voltar a um mundo mais “respeitoso da natureza”, mais “aberto” e “solidário”, no qual os padrões de luxo “burguês” das sociedades industrializadas cedam lugar à simplicidade e à frugalidade das classes populares. Numa sociedade tão materialista e hedonista como a nossa, tal mudança seria muito transitória, caso fosse movida apenas pelo pânico, como acredita Jacques Attali no texto acima citado. Porém, sua resignação seria permanente e mais profunda se a mudança não fosse concebida apenas como uma fatalidade, à qual é preciso resignar-se, mas como um aperfeiçoamento espiritual.
Uma minoria da população – aqueles estratos da burguesia média e alta mais “modernos”, “p’ra frente”, que frequentam os salões da “esquerda caviar” – poderiam encontrar tal motivação nas religiões orientais, na prática da yoga, do vegetarianismo, etc. Mas a maioria da população necessita ouvir a voz de grandes líderes religiosos do mundo ocidental, majoritariamente católico, no qual predomina o Papa. E a voz dele, de acordo com o interesse dos líderes dessa baldeação, será tanto mais evocativa se ele se apresentar como um eco atualizado de São Francisco, o “Poverello de Assisi”. É este o jogo para o qual está infelizmente se prestando o Papa Francisco, com seus reiterados apelos em favor da ecologia integral, de um novo modelo de globalização e dos “movimentos populares” como fermento da sociedade futura.
[40] Ibid.

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