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quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Eram os índios americanos verdadeiramente ambientalistas?


Thomas E. Woods Jr. desfaz o mito do bom indígena ambientalista dotado de um elo espiritual com a natureza.

Por Thomas E. Woods Jr.


Abaixo transmito o terceiro capítulo, por mim traduzido, do livro “33 Questions about American History – You're not supposed to ask” (33 Questões sobre a história dos Estados Unidos que você não suporia perguntar”, de Thomas E. Woods Jr, intitulado “Were the American Indians Really Environmentalists?” (Eram os índios americanos realmente ambientalistas?). No fim do texto, apresento algumas considerações adicionais.
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Em 1991 o Smithsonian Institute publicou um popular livro intitulado "Seeds of Change: A Quincentennial Commemoration" ("Sementes da mudança: Uma Comemoração Quinquecentenarial"), que informava aos leitores que "a América pré-colombiana ainda era o Primeiro Éden, um reino natural imaculado. As pessoas nativas eram transparente no cenário, vivendo como elementos naturais na ecosfera. Seu mundo, o Novo Mundo de Colombo, era um mundo de rara perturbação humana perceptível.
Tais imagens têm sido marcadas de forma tão consistente e bem-sucedida na consciência americana que dificilmente alguém pensaria em questioná-las. Mas, era a América pré-colombiana realmente uma "reino natural imaculado"?
De jeito nenhum.
O fato é que os índios do Novo Mundo não acreditavam mais em deixar a natureza intocada do que qualquer outra pessoa no mundo antigo ou moderno. "Tal como os "euro-americanos", escreve Fergus Bordewich em "Killing the White Man's Indian", sem mencionar o resto da humanidade, os índios usaram os meios que estavam á sua disposição para moldar a natureza para o próprio uso, e dentro dos limites de sua tecnologia, eles não eram inerentemente menos exploradores dela". Similarmente, Willian Denevan, da Universidade de Wisconsin, conclui que "o impacto causado pelo índio (sobre o meio ambiente) não era nem benigno nem localizado nem efêmero, nem eram os recursos utilizados em um modo notoriamente ecológico... O tamanho das populações nativas, o deflorestamento associado e a prolongada agricultura intensiva levaram a uma severa degradação da terra em algumas regiões. "
 Corte e Queime
Os Choctaw e Iroquois, por exemplo, eram conhecidos por cortar e queimar florestas para tornar disponíveis novas fazendas. Após esgotar o solo, eles cortavam e queimavam novas florestas. Áreas arborizadas também foram desmatadas para o crescimento de pastagens para veados, alces e bisões. Embora em alguns casos tais queimadas pudessem ter algum sentido, elas contradizem a ideia de que os índios deixaram o mundo natural como um todo intocado.
Um resultado destas queimadas foi uma depleção das florestas originais. De fato, de acordo com alguns estudiosos, pode ser que na verdade tenha havido menos florestas na América quando o homem branco chegou do que as que existem atualmente. E os incêndios dos indígenas causaram ainda mais danos ambientais. Em “The Ecological Indian: Mith and History”, Shepard Krech III revela que “os índios acenderam fogueiras que deixavam queimar destrutivamente e sem nenhuma consideração às consequências ecológicas.” Krech cita em primeira mão:
...as queimadas que os índios acendiam inadvertidamente tornavam-se muito maiores do que o pretendido, queimando até que as chuvas as apagassem, e assim consumindo dezenas e centenas de milhares de acres em pastagens e florestas...
Andrew Graham falou dos extensos incêndios acesos “todo verão” e “nenhum traço de coisa viva” no inverno seguinte. Nas florestas e pastagens do leste, muitos índios acenderam fogueiras que devastavam até que se extinguissem pelas chuvas...Estes exemplos poderiam ser multiplicados. Observadores descreveram muitos índios incluindo os Ojibwa, Cree, Mandan, Arapahoe, Gros Ventres, Shoshone, Blackfeet, Assiniboine, e vários Athapaskan do Norte como incendiários “descuidados”, termo este que significava que os incêndios provocados pelos índios acidentalmente atingiam vastas proporções ou queimavam até que as chuvas caíssem (que pode ter sido o que os índios pretendiam).
Alguns incêndios indígenas, alastrando-se por semanas ininterruptamente sobre vários milhares de milhas quadradas, destruindo totalmente as plantas e a vida animal. As queimadas nas pastagens das planícies do norte, por exemplo, provocaram substancial dano à população de búfalos. “As pobres bestas”, escreveu um contemporâneo, “têm todos os pelos chamuscados; mesmo o couro em muitas partes está enrugado e terrivelmente queimado, e seus olhos estão inchados e quase fechados.” É realmente digno de pena vê-los cambaleantes, às vezes correndo em direção a uma enorme pedra, e outras vezes tombando colinas abaixo ou afundando em riachos ainda não completamente congelados. Em um certo lugar nós encontramos uma manada inteira morta.” Outros registros nos falam de veados, alces e lobos perecendo aos milhares nestes incêndios.
Algumas vezes os efeitos do fogo na vida selvagem eram mais indiretos. Florestas de madeira resistentes ao fogo que cresceram depois de tais queimadas eram por vezes menos hospitaleiras à vida animal. “ No sudeste”, explica o economista e perito ambiental Terry Anderson, “as florestas de carvalho e nogueira com uma capacidade maior de sustentar a vida para veados foram substituídas por pinheiros de folhas-longas mais resistentes ao fogo que dão sustento a apenas uma limitada vida selvagem”.
Não apenas por queimadas queimadas mas também por excesso de caça os índios prejudicaram as populações da vida selvagem. Os Cherokees e outros índios ajudaram a varrer o veado de rabo-branco (que depois se recuperou graças aos programas de repovoamento no século vinte). Os Cherokees não reprovam a si mesmos por isto, uma vez que eles acreditavam que um veado caído numa caçada se reanimaria. Tal como Krech nota, eles sentiam que um cervo abatido “causava potencialmente pelo menos três a até seis vidas adicionais, e que isto proporcionava um novo estágio para tês a seis futuros abates”. As populações de castores também caminharam pobremente sob a ação indígena, sendo os Crees especialmente desperdiçadores nos números que eles matavam e as limitadas quantidades de cada animal que eles usavam.
Nasce um mito
Então se os índios estavam praticando uma agricultura do tipo corta-e-queima, destruindo florestas e pastagens, e varrendo populações inteiras de animais, onde no mundo nasceu a ideia de que eles eram os ambientalistas originais?Uma fonte maior deste mito está em um discurso de 1854 pronunciada pelo Chefe Seattle, um índio Suquamish do Noroeste da América. O então vice-presidente Al Gore incluiu uma longa citação daquele discurso em seu livro Earth in Balance, com o retrato de Seattle como tendo dito:
Como vocês podem comprar ou vender o céu? A terra? A ideia é estranha a nós. Se nós não possuímos o frescor do ar e brilho das águas, como vocês poderão comprá-los? Cada parte desta terra é sagrada para o meu povo. Cada agulha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada névoa na floresta escura, cada campina, cada inseto zunindo. Todos são sagrados na memória e experiência do meu povo...
Isto nós sabemos: a terra não pertence ao homem, o homem pertence à terra. Todas as coisas estão conectadas assim como o sangue que nos une a todos. O homem não teceu a teia da vida, ele é meramente um dos seus fios. O que ele fizer à teia, fará a si mesmo.”
O problema é que nenhuma das versões do discurso do Chefe Seattle que possuímos parecem confiáveis, no mínimo que podemos dizer de todas as versões mais modernas, que em alguns casos são todas elas fabricadas. Um Dr. Henry Smith originalmente reproduziu o discurso de memória em 1887, trinta e três anos depois que que alegou tê-lo ouvido. De acordo com Rudolf Kaiser, um perito em história indígena americana, “A seleção do material e a formulação do texto é possivelmente tanto do Dr. Smith quanto de Seattle. Não há nenhum meio de determinar a autenticidade deste texto”.
Um outro dos muitos problemas que a versão de Smith possui é que Seattle, que não falava inglês, primeiramente emitiu o discurso em sua linguagem natal Lushootseed; ele foi então traduzido para o Chinook Jargon, uma linguagem comercial regional que incluía o francês, o inglês, e línguas nativas. O Chinook Jargon tem sido descrito como uma meramente adaptação para facilitar as trocas, despossuído da carga de ideias abstratas ou complexas, e certamente incapaz de comunicar os vôos da língua que aparecem no texto de Smith.
O discurso tem continuado a expandir-se desde então. A mais recente versão, e uma das que a maior parte dos americanos familiarizados com o texto reconheceriam, não vem de Smith mas de Ted Perry, um escritor texano que livremente adaptou o endereço para uso em um documentário sobre o meio-ambiente. Se a versão de Smith tinha problemas, a de Perry é essencialmente uma invenção (Embora, para seu crédito, Perry tenha tentado sem sucesso deixar o público saber a verdade). A versão de Perry foi posteriormente adaptada no início dos anos 1990 para fazer parte do livro infantil Brother Eagle, Sister Sky, que atingiu a quinta classificação da lista dos bestsellers do New York Times.
Seria o propósito do discurso de Seattle realmente sugerir que “tudo na natureza, sensível e não sensível, era “sagrado” para seu povo? Certamente não, dizem os estudiosos. “O discurso de Seattle foi tornado parte de um argumento pelo direito dos Suquamish e Duwamish de continuar a visitar seus terrenos tradicionais de sepulturas após a venda daquelas terras aos colonos brancos”, explica Willian Abruzzi, do Muhlenburg College. “Esta terra específica era sagrada a Settle e seu povo porque seus ancestrais estavam enterrados lá, e não por causa da terra como um conceito abstrato fosse sagrada para todos os índios”. Escrevendo no American Indian Quarterly, Denise Low explica da mesma forma que “as generosas descrições da natureza são secundárias” ao propósito do argumento do Chefe Seattle, e que ele estava dizendo apenas que “a terra é sagrada por causa dos laços religiosos com os ancestrais”.
Na mas nova versão do discurso, Seattle reivindica ter visto “um milhar de búfalos apodrecendo nas pradarias deixados pelo homem branco que atirou neles de um trem em movimento”. Como começar? A destruição dos búfalos não começou até duas décadas após o discurso de Seattle – muito depois de sua morte, de fato. De qualquer modo, o Chefe Seattle viveu no que hoje é o atual estado de Washington, que não é de jeito nenhum próximo das Grandes Planícies, e nenhuma de nossas fontes nos dá qualquer evidência de que ele um dia tenha viajado até as pradarias. Além disso, o discurso refere-se ao “grito amável de um whippoorwill (N.T. - pequeno pássaro noturno americano – espécie de bacurau), um pássaro que não é encontrado no Nordeste e quase certamente desconhecido para o Chefe Seattle.
A despeito dos óbvios problemas com o discurso eternamente mutante do Chefe Seattle, os ambientalistas tais como Al Gore têm-no usado para ajudar a cultivar o mito do índio que deixava seus arredores em condições intocadas por conta de uma profunda relação espiritual com a natureza. Tal mito impulsiona sua propaganda, enquanto o índio ambientalista puder ser usado para ofuscar a América moderna e a sociedade industrial em geral.
Não especialmente lisonjeadas por terem sido pressionadas a prestar serviço às ideologias dos homens brancos, as tribos indígenas nem sempre receberam bem esta aliança putativa com os ambientalistas e outros ativistas. Os índios de Ontário, por exemplo, têm reclamado da transformação que os ambientalistas têm feito do “respeito indígena pela terra e o comunitarismo em uma visão cult da espiritualidade “new-age”. A as visões dos ativistas dos direitos dos animais em uma mão e a dos caçadores Cree em outra, para dizer pouco, radicalmente díspares uma da outra.
Uma lição que vale a pena relembrar
O que é mais interessante acerca da real história dos índios americanos e o ambiente é que quando os índios estavam aptos a salvaguardar os recursos naturais, eles o fizeram por meio do uso do que podemos reconhecer como “direitos de propriedade”, justamente a mesma instituição que nos sempre dissemos que eles desprezavam ou sobre a qual não sabiam nada. De fato, as ideias od índios sobre o direito de propriedade variava de acordo com o tempo e o lugar. Porém é notável que quando os recursos se tornavam escassos, os mesmos sempre mudavam de um sistema comunitário para outro de direitos de propriedade estabelecidos com a finalidade de conservar estes recursos.
Não deveríamos ficar surpresos que os índios ajustassem suas práticas em resposta às mudanças das condições. Era fácil manter os direitos comunitaristas de pescar e caçar quando o pescado e a caça eram abundantes. Quando tais recursos tornaram-se escassos, entretanto, os índios entenderam a necessidade de introduzir incentivos para desencorajar o que se tornou conhecido como “ a tragédia dos comuns”. Sem os direitos de propriedade claramente definidos, nenhuma caça tinha propriamente alguma razão particular para não ser excessivamente abatida; qualquer veado que alguém não matasse seria simplesmente caçado por outros. Qualquer boa intenção que alguém pudesse ter para preservar qualquer quantidade dos animais disponíveis para caça com um olho no futuro seria frustrada pelo comportamento predatório dos outros em busca de ganho. Na ausência de direitos de propriedade claramente definidos, portanto, não há um incentivo para não exaurir os estoques atuais e há todos os incentivos para pegar o que você puder quando você puder.
Esta é a razão pela qual muitas tribos indígenas norte-americanas , incluindo os Montagnais-Naskapi de Quebec, os Algonkian, e os Paiute, garantiram a certos grupos baseados em famílias ou clãs o direito de caçar em determinadas áreas. Estes grupos, então, possuíam um incentivo tanto para refrear-se no excesso de caça quanto para excluir aqueles do lado de fora do grupo de caçar na área. Por meio desta alocação de direitos de propriedade, a tragédia dos comuns foi evitada com sucesso e a vida animal efetivamente preservada.
Na costa noroeste do Pacífico os índios estabeleceram um sistema parecido de direitos de pesca. A tecnologia dos índios para a pesca do salmão era tão avançada que eles poderiam facilmente capturar todo o salmão, não deixando nenhum para procriar para os anos subsequentes, mas ao invés disso eles expressamente faziam uma provisão para o futuro. De acordo com um índio Quileute nascido na metade do século XIX, “quando os índios tido obtido bastante peixe eles removiam as caniçadas do rio de modo que o peixe não tivesse de sentir a necessidade de subir mais o rio para deixar seus ovos, de modo que assim haveria um novo suprimento de peixes para os anos seguintes”. Infelizmente, A lei do homem branco veio a prevalecer, e ela encorajou a mesma tragédia dos comuns que os índios tinham tomando tanto cuidado em evitar.
O valor dos sistemas baseados em propriedade privada dos índios tem sido perdido não apenas na sociedade branca, que é de muito completamente ignorante desta história, mas mesmo na cultura dos próprios índios - um fato que podemos verificar com um olhar de passada sobre a maioria das reservas do oeste, onde as grandes espécies de veados praticamente não mais existem, a despeito do habitat frequentemente excelente. “Desde os últimos 25 anos”, diz o escritor de outdoor Ted Williams, “Shoshones and Arapahoes, equipados com snowmobiles (N.T. - carros de andar na neve), ATV's and poderosos rifles, têm virtualmente varridos os alces, os veados e os carneiros, nos mais de 2,2 milhões de acres da Reserva Wind River em Wioming. Este é o resultado previsível quando a vida animal é tida como pertencente a todos e a qualquer um. Muito e muito para a relação espiritual dos índios para com a natureza. Eles, como todos os outros seres humanos, respondem a incentivos: quando os incentivos estão postos para desencorajar a caça excessiva, os índios não caçam em demasia; quando os incentivos opostos existem, eles assim o fazem.
Os ambientalistas têm às vezes arguido que os americanos necessitam recapturar o espírito ambientalista supostamente possuído por seus índios predecessores neste continente e adquirir uma reverência quase-espiritual para com as coisas da natureza. Poderíamos dizer que algo como o oposto é verdade. O que os americanos podem aprender dos índios não é o tipo de primitivismo com que os ambientalistas radicais gostariam de nos atar, mas antes o uso dos direitos de propriedade como o melhor modo de preservar o meio-ambiente.
Agora temos alguma verdadeira sabedoria perdida dos índios que vale a pena ser repetida.
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Comentários

1 - O leitor com mais de trinta anos já deve ter tido conhecimento da “coivara”, que era exatamente o procedimento de queimada praticado pelo índios brasileiros com a finalidade de limpar um terreno para a roça ou para a instalação das ocaras. Eu digo mais: a queimada não é o único procedimento ecologicamente incorreto praticado pelos índios: eles também amiúde pescam com o uso de timbó, uma espécie de veneno, e frequentemente caçam animais fêmeas com filhotes. Conforme tenho percebido dos livros escolares, este dado, que até então somente tinha significado histórico e antropológico, começou a ser tratado pelos olhos de professores e educadores imbuídos de forte convicção marxista como uma informação que causaria um problema de ordem psicosocial aos descendentes de índios, de modo que a história foi amputada para atender às novas diretrizes do pensamento politicamente correto. Com o passar do tempo, tal dado tem sido praticamente apagado, e muito ao invés, agora os livros didáticos vêm apregoando que os índios é que eram verdadeiros anjos da floresta.
2 – Talvez o leitor já tenha lido este discurso do chefe Seattle, pois foi um texto muito famoso nos anos 80 e 90. Eu o li quando pequeno, num folheto distribuído pela Unimed. Na versão em português, o passarinho whippoorwill, que não tem tradução para o nosso idioma, foi modificado para rouxinóis, que em inglês tem outro nome, “nightingale”. Eu não colei nenhum link neste artigo, mas o leitor facilmente encontrará as versões mais desencontradas no Google, bastando escrever “discurso” e “chefe Seattle”.

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