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sábado, 2 de maio de 2020

HERMENÊUTICA JURÍDICA






Por: Regilene Santos do Nascimento Adami, advogada.

O ser humano que vive em sociedade tem uma tendência natural a questionar o por quê não pode agir dessa ou daquela forma ou por quê deve agir desta ou daquel’outra, segundo as normas jurídicas que lhe são impostas.

Essas respostas a esses por quês não lhe são dadas pelo Direito positivo, antes sim pelos métodos e teorias que são aplicados por quem detém a competência para impor e direcionar o comportamento social a partir do que contido no ordenamento jurídico em vigor.

  A sociedade precisa saber e conhecer as regras de conduta que coercitivamente devem assumir no convívio social e aquele que tem por função impor a ordem também precisa conhecer quais os métodos, princípios e teorias contemporâneos que garantirão ao cidadão a segurança anímica de que determinada dicção jurisdicional fora proferida com efetiva imparcialidade, cujo escopo não tem outro norte nem direção que não seja o do restabelecimento da paz social.

Uma sociedade cujo Poder Judiciário não tiver técnica dialética para interpretar o Direito positivo a fim de àquela impô-lo coercitivamente jamais perceberá que a auto-composição e a auto-tutela não são a melhor forma de solucionar os impasses conflitivos que emergem no seu seio, e a história da humanidade assim revela que não o são.

Uma sociedade em constante e perene estado de beligerância está fadada ao seu também perene estado de subdesenvolvimento.

Essa foi uma realidade que, uma vez observada pelos laboradores do Direito, foi sendo paulatinamente alterada mediante a demonstração ao grupo social que um terceiro desinteressado deveria resolver os conflitos de interesses que emergissem no seu seio, antes do que “experimentaram” as “regras comportamentais” praticadas nos períodos pré-processuais (legis actiones, formulário, cognitio extraordinaria).

O Direito, portanto, analisa as ocorrências conflitivas sociais, suas causas e efeitos negativos, que comprometeram ou ainda comprometem a otimização do convívio dos componentes de um grupo social, que não prescinde do respeito, em princípio espontâneo, aos direitos subjetivos alheios, estrutura teorias, princípios e métodos que devem ser utilizados quando se dirime uma lide de sorte que, uma dicção jurisdicional seja mais que uma mera solução de um impasse intersubjetivo, seja ela um instrumento capaz de manter a sociedade organizada mediante uma didática educação extrínseca.

O Direito é que permite ao jurista aprimorar o conhecimento específico – apreendendo e processando intelectualmente o aprendizado – acerca do raciocínio dialético-jurídico que deve utilizar para, haurindo a evolução sistematizada sobre a qual se pautam as jurisprudências, que são fontes do Direito positivo, desempenhar com eficiência e eficácia a função social que é, afinal, o âmago e a finalidade do próprio Direito positivado.

Portanto, não basta que um profissional do Direito conheça os conteúdos das leis, materiais e processuais, e as aplique, à medida que a legitimidade de um ordenamento jurídico, e, conseqüentemente, a minimização das formações de lides, perspassa, necessariamente, pelo estudo e aprimoramento do conhecimento acerca não só do porque toda nação organizada, desenvolvida, ou não, não prescinde de um ordenamento jurídico impositivo, como também sobre qual o melhor procedimento deva ser adotado a fim de conscientizar-se cada cidadão sobre como agir, e não agir, de sorte que essa consciência espontânea, anímica, estratifique o mais solidamente o elo de convivência em prol do desenvolvimento de todos como unidade social.

Os métodos, princípios e teorias jurídicas que resultam desse constante estudo sobre como melhor aplicar o Direito positivo com vista a mais eficaz e eficientemente orientar a sociedade sobre como proceder (a fim de serem evitados os efeitos danosos que resultam dos desrespeitos aos direitos subjetivos alheios), não integram o Direito positivo, sendo, antes sim, o resultado de um processo cognitivo específico de natureza social, axiológica e de projeção comportamental, sem o qual a aplicação do Direito positivo ficaria à mercê de crenças ou imposições discriminadoras e autoritárias.

II. A imperatividade do Direito positivo

As diferentes culturas([1]) que conduzem à diversidade de civilizações têm um ponto de partida à análise: quais as necessidades essencialmente básicas a serem satisfeitas quando diante de um bem da vida.

O homem sempre buscou, e continua a buscar, satisfazer as carências que ele entende devam ser necessariamente supridas à própria sobrevivência e/ou desenvolvimento. Esse estado de necessidade o impulsiona à procura de bens, que Carnelutti denominou: “bens da vida”. Quando o homem encontra um bem da vida, lança-se sobre ele a fim de suprir a sua necessidade. Como não há bens da vida suficientes a todos os homens, vezes há que mais de um ser humano se coloca em posição favorável ao seu uso (do bem da vida)([2]), o que conduz ao raciocínio lógico que um ou alguns dele(s) deverá(ao) abrir mão da(s) sua(s) posição(ões) pessoal(is) em favor da(s) do(s) outro(s). Se tal não ocorre, tem-se o chamado conflito de interesses caracterizado por pretensão resistida, que é o conceito clássico de lide.

Há algum tempo, vê-se que quando o ser humano precisa reconhecer que a sua vontade individual deve se submeter à de outrem e/ou à do grupo social como um todo, sente ele dificuldade a tanto e, conseqüentemente, a abrir mão do seu próprio interesse.

Essa dificuldade natural do homem e seu inquietante espírito perquiridor se acoplam à sua também natural tendência a aceitar as ponderações daqueles a quem reputa sejam detentores de maior conhecimento e cultura que os dele próprio, razão pela qual, por força da respeitabilidade e confiança que outorga àqueles primeiros, se sujeita, anímica e volitivamente, às considerações emanadas desses outros homens que reputa e considera como integrante de uma elite([3]).

A unidade e a preservação do grupo social são diretamente proporcionais à eficiência e eficácia do exercício de Poder, que por sua vez, não é, e jamais será exercido por todos ao mesmo tempo, tendo em vista a notória diversidade de entendimentos éticos e morais que cada um assimila e pratica, o que revela a utopia de o Poder de uma Nação poder ser exercido segundo os entendimentos e conhecimentos pessoais de cada um, daí a milenar realidade de cada grupo social ter à sua frente um número limitado de pessoas que, exercendo o Poder Nacional, direcionam e conduzem as relações intersubjetivas, em prol do desenvolvimento do grupo como um todo.

Assim é que é a eficiência do Poder de uma sociedade que viabiliza sua coesão e manutenção como unidade social autônoma, formada por um grupo de pessoas que se congregam em prol de um mesmo objetivo, a partir da sua cultura, em determinado espaço territorial, podendo ser exercido (o poder) por várias formas: oligarquia, ditadura, socialismo, democracia, etc ...

Não interessa a esse estudo análise percuciente sobre as várias formas de exercício de poder, antes sim destacar que a cediça natureza gregária do ser humano revela duas nuanças: a natural capacidade de alguns ao comando e à natural disposição de outros à sua sujeição àqueles, combinação binária essa que é o que legitima o exercício do Poder Nacional por alguns, em prol da exata coesão e preservação do grupo como um todo, que assim consegue se impor como uma sociedade autônoma frente a outras.

O êxodo do antigo Egito, tal como narrada pela Bíblia, exemplifica os primórdios do ante afirmado: o povo, para atravessar o deserto, delegou a Moisés o poder de chefiá-los nessa jornada, de sorte que com a autorização que lhe foi delegada, Moisés determinava, àqueles que o seguiam, o que, como e quando fazer.

Nessa marcha em busca à terra prometida a grande maioria dos seguidores de Moisés a ele obedecia sem quaisquer questionamentos, porque reconheciam naquele a necessária autoridade capaz de conduzí-los ao êxito e atingirem o desiderato almejado (definitiva libertação do cativeiro no qual viviam no Egito e sua instalação, como grupo social homogêneo, em outro espaço territorial para viverem segundo a cultura deles).

Essa realidade histórica revela, pois, que a existência de normas de conduta previamente estabelecidas e edificadas por um número delimitado e limitado de pessoas, a fim de serem cumpridas por todos os que a elas (normas de conduta) devem se sujeitar, é naturalmente entendida, apreendida e praticada por todos que integram o grupo social, porquanto sabem, reconhecem e aceitam que a observância dessas normas comportamentais é premente à organização e desenvolvimento de toda e qualquer sociedade que se pretenda manter coesa a partir da sua própria cultura.

Em assim sendo, o prévio estabelecimento de normas comportamentais de conduta, editadas e publicadas, em vigor durante determinados lapso temporal e território, encerra o conteúdo do que se denomina DIREITO POSITIVO.

Direito positivo, portanto, é o conjunto de normas de conduta que vigora em determinados espaços de tempo e territorial, que visa organizar o convívio dos que integram o grupo social para o qual se destina, definidora dos limites dos direitos subjetivos de cada um, as sanções que serão aplicadas se forem descumpridas, conferindo segurança às relações intersubjetivas que no seu seio se estabeleçam, a fim de serem preservadas a unidade e a autonomia daqueles assim congregados.

Como são padrões de comportamento que devem ser necessariamente observados pelo ser humano, muitas dessas normas que integram o direito positivo não podem deixar de ser cumpridas, razão pela qual não podem ficar à mercê do seu destinatário à medida que, para o desenvolvimento de um Povo, de uma Nação, existem regras de conduta básicas que não podem de forma alguma deixar de ser cumpridas, sob pena de desestruturação do grupo como um todo.

A imperatividade que emana do Direito positivo há que ser efetivamente garantida, razão pela qual, essas normas de padrão de comportamento essenciais à unidade, autonomia e ao desenvolvimento nacional, são tuteladas mediante a conscientização de todos que os seus descumprimentos poderão gerar sanções extrínsicas à vontade do infrator, que serão aplicadas pelo limite do Poder Nacional que se incumbe de aplicar o Direito.

Em suma: a partir da identidade de princípios, éticos e morais, um certo número de seres humanos se agrega para, unidos, satisfazerem, individual e coletivamente, as necessidades que julgam lhes são prementes, não só à sobrevivência de cada indivíduo como também à preservação da respectiva autonomia do grupo social, como entidade soberana, para o que necessária é a existência de um grupo de elite que tenha capacidade cultural suficiente para direcionar o caminho a ser trilhado por todos, grupo esse a quem incumbe fixar as normas de conduta comezinhas e basilares à manutenção e preservação da coesão social. Esse grupo de elite, portanto, não só edita essas normas comportamentais como também as fiscaliza e impõem, sem o que o grupo social sucumbirá em seu desiderato finalístico: (im)posição de autonomia, independência e poder na defesa da própria cultura, perante outros grupos sociais.                      

III. A norma jurídica

O ser humano, pela sua própria limitação e natureza, tem a necessidade de agregar-se a outros a fim de, perquirindo e desenvolvendo métodos que o levem a encontrar um quantitativo suficiente de bens da vida, poderem efetivamente utilizá-los, não só por questão de sobrevivência, mas também para afastar toda e qualquer potencialidade de ser subjugado por outros grupos sociais.

Essa congregação humana, teoricamente, se dá a partir da identificação de princípios morais e éticos que cada um traz dentro de si, o que resulta na existência e formação de várias comunidades e grupos sociais, distintos entre si, cuja manutenção e subsistência, como unidades autônomas e independentes, imprescindem de lideranças capazes e competentes, detentoras de suficientes conhecimentos específicos que conduzam e viabilizem o fortalecimento do elo primário que une todos que integram o mesmo grupo, na busca da, repita-se, sobrevivência e crescimentos: cultural, econômico e social.

Assim é que, esses exatos princípios morais e éticos, apreendidos e cravados na mente de cada um que integra um grupo social, são a base que revelam e norteiam quais os comportamentos que cada um deve assumir e manter a fim de garantir a unidade do grupo social.

Não obstante isso, vezes há que o homem não assume esses padrões de conduta inatos à ética e à moral que originaram e sustentam determinado grupo social, hipóteses essas em que aquele que assim age é tido e visto pelos demais pares como um perigo, um risco ao atingimento da meta coletiva: preservação e manutenção da coesão do grupo como entidade autônoma, independente e soberana frente às demais comunidades sociais.

Quando a regra de conduta ético-moral descumprida resulta na ocorrência de dano, única e exclusivamente, ao convívio de um indivíduo com os demais que integram o grupo social, certo é que não há que se cogitar de perigo à preservação da unidade, o que só tem a iminência de ocorrer quando se descumpre uma regra de conduta que resulta em dano aos demais integrantes do grupo.

Portanto, mister ter em mente que nem sempre o descumprimento de uma ou mais das regras éticas e morais, que são paulatinamente fincadas no âmago de cada homem pela educação que consegue sorver ao longo da sua existência, atrai o risco à fragilização da unidade social perante terceiros, devendo se ter em vista, sempre, quem sofrerá os efeitos danosos e prejudiciais face a não observância do preceito.

Então, quando a violação a uma regra de conduta ético-moral resultar em “prejuízo” meramente anímico ao “infrator”, o máximo que acontecerá será a sua marginalização  no sentido de ser posto à margem do grupo social, por ela rejeitado, por não concordar nem aceitar o desvio da conduta moral e ética tal como por entendida pela coletividade deva ser a padrão.

Essa colocação à margem da sociedade, imposta contra aquele que foge ao cumprimento de alguns condicionamentos morais e éticos, que vigem em determinado espaço de tempo e lugar, consecta em uma de duas: ou o “infrator”, se sentindo envergonhado, restabelece a ordem tal como lhe imposta pelos demais pares e volta a agir segundo a vontade do grupo, ou assim não o faz e assume a diferença de pensamento e conduta, mesmo diante do isolamento no qual seja lançado.

Tem-se, portanto, dois grupos de regras de conduta basilares às interação e integração sociais: aquelas que não comprometem a segurança do elo da sociedade como comunidade autônoma e independente, e, aquelas que assim a instabiliza e coloca em risco.

Dentro deste contexto, norma jurídica é todo preceito comportamental que necessária e obrigatoriamente deve ser observado, cumprido e seguido por todos os que integram determinado grupo social que detenha autonomia e independência, e assim continuar sendo a si preservado e garantido, vez que, a não ser coercitivamente cumprida, colocar-se-á o grupo social sob o risco da sua desagregação, razão pela qual a elas (normas jurídicas) são atreladas as sanções/punições que serão suportadas por quem as infringir, impostas pelo grupo social, representado por aqueles que assim são investidos de Poder para tanto.

Insta-se a atenção do leitor para o fato de que a investidura no Poder Nacional, que é o que comanda toda e qualquer Nação, é circunstância posterior à adoção e/ou sujeição do grupo à forma de governo que antes foi por ele (grupo social) adotada e/ou aceita, de sorte que toda sociedade, todo grupo social tem uma ou mais pessoas que lhes direciona o comportamento com vistas à preservação de todos.

Portanto, o Direito dito positivo é integrado tanto pelas normas jurídicas que são editadas por quem a sociedade outorga Poder para tanto, quanto pelas meramente ético-morais – que são desprovidas de punições extrínsecas que devam ser suportadas obrigatoriamente por quem as infringir –, mas que dessas últimas se distinguem face à força imperativa mandamental cogente que detém, e que por isso mesmo só quando revogadas, expressa ou tacitamente, perdem a obrigatoriedade de seus cumprimentos, à medida que prescrevem as normas de conduta que a cultura histórica elevou à qualidade de essencial tanto ao desenvolvimento e crescimento nacionais quanto ao aprimoramento dos métodos que com segurança garantem a preservação da unidade, autonomia e independência da Nação.

IV. Interpretação da norma jurídica



“São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.” (artigo 2º da Constituição Federal de 1988)

Já vimos que o exercício de Poder é essencial à preservação e manutenção da unidade de determinado grupo social, sendo a forma de expressão da vontade de cada um daqueles que integram determinada sociedade, seja ela já organizada e desenvolvida seja aquela ainda em estado de desenvolvimento.

O Brasil adotou o sistema da tripartição do Poder Nacional, o que equivale dizer que a preponderância das atividades: legiferante, administrativa e decisória não podem ser exercidas por um mesmo grupo de representantes do Povo.

Assim é que enquanto o Poder Legislativo deve se ocupar, preponderantemente, com os métodos legítimos([4]) à fixação das normas de conduta que coercitivamente devam ser observadas por todos aqueles que integram o grupo social brasileiro, o Poder Judiciário deve se ater a aplicar a vontade externada na norma jurídica, a partir do juízo axiológico hipotético nela inscrito, tal como editado por aquele primeiro (o Poder Legislativo).

Vezes há que o Poder Legislativo olvida essa sinérgica tríade: fato – valor – norma, quando, então, edita normas jurídicas desprovidas de legitimidade, que, conseqüentemente, não são espontaneamente observadas e cumpridas pelo grupo social, ou pelo menos pela sua grande maioria.

Naquela primeira hipótese, quando o Legislativo edita normas legítimas, o magistrado há que interpretar a norma incidente ao caso concreto não a partir do que ele, julgador, entende, pessoalmente, seja justo, antes sim a partir do que a sociedade assim o entende, porquanto o conteúdo de justiça já lhe é imanente. Equivale dizer: nessas hipóteses, não é permitido que o Poder Judiciário diga o que ele, grupo de magistrados, entende seja justo, porque se assim o fosse estariam eles impondo juízos axiológicos pessoais ao invés de restabelecer os juízos de valor tais como entendidos pela própria sociedade como comportamentos prementes à mantença da unidade dela, sociedade.

Assim é que, sendo o Brasil é um Estado Democrático de Direito, a vontade comportamental, legitimamente, inscrita em uma norma jurídica há de ser observada e cumprida POR TODOS, inclusive por aqueles que pessoal e individualmente não entendam que aquele padrão de conduta seja, realmente e de fato, essencial ao convívio e progresso cultural e econômico da nação.

Ora, se assim o é e deve ser, seria paradoxal pensar-se a possibilidade de aquele que detém por competência funcional o dever de aplicar o ordenamento jurídico para preservar a sua validação, tal como é o Poder Judiciário, não estivesse, ele próprio, atrelado e obrigado a observar o exato conteúdo volitivo contido na norma jurídica incidente ao caso concreto, mesmo que com ele (conteúdo volitivo da norma) não concorde pessoalmente.

Logo, o conceito de justiça não integra a atividade judicante. O conceito, extensão e significado de justiça é imanente da atividade legiferante, daí dizer-se que um juiz ao interpretar uma norma jurídica não faz nem entrega justiça, pois, que deve se ater a restabelecer aquela que a sociedade assim entende como tal, a fim de recompor, com eficiência e eficácia, a ordem e a segurança do e no convívio social.

Um magistrado, portanto, no exercício da atividade judicante deve deter conhecimentos holísticos suficientes que lhe permitam entender e apreender, com a maior extensão possível, o fato social conflitivo a si apresentado à dação de uma solução, de sorte que, captando e compreendendo o mais exato possível conteúdo da lide, possa entender o significado de justiça que o grupo social atrelou à norma jurídica aplicável e não aquela que ele, magistrado, entende deva ser atendida pelos litigantes. Sem uma escorreita apreensão e compreensão dos fatos sociais o magistrado sequer terá conseguido captar e apreender o conteúdo de justiça e a razão de ser de determinada norma jurídica.

Assim é que o Estado-Juiz, no exercício da função jurisdicional, não pode, não deve e não “faz justiça filosófica”, porque tal revelaria parcialidade no e do julgamento imposto às partes, à medida que resultaria de um entendimento anímico e pessoal do julgador. O Poder Judiciário ao solver um conflito de interesses resistido deve restabelecer o comportamento social que a sociedade entende seja a que deva ser assumida por todos, tal como por si (sociedade) valorada na norma jurídica (editada pelo Legislativo), restabelecimento axiológico esse que não prescinde do processo de subsunção do exato conteúdo do juízo hipotético ínsito na norma geral e abstrata, concretizando-a as partes. Só assim é se restabelece, com eficiência, técnica e eficácia, os direitos subjetivos envolvidos com a segurança jurídica necessária à submissão do jurisdicionado ao comando judicial a si decretado.

E na hipótese de um julgador se deparar com uma norma ilegítima, ou seja, editada a despeito da tríade: fato-valor-norma?

Mesmo assim não poderá ele, magistrado, exercer a função legiferante porquanto vedada é a usurpação de poderes. No entanto, em hipóteses como essas o magistrado poderá solver a lide mediante a concatenação das teorias e princípios basilares que coordenam o sistema e a ordem jurídica de uma nação, e assim, aplacar os aviltamentos com os quais as partes foram tratadas pelo legislador ordinário, que por isso mesmo, lhes tendo gerado silenciosos sentimentos negativos, resultantes dessa violência legiferante contrária ao senso natural de conduta, são a exata causa do efeito: descumprimento da norma jurídica, em tese, legalmente em vigor.

Equivale dizer, quando a lide envolve a aplicação de um juízo hipotético normativo que, in tese, deva ser aplicável como padrão de conduta coercitiva, mas que não foi ele (juízo hipotético da norma) erigido a partir da vontade efetiva da sociedade, o magistrado poderá, mediante processo hermenêutico sistemático, ou se a tanto instado([5]), declarar incidentalmente a inconstitucionalidade da norma ilegítima, a partir da interpretação e aplicação do disposto no parágrafo único do artigo 1º da hodierna Constituição Federal([6]) com apoio e invocação dos objetivos nacionais permanentes brasileiros, inscritos no artigo 3º desse mesmo ante citado diploma legal, ou deverá ele, aplicar a norma jurídica que não obstante não legítima integra o patrimônio normativo LEGAL e em vigor.

Um juiz é obrigado a decidir um conflito de interesses a partir do balizamento fático a ele apresentado pelas próprias partes litigantes, sob pena de emitir juízo jurisdicional viciado porque ultra, citra ou extra petita. Em assim sendo, não podendo ele emitir, quando no exercício da tutela jurisdicional, juízo axiológico pessoal, se os próprios jurisdicionados não questionarem a ilegitimidade que entendem emanar da norma jurídica que em tese deva incidir ao caso concreto, isso equivalerá dizer que elas próprias, partes, não discordam do conteúdo axiológico nela inscrito, quando o magistrado, então, deverá proceder à compreensão da extensão da lide a partir desse exato conteúdo normativo, mesmo que o entenda ilegítimo, mesmo que assim o saiba.

Diante dessa técnica procedimental não prescindível à segurança das relações intersubjetivas quando discutidas em sede judicial foi que o legislador constituinte de 1988 declarou ser o advogado indispensável à administração da justiça (artigo 133 da CF/88), porque, como prático da ciência do Direito e conhecedor das teorias e princípios que o informam, tanto quanto o julgador, deverá ele, advogado, na defesa do cliente, argüir a inconstitucionalidade da norma que in tese deva ser aplicada pelo juiz, de sorte que se lhe possa retirar a imperatividade que lhe é imanente a partir do momento no qual é editada e publicada, e deixar de ser imposta coercitivamente aos litigantes.

O fato é que o julgador, no exercício da função jurisdicional, interpreta o Direito positivo a fim de restabelecer a ordem legal vigente, editada nos termos e consoante a vontade da sociedade, sendo-lhe vedado restabelecer “justiça”, segundo seu próprio entendimento e convicção.

V. Direito alternativo

  Coordenadas que devem ser as ponderações apresentadas nos tópicos acima já discorridos, tem-se certo que a história da humanidade revela que a evolução do desenvolvimento e crescimento de uma Nação na condição de entidade social una, autônoma, independente e congregada de forma organizada, imprescindem da otimização da forma de exercício, eficácia e eficiência do Poder imposto aos integrantes do grupo pela elite que edita as normas comportamentais que devem ser seguidas por todos os que o integram (grupo social).

A história também revela que a tripartição desse Poder Nacional ainda é hoje entendida como a melhor forma ao seu exercício (do Poder Nacional).

Em assim sendo, tanto quanto se exige que os cidadãos – administrados e submetidos ao comando daqueles que exercem o Poder –, devem observar e cumprir fielmente os conteúdos das normas imperativas de conduta qualificadas como jurídicas, no Brasil, que se apresenta ao mundo como um Estado Democrático de Direito – o que equivale dizer que as normas jurídicas que edita devem ser por ele mesmo, Estado, observadas e cumpridas – aqueles que integram as três medidas de soberania nacional: Executivo, Legislativo e Judiciário, devem, no mínimo, dar o exemplo e cumprir com fidelidade, também eles, os exatos conteúdos dos preceitos de conduta que informam e delimitam as extensões de cada uma das suas preponderantes competências funcionais, caso contrário, a preservação e manutenção do sistema jurídico e, consequentemente do político, tais como postos na Constituição Federal em vigor, serão transformadas em indubitáveis falácias em desfavor, obviamente, do crescimento e desenvolvimento desta Nação.

Ao Poder Judiciário não é dada competência de editar normas gerais e abstratas a serem observadas e cumpridas pela sociedade como um todo.

Ao Poder Judiciário compete interpretar o ordenamento jurídico vigente com vistas a dirimir os conflitos de interesses que lhes sejam submetidos ao crivo hermenêutico.

O Poder Judiciário quando instado a se pronunciar deve se limitar a concretizar e individualizar a(s) norma(s) geral(is) e abstrata(s) incidente(s) ao caso concreto, ou seja, utilizando os métodos específicos e inerentes à hermenêutica, primeiro apreender as circunstâncias que conformam o conflito de interesses, apreensão essa que imprescinde detenha o magistrado conhecimento específico suficiente acerca do próprio objeto alvo do e inscrito na norma jurídica como juízo hipotético, sem o que partirá ele, por força dessa sua própria precariedade cognitiva, para a criação de normas comportamentais que não estão inseridas no Direito positivo usurpando a competência do Poder Legislativo.

Diante de um contexto fático concreto e específico, um magistrado não pode deixar de aplicar a norma jurídica positivada, in tese de incidência, sob o argumento de a mesma não dever ser aplicada naquele caso concreto “por isso ou por aquilo”, mas esse “isso ou aquilo” não estar previsto em norma jurídica alguma.

O princípio do livre convencimento do juízo não tem a extensão que alguns magistrados, sponte sue, lhe têm dado para justificar a não aplicação do direito positivo e, concomitantemente, a “edição” de uma nova regra de conduta, ao que intitulam de direito alternativo.

Alternativo é o que se pode escolher de acordo com a conveniência de quem escolhe, o que, portanto, por si só conduz à mais completa violação aos princípios, teorias e métodos legalmente jurídicos, à medida que se a um juiz fosse dado o direito de escolher, segundo a sua própria conveniência anímica, se aplica ou não uma norma jurídica, porque não autorizar-se os próprios envolvidos em uma contenda assumirem essa posição ?

Não se pode olvidar que a justiça que envolve a atividade jurisdicional não é nem a filosófica, nem a anímica, nem a pessoal, nem a individual do julgador, antes sim a que está contida na norma jurídica, abstrata e geral que por ele deve ser aplicada, razão pela qual o atual culto ao exercício de um direito alternativo, ao “transferir” ao magistrado, como fenômeno meramente fático, um direito funcional de legislar em matéria que a lei não lhe autoriza a tanto, se revela totalmente avesso ao conceito do que seja Estado Democrático de Direito, e, negando validade e vigência aos comandos normativos próprios à atividade judicante, que devem ser cogentemente observados e cumpridos pelos magistrados, não só instabilizam as relações jurídico-materiais, a ordem e organização social tal como posta e apresentada pelos outros dois Poderes Nacionais, como também fragiliza a autonomia e independência da Nação como um todo, colocando-a sob graves riscos à própria manutenção e preservação como entidade social soberana, mormente frente a terceiros.

Se é certo que pelo exercício de atividade intelectual os homens aprendem com os fenômenos históricos ocorridos no passado, para corrigindo no presente aqueles eventuais erros humanos cometidos no pretérito, viabilizar o aprimoramento das relações intersubjetivas no futuro, mister é essa apreensão e compreensão, por todos aqueles que exercem uma atividade jurídica.

Insta ainda destacar que, se possível fosse a emissão de uma decisão hermenêutica sem a correlata fundamentação pautada em uma ou mais normas jurídicas integrantes do ordenamento jurídico vigente à data da ocorrência dos fatos litigiosos, qual a razão, qual a finalidade, qual o sentido de o legislador prever a qualificação da parte como litigante de má-fé, e sua condenação por perdas e danos, quando instaurasse uma instância para obter pretensão ilegal?

Ora, se a própria parte, se o cidadão, se o jurisdicionado não pode, por expressa vedação legal, requerer a condenação de outrem quando a sua pretensão não tiver respaldo no ordenamento jurídico, por qual razão se pode atrelar legalidade e conferir autorização ao magistrado a fixar condenação quando a pretensão deduzida pelo Autor não tem expresso assento legal, nem por construção sistemática e axiológica pautada no cotejo entre normas jurídicas outras que possam ser acondicionadas para o atendimento da regra constitucional ínsita no artigo 93, IX da Constituição Federal, ou seja, a de que toda decisão jurisdicional deve ser devidamente fundamentada ?

Nem se olvide dizer que a expressão “fundamentada” significa que basta ao magistrado justificar seu entendimento porque o inciso I do artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional é claro ao estabelecer como dever do magistrado o de “cumprir e fazer cumprir AS DISPOSIÇÕES LEGAIS”, donde se tem que se disposição legal não há, estará o magistrado violando o primeiro dos deveres básicos que lhe é imposto POR LEI EXPRESSA.

Seja por qual ângulo o for o “moderno direito alternativo” redunda na sinalização à sociedade que também ela está autorizada a agir de forma contrária aos mandamentos normativos inscritos nas normas jurídicas, acaso se permita que os próprios magistrados, que detêm a competência funcional de zelar, preservar e manter a ordem jurídica nacional, ao invés de assim agir, tal como o determina a regra cogente inscrita no inciso I do artigo 35 da LOMAN, se autorizem surpreender os jurisdicionados mediante fixações de decisões cujos fundamentos não são encontráveis no ordenamento jurídico incidente, que é imposto à sociedade como o norte a ser seguido por todos e para o bem de todos.

O efeito negativo resultante dessa prática é o de que esse “direito alternativo” contribuirá para o incremento, cada vez mais célere, da desordem social, vez que projeta comportamento de sentido diametralmente oposto à organização comportamental do grupo social, tal como erigido por quem ele, grupo social, outorgou poderes à fixação de normas comportamentais, padrões de conduta, que não é outro que não seja o Poder Legislativo, por vezes o Executivo, esse último, assim mesmo, dentro dos parâmetros constitucionalmente autorizados a tanto.

VI. Do uso alternativo do Direito. O magistrado e o ideal de justiça. A capacidade subjetiva do julgador

Nuança sutilmente diferenciada é a não aplicação de determinado dispositivo legal específico, que esteja em vigor, mas mediante aplicações de outros comandos jurídicos igualmente vigentes, como decorrência do processo hermenêutico sistêmico, histórico, teleológico, examinando-se o ordenamento jurídico como um todo, dirimindo-se a contenda pela interpretação de outras normas jurídicas, cuja aplicação sistêmica, em conjunto, validam a decisão que neste caso é legal, por conter a vontade antes já externada pelo legislador.

O julgador não pode ter um ideal de justiça dele, senão exercer o ideal de justiça que emana da sociedade, que não está externado sob outra forma que não o seja no conteúdo das normas jurídicas impostas com força imperativa, providas de sanções nos casos dos seus descumprimentos POR QUALQUER UM DAQUELES QUE INTEGRAM A SOCIEDADE.

Um magistrado, ao invocar o argumento de estar praticando o “ideal de justiça”, não pode confundir aquele que é seu e/ou de um pequeno grupo que integra a sociedade como um todo, com o ideal de justiça que é o desejado, perseguido e imposto por todos nas normas jurídicas que integram o Direito Positivo.

O “ideal de justiça”, portanto, há de ser entendido, perseguido e praticado a partir da realização da vontade do grupo social tal como imposta em determinado momento pelos três Poderes Nacionais e, portanto, deve ser visto (o ideal de justiça) sob o ângulo da sua unidade, visão essa que será obnubilada se o magistrado não levar em consideração que o Poder Nacional é o resultado da soma e eficiência dos seus escorreitos exercícios, dentro dos limites das respectivas atribuições preponderantes, por cada um dos grupos de elite (Executivo, Legislativo e Judiciário) a quem o Povo entrega o poder decisório sobre a melhor conduta a ser adotada por cada um em benefício de todos.

Em assim sendo, um “ideal de justiça” não pode ser entendido e praticado nem sob o único aspecto visionário do julgador, nem de forma divorciada da efetiva realidade social (na qual também se inserem os atos e decisões exarados pelos outros dois poderes nacionais: Legislativo e Executivo) sobre a qual o magistrado é instado a emitir juízo axiológico, realidade essa que obrigatoriamente deve ser subsumida ao e cotejada com o ordenamento jurídico vigente, porque é a partir dele que a dicção jurisdicional se revestirá dos preciosos corolários ao seu cumprimento pela parte sucumbente: a garantia e a segurança que a todo e qualquer jurisdicionado devem ser dadas de que as concreção e individualização do conteúdo abstrato e geral das normas aplicadas observaram os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência, tal como o exige o artigo 37, caput, da CF/88, e assim ser produzido o efeito que justifica a exigibilidade de uma lide dever ser solvida (não obstante exceções que, no entanto, assim mesmo estão expressamente previstas e autorizadas pela própria lei), por um terceiro desinteressado que no Brasil ainda é monopólio preponderante do próprio Estado.

O Poder Judiciário, pois, há de ser composto por homens detentores não só de capacidade intelectual técnica, que se desenvolve a partir dos conhecimentos específicos prelecionados tanto pelo Direito quanto pelos conteúdos das próprias leis que regulam os comportamentos de todos que integram a sociedade, mas também em saber e conseguir separar o que é convencimento anímico seu daquele que deve firmar na dicção jurisdicional que vier a proferir que, por ser imperativa, há que revelar ao sucumbente, objetiva e precisamente, que o conteúdo da condenação contra si imposta é o reflexo da vontade do grupo social NACIONAL a partir do que ela, sociedade entende ser justo.

Para poder destacar o que a sociedade entende como sendo o justo, o magistrado deve procurar se cercar do máximo de certeza possível acerca da efetiva ocorrência, ou não, dos fatos que compõem a lide a si apresentada à solução. Essa certeza só lhe será dada pelas provas que forem carreadas aos autos, que por sua vez, devem ser produzidas pela parte que alegar o fato (constitutivo, modificativo, impeditivo ou extintivo do direito subjetivo pretendido).

Se a parte, a quem a lei impõe o ônus de provar, não apresenta as provas cabíveis no momento e sob a forma legalmente estabelecida para tanto, o magistrado não poderá formar seu convencimento levando em consideração um fato não provado.

Situação diversa é a possibilidade de o magistrado, na busca da verdade real, a fim de melhor detectar qual a justiça que a sociedade atrelou ao fato sub judice, e assim bem aplicá-la, determinar de ofício a produção de determinada prova, hipótese essa na qual o juiz não está agindo com parcialidade e/ou pessoalidade, “produzindo” a prova que deva assim sê-lo pela parte que alega fato em seu favor, senão estar melhor se esclarecendo sobre fatos não satisfatoriamente provados.

Isso assim o é porque não seria lógico nem sequer razoável e/ou admissível que um juiz diante de uma prova sobre a qual lhe pairasse, sobre si, julgador, suspeita de fraude, por exemplo, tivesse que negar-lhe valia sem a certeza da existência do vício, nem dar-lhe valia quando sobre ela tem dúvidas quanto a própria (i)licitude.

Vê-se, portanto, que o legislador teve e tem a constante preocupação de ajustar as normas jurídicas que validam uma relação jurídico-processual de forma a que o magistrado interprete o direito positivo incidente ao caso concreto com a imparcialidade e objetividade que a sociedade lhe impõe, razão pela qual, em face do princípio do livre convencimento do juízo, certo é que o que sociedade exige é que o julgador se convença da tese devidamente comprovada, seja por uma seja por outra das partes litigantes e não que ele, fugindo dos limites da lide e das provas que tenham sido carreadas aos autos, entregue uma dicção jurisdicional ao invés de entregar A tutela jurisdicional devida.

Assim é que o Direito positivo, por ser a base essencial à deliberação impositiva comportamental a ser adotada por todos os que integram determinado grupo social, a fim de ser viabilizado o seu desenvolvimento, crescimento e preservação como unidade autônoma e independente, não pode ser interpretado e aplicado como se resultado de mera crença o fosse, porque crenças, praticadas por mera fé (plena de conteúdo meramente subjetivo e anímico) não induzem à busca do aprimoramento das explicações sobre as ocorrências naturais e sociais que são constantemente perseguidas pelo ser humano.

Crenças são limitações às capacidades intelectuais que justificam e conduzem ao autoritarismo daqueles que, detendo consciência acerca da própria insegurança intelectual, impulsionam o Poder mediante a imposição da força.

Só diante da aquisição de efetivos conhecimentos técnicos e específicos, significando apreensão e compreensão dos nexos causais dos fenômenos, principalmente os sociais, é que se tem a coordenação e o comando de uma sociedade pelo exercício legítimo e eficiente do Poder, condutor ao desenvolvimento paulatino da autonomia e independência do todo, por intermédio da capacitação de cada um que o integra.

Se assim o é, as normas jurídicas que integram o ordenamento jurídico de uma sociedade em determinado lapso temporal, não podem ser postergadas em momento algum sob circunstância alguma, pois que toda a justiça que a sociedade (para quem são editadas essas normas) clama deve ser declarada pelo magistrado tal como contida no próprio ordenamento jurídico.

Se a norma geral e abstrata de incidência, a ser aplicada ao caso concreto, estiver defasada historicamente, somente a interpretação sistêmica poderá ser praticada pelo julgador, até que o Poder Legislativo a retire do ordenamento jurídico em vigor, não podendo o magistrado, jamais, usurpar competência constitucional e erigir uma “norma específica”, nem por invocação de se estar concedendo “justiça”, porque a que não emana nem decorre do próprio espírito da norma jurídica objetiva, não é nem será justiça social.



VII. Conclusão

As regras normativas que integram uma Constituição Federal contêm os princípios básicos que revelam o juízo ético e moral do grupo social ao qual se destinam.

Nenhum diploma legal de ordem infraconstitucional pode restringir ou negar validade e vigência às garantias fundamentais inseridas pelo legislador constituinte no texto constitucional.

Todas essas normas jurídicas, entendidas como prementes à preservação e manutenção da unidade do grupo social como comunidade autônoma e independente, são erigidas por quem o próprio grupo social outorga poder para tanto, que assim as erigem porque convencidos de serem essas normas padrões de conduta que viabilizarão o alcance dos objetivos nacional permanentes, que no Brasil estão capituladas no artigo 3º da Carta Magna.

A Nação brasileira, diante da adoção do sistema da tripartição dos poderes, impõe a todos, inclusive aos que exercem o Poder Nacional, o respeito e a observância dos atos públicos que se revistam de força mandamental cogente, donde se tem que ao interpretar o ordenamento jurídico, deve o magistrado se ater às regras de conduta que são impostas aos denominados sujeitos de um processo (autor, juiz e réu), sem o que a função jurisdicional não atingirá a sua finalidade: (r)estabelecimento da ordem e da paz do grupo como um todo mediante a garantia de respeito à segurança das relações intersubjetivas que se travarem no âmbito da sociedade.

Sublinhe-se que essa condição sine qua non à segurança das relações intersubjetivas que se travem no seio da comunidade brasileira, não encerra nenhuma imposição autoritária pelos outros dois poderes nacionais ao Judiciário, ou qualquer engessamento da dinâmica do Direito, cuja decalagem legal muitas vezes conduz a uma primeira impressão de não ter ele, juiz, regra jurídica sobre a qual se pautar porque o momento histórico da sua aplicação há muito dista daquele no qual foi a norma legal editada, à medida que, repita-se, a sociedade brasileira não tem sua vontade pura e simplesmente tutelada pelo Judiciário porque, inclusive antes dessa tutela em torno de determinado(s) direito(s) subjetivo(s), tem sua vontade publicada pelo Legislativo, que por isso mesmo, devendo estar atento e ser sensível quando instado a rever determinada norma jurídica, é quem detém a preponderante competência legal à edição das normas de conduta cogentes que devem ser observadas pela comunidade nacional.

Portanto, dentro dessa realidade, entende-se impossível a prática de um “direito alternativo”, que não se confunde com o “uso alternativo do Direito”, porque nessa segunda hipótese o magistrado não estará “editando” norma jurídica nova, em um indevido exercício da função que compete ao Legislativo, pois que estará aplicando um conjunto de tantas outras que, em vigor, autorizam o afastamento de um dispositivo legal em específico, o que significa, portanto, a preservação e manutenção da ordem pública já erigida por quem de Direito a tanto.



([1]) “O complexo dos padrões de comportamento, das crenças, das instituições e doutros valores espirituais e materias transmitidos coletivamente e característicos de uma sociedade.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, in, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2ª edição, Editora Nova Fronteira, RJ, 1986.)

([2]) Segundo Carnelutti, essa situação de posicionamento favorável diante de um bem da vida denomina-se interesse.(SANTOS, Moacir Amaral, in, “Primeiras Linhas de Direito Processual Civil”, Ed. Saraiva, 1º vol., 18ª edição, 1995, SP, páginas 03 e 04).

([3]) “Minoria prestigiada e dominante no grupo, constituída de indivíduos mais aptos e/ou mais poderoso.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, in, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2ª edição, Editora Nova Fronteira, RJ, 1986.)

([4]) O ordenamento jurídico de determinada Nação deve externar, refletir, o mais que possível, a vontade do Povo, ou seja, antes da edição de uma norma coercitiva de conduta o Poder Legislativo deve perquirir se o seu conteúdo (da norma jurídica a ser edificada) é um comportamento natural que o grupo social adota e realiza como norma padrão de conduta e por isso mesmo o entende, o grupo social, como essencial ao convívio de todos. A partir dessa avaliação axiológica o Poder Legislativo atribui a esses padrões de conduta a condição de juridicamente relevante e tutelado pelo próprio Estado, excluindo, assim, toda e qualquer possibilidade anímica individual ao seu não cumprimento pela sua não adoção como regra cogente de conduta, caso em que, do contrário, advirá a sanção imposta pelo Estado-Juiz.

([5]) O magistrado, para cumprir o escopo da atividade jurisdicional, que não é outro que não seja uma eficiente e eficaz pacificação social, deve apreender o juízo axiológico externado pela vontade da sociedade tal como inscrita na norma e não tal como por si, individualmente, aceito, daí ser imprescindível, em hipóteses de descumprimento de um comando normativo legal, que o jurisdicionado requeira a não incidência daquela norma pelo argumento de a mesma não refletir a vontade anímica do grupo social, tendo em vista a norma de caráter cogente inserta no artigo 2º do CPC, que não autoriza a intervenção e dicção coercitiva do Poder Judiciário se a tanto não for instado a se pronunciar.

([6]) Esse dispositivo constitucional garante que todo Poder deve emanar do Povo, o que significa que a atividade legislativa é um dos limites de expressão nacional que direciona a vontade da sociedade no que pertine aos padrões de conduta que devem ser adotados por todos, razão pela qual não pode o Poder Legislativo descurar essa vontade comportamental coletiva.

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